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VELVET GOLDMINE Vestindo o Filme

Nós nos propusemos a mudar o mundo... e no final só mudamos nós mesmos.

O ano é 1974. Brian Slade (Jonathan Rhys Meyers) está no auge de seu sucesso quando é baleado no palco durante uma apresentação. Dez anos depois, Arthur (Christian Bale), que ainda adolescente presenciou tudo da plateia, agora é um jornalista britânico morando nos Estados Unidos. Ele precisa ser alocado para investigar o acontecimento, que se sabe ter sido uma grande farsa que permitiu Brian sumir do mapa. Assim começa Velvet Goldmine, dirigido por Todd Haynes (Não Estou Lá). A figurinista é Sandy Powell, colaboradora nos últimos filmes de Martin Scorsese e também responsável por trabalhos memoráveis como Orlando - A Mulher Imortal, Entrevista com o Vampiro, A Jovem Rainha Vitória e, recentemente, Cinderela, que já foi analisado pela coluna.

Velvet Goldmine, de 1998, é um mergulho em uma época específica sob o olhar de Arthur, que, como jovem, está em busca de seu espaço e de sua identidade. Brian Slade é um astro do glam rock, movimento do começo da década de 70 marcado pelo excesso, a teatralidade e a androginia. O filme ainda brinca como uma cronologia de personalidades e movimentos que ficaram marcados como exuberantes, começando pelo escritor Oscar Wilde. Powell trabalhou basicamente com suas próprias memórias da época, mas as similaridades entre os personagens com pessoas da vida real auxiliaram em sua tarefa. O próprio Brian tem semelhanças com David Bowie, de quem toma emprestado os macacões colados e botas de plataforma, por exemplo.


David Bowie em 1972

Outras referências para os figurinos de suas apresentações são as bandas Slade (de onde, obviamente, veio a inspiração para o nome do personagem) e Sweet.


Em cima, a banda Slade em data não determinada e embaixo, a banda Sweet em 1973

No começo de sua carreira, no final dos anos 60, Brian Slade toca em um festival usando um vestido roxo acompanhado de botas, similares aos que Bowie usa na capa de seu disco The Man Who Sold the World. O vestido era uma tentativa do personagem de transgredir os padrões da época, especialmente no que diz respeito às fronteiras entre masculino e feminino. A recepção da plateia à sua performance é morna.


Capa do álbum The Man Who Sold the World

Na sequência, o cantor Curt Wild (Ewan McGregor) entra em palco com uma apresentação que, esta sim, quebra barreiras e diverte. Usando calça de couro, Curt joga óleo sobre seu corpo, simula masturbação em um vidro que goza purpurina sobre seu corpo e, por fim, fica nu.

A persona com sexualidade aflorada de Curt é baseada em Iggy Pop, que nesse período era vocalista da banda The Stooges; porém, também tem contornos de Lou Reed, vocalista e guitarrista da banda The Velvet Underground que era abertamente homossexual. Bowie, Reed e Iggy Pop eram amigos costumeiramente vistos juntos na década de 1970. No filme, Curt e Brian começam um relacionamento, o que faz com que o segundo lance a carreira do primeiro na Inglaterra.


Em cima, Iggy Pop e embaixo, da esquerda para a direita, David Bowie, Iggy Pop e Lou Reed

Quando sua carreira decola, Brian cria um personagem para si, chamado Maxwell Demon, uma alusão ao Ziggy Stardust de Bowie. Já não usa mais os cabelos longos, nem vestidos. Estes são trocados por um corte curto, desfiado, e paletós espalhafatosos.

No ápice de sua carreira, aproximando-se da decadência, o cantor passa a exibir cabelos azuis.

A banda de Brian chama-se Venus In Furs, nome de uma canção do The Velvet Underground. Os absurdos em relação à forma como eles se vestem no palco são demonstrados em uma cena em que uma moça pede emprego como secretária e acaba contratada como figurinista, mesmo afirmando que não tem experiência alguma com isso. As combinações são propositalmente esdrúxulas e chamativas.

Mandy (Toni Collete), esposa de Brian, acompanha os estilos de cada época, mas seu apreço é por brilho, peles e estampas de oncinha. Quando conhece Brian ela veste um vestido prateado, mas quando ele se apresenta no festival, muda para um estilo pós-hippie com gola de pelos, adaptando-se melhor ao que se espera no local. Na primeira turnê de sucesso, ela usa uma roupa que combina com a dele, novamente mostrando apoio à carreira de seu companheiro.

O auge é marcado por roupas que mais parecem fantasias, um volumoso casaco de pele e um sobretudo de oncinha em duas cores. Já o anonimato é marcado por trajes pretos e nenhuma maquiagem, ainda que com muitos acessórios.

Para Arthur há o completo contraste entre a liberdade, o uso de maquiagens, as roupas justas e o colorido de sua adolescência, em oposição ao marrom sem graça do presente.

Pelo seu trabalho como figurinista em Velvet Goldmine, Sandy Powell foi indicada ao Oscar em 1999. O prêmio foi para Shakespeare Apaixonado, também desenhado por ela. Em seu discurso, ela conseguiu mencionar o primeiro filme e não dizer o nome do segundo. Em entrevistas posteriores, é notório o fato de ter comentado que ela foi premiada pelo filme errado. Com um figurino inspirado, colorido e extravagante, Velvet Goldmine nos oferece o recorte de uma época que marcou a história da música e uma juventude, especialmente ao desafiar padrões pré-estabelecidos de gênero e de sexualidade. Como em outras gerações antes e depois desta, o sonho acabou sem que o mundo tivesse mudado em sua totalidade, mas o seu impacto é inegável.

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Sobre o autor:

É antropóloga e doutoranda em Antropologia Social pela USP, apaixonada por cinema e autora do blog Estante da Sala.

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