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Críticas por Pablo Villaça

Datas de Estreia: Nota:
Brasil Exterior Crítico Usuários
04/09/1998 24/04/1998 1 / 5 / 5
Distribuidora
Duração do filme
99 minuto(s)

De Caso com o Acaso
Sliding Doors

Dirigido por Peter Howitt. Com Gwyneth Paltrow, John Hannah, John Lynch, Jeanne Tripplehorn, Zara Turner, Douglas McFerran e Paul Brightwell.

De Caso com o Acaso é uma destas produções que poderiam perfeitamente ter sido realizadas para a televisão. Além de uma trilha sonora aparentemente retirada de uma série dramática da Sony, o filme parece desconhecer os princípios da fotografia e da edição, apresentando uma imagem pobre que foi ainda mais prejudicada pela transferência para o vídeo. Na verdade, se não fosse pela presença da estrela Gwyneth Paltrow, é bem provável que esta produção acabasse passando em branco pelos cinemas de todo o mundo.

O roteiro, escrito por Peter Howitt, parte de uma idéia intrigante: até que ponto nossos destinos são alterados por pequenos acontecimentos do dia-a-dia? Será que um tropeção ou um pequeno acidente doméstico seriam capazes de mudar radicalmente nosso futuro? Em De Caso com o Acaso, Gwyneth Paltrow vive Helen, uma relações-públicas que, certo dia, é despedida de seu emprego e acaba tendo que voltar para casa mais cedo. Ao chegar à estação do metrô, ela perde a condução ao trombar com uma garotinha que vinha em sua direção. Mas o que aconteceria se ela tivesse conseguido pegar o metrô?

Para encontrar uma resposta para esta pergunta, o filme passa a acompanhar duas diferentes versões da vida da garota: em uma das `realidades`, ela pega o metrô e ao chegar em casa surpreende o namorado na cama com outra mulher. Já na versão `alternativa`, ela é obrigada a encontrar outro meio de transporte e em função disso acaba sofrendo uma tentativa de assalto. Como se machuca no incidente, é levada a um hospital e não descobre a traição do companheiro.

Interessante? A princípio, sim. No entanto, os esforços imaginativos de Howitt se esgotam neste ponto, e o roteirista não consegue criar mais nada de curioso pelo resto da narrativa. Assim, acabamos assistindo a dois filmes - as diferentes vidas de Helen - que, sinceramente, não valem por um. Na verdade, a própria Helen é uma personagem sem muito carisma, agindo simplesmente em função das exigências feitas por seus amigos (ou pelo roteiro). Em uma das versões, por exemplo, ela dá uma olhada no jornal e, como não consegue encontrar emprego como relações-públicas, resolve virar garçonete. Já na outra `realidade`, ela vai morar com uma amiga que a obriga a cortar e a tingir os cabelos de louro, transformando-a em... bem, em Gwyneth Paltrow (ela insiste em repetir a mesma expressão sofrida e apaixonada que já vimos em obras como Se7en, Shakespeare Apaixonado, O Talentoso Ripley e Um Crime Perfeito).

Para contrabalançar a monotonia da vida de Helen, o roteiro procura rechear seus diálogos com tiradas espirituosas (aliás, todos os personagens do filme falam como se tivessem saído de esquetes do Monty Python - que, aliás, é constantemente citado ao longo da trama). Infelizmente, o humor britânico é bastante peculiar, funcionando apenas quando inserido no contexto apropriado (como os filmes dos Python).

Além disso, Howitt não é muito justo ao retratar as duas vidas de Helen: maniqueísta, ele insiste em levar o espectador a escolher uma das opções ao retratar Gerald (o namorado) de forma desfavorável: confuso, fraco e egoísta, o rapaz é absolutamente detestável - e seus toques de honestidade não o tornam melhor. Na verdade, chega a ser um mistério o motivo que levou duas garotas belas e inteligentes a se apaixonarem por ele. Para piorar, Gerald tem um amigo igualmente aborrecido que insiste em gargalhar de maneira sádica sempre que escuta suas confissões. Aliás, a decisão de favorecer uma das histórias acaba revelando-se antiprodutiva, já que é impossível evitar a frustração nos momentos em que somos obrigados a assistir a `versão` que não nos agrada.

Por outro lado, devo reconhecer que a direção de Howitt consegue a proeza de narrar as duas versões sem provocar muita confusão na cabeça do espectador. No início, a diferença entre as duas Helens se resume a um esparadrapo aplicado na testa de uma delas; mais tarde, o corte de cabelo passa a servir como referência. O elenco também merece reconhecimento: excetuando-se Lynch, que não consegue definir sequer a base de Gerald, todos os demais personagens possuem suas virtudes - especialmente James, vivido de maneira extremamente carismática por John Hannah.

De Caso com o Acaso também acaba nos oferecendo um final completamente insatisfatório e inconclusivo: afinal de contas, que mensagem Peter Howitt quer transmitir com esta história? Os pequenos detalhes realmente alteram o curso de uma vida? Ou nossos destinos já estão traçados e não podem ser mudados independentemente do que venhamos a fazer? Curiosamente, o roteiro tenta provar que as duas teorias estão corretas, o que torna a experiência ainda mais frustrante. Se você quer assistir a um filme sobre realidades `paralelas`, é melhor conferir os infinitamente superiores Corra, Lola, Corra e Feitiço do Tempo. Esta, sim, é a melhor alternativa.
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17 de Julho de 2000

Pablo Villaça, 18 de setembro de 1974, é um crítico cinematográfico brasileiro. É editor do site Cinema em Cena, que criou em 1997, o mais antigo site de cinema no Brasil. Trabalha analisando filmes desde 1994 e colaborou em periódicos nacionais como MovieStar, Sci-Fi News, Sci-Fi Cinema, Replicante e SET. Também é professor de Linguagem e Crítica Cinematográficas.

 

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