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Críticas por Pablo Villaça

Datas de Estreia: Nota:
Brasil Exterior Crítico Usuários
05/09/2008 01/01/1970 3 / 5 4 / 5
Distribuidora
Duração do filme
120 minuto(s)

Hellboy II - O Exército Dourado
Hellboy II: The Golden Army

Dirigido por Guillermo del Toro. Com: Ron Perlman, Selma Blair, Doug Jones, Jeffrey Tambor, Seth MacFarlane, Luke Goss, Anna Walton, Montse Ribé, Roy Dotrice, John Hurt.

 

Assim como seu parceiro de gênero Peter Jackson, o cineasta mexicano Guillermo del Toro tem toda sua carreira fortemente calcada na fantasia – e mesmo seus trabalhos tematicamente mais sérios (como os “irmãos” A Espinha do Diabo e O Labirinto do Fauno) dependem pesadamente da imaginação do diretor no desenvolvimento de suas ambiciosas narrativas. Aliás, vou além: embora grande admirador de Jackson, acho difícil negar que a criatividade de del Toro seja infinitamente maior, posto que, ao passo que o neo-zelandês tem nas adaptações seus projetos mais bem-sucedidos, o mexicano já se mostrou mais do que capaz de criar novos universos a partir de sua própria visão (e, portanto, será interessante, como crítico e cinéfilo, observar o que ele fará com O Hobbit). Assim, é mais do que apropriado que del Toro volte a investir, em Hellboy II – O Exército Dourado, no mundo criado por Mike Mignola, já que a galeria de personagens fantásticos originalmente concebida pelo experiente autor dos quadrinhos não apenas se mostra uma fonte inesgotável de idéias, como também permite que o cineasta invista em suas próprias viagens criativas.

 

Escrito pelo cineasta a partir de argumento concebido ao lado de Mignola, o filme é uma continuação direta do bom longa anterior: com o agente Myers (Rupert Evans) convenientemente despachado para a Antártica, Hellboy (Perlman) e sua amada Liz Sherman (Blair) se entregam a um namoro relativamente estável em sua volatilidade. É quando o lendário Príncipe Nuada (Goss, que também foi o vilão de del Toro em Blade 2), cuja história Hellboy conheceu na infância através das narrações feitas pelo professor Broom (Hurt, em pequena participação), retorna ao mundo dos mortais para recuperar as três partes da coroa de seu pai, o que lhe dará controle absoluto sobre o Exército Dourado do título, permitindo que destrua/conquiste o planeta. Designados para frustrar os planos do vilão, Hellboy, Liz e Abe (Jones) passam a contar com a liderança do estranho Johann Krauss, um espírito cujo ectoplasma é mantido íntegro por uma antiga roupa de mergulho concebida por Broom.

 

Assumindo um tom leve já denunciado pela trilha engraçadinha de Danny Elfman, o filme exibe tal invencionismo na concepção de suas criaturas que fica claro, desde o princípio, o cuidado que o diretor e sua equipe tiveram ao planejar o visual de cada personagem, dos mais importantes aos quase figurantes – e a seqüência no mercado troll surge como uma espécie de mistura entre um Beco Diagonal decadente e o quartel general dos Homens de Preto, tamanha a diversidade de espécies ali vista. E se a “fada dos dentes” ganha uma interpretação nova (e bizarra) em Hellboy II, ainda mais divertido em sua morbidez é o bebê que se anuncia como um tumor ou a gag recorrente que envolve o destino dos agentes que acompanham o herói e que, assim como os “camisas vermelhas” da série Jornada nas Estrelas, parecem sempre fadados a virar comida de monstro. Porém, a visão de del Toro encontra espaço para detalhes que beiram o poético, como o personagem que traz uma mini-catedral em sua cabeça ou o gigante ameaçador que deixa, como legado, um surpreendente rastro verde.

 

Livre da necessidade de apresentar seus personagens (tarefa bem cumprida no original), o cineasta agora tem a oportunidade de investir em momentos que buscam desenvolver a dinâmica entre estes, seja através da embriagada cantoria compartilhada por Hellboy e Abe ou das constantes brigas entre Liz e seu namorado. Aliás, o romance da dupla, longe de soar como uma mera desculpa para estender a duração da projeção, cumpre a importante função de humanizar o personagem-título, que, numa fala especialmente inteligente e divertida, resume sua relação com Liz da seguinte maneira: “Eu daria a vida por ela, mas ela ainda quer que eu lave os pratos!”.

 

Ron Perlman, diga-se de passagem, encontra o personagem de sua vida em Hellboy, conferindo energia, segurança e um timing cômico invejável a cada tirada do herói (basta notar que cada um dos “Oh, crap!” ditos pelo sujeito surge com entonação diferente e perfeita para cada situação). Já Selma Blair, livre da angústia que afundava Liz no primeiro filme, agora tem a oportunidade de se mostrar mais intensa e interessante, servindo como contraponto importante a Hellboy por ser a única que tem realmente a capacidade de subjugá-lo. Porém, mais uma vez é Doug Jones quem merece destaque: emprestando seu corpo expressivo a Abe e ao Anjo da Morte, o ator é capaz de ilustrar a personalidade de seus personagens desde pequenos movimentos de cabeça até gestos grandiosos com as mãos – e não é à toa que ele estabeleceu com Guillermo del Toro uma parceria similar àquela entre Andy Serkis e Peter Jackson, já que também foi ele quem deu vida ao assustador Homem Pálido e ao personagem-título de O Labirinto do Fauno.

 

Optando por utilizar bonecos animatrônicos na maior parte do tempo e relegar os efeitos gerados em computador apenas para as cenas nas quais estes se revelam realmente indispensáveis, del Toro confere peso maior de realidade àquele universo fantástico, já que há algo de inimitável na textura de criaturas concebidas principalmente através da maquiagem e de efeitos mecânicos – e, neste sentido, Abe é um feito particularmente impressionante, deixando até mesmo o imponente Hellboy em segundo plano no que diz respeito à eficácia de seu visual. Da mesma forma, os irmãos vividos por Luke Goss e Anna Walton impressionam por sua aparência pétrea que, aliás, reflete um detalhe importante de seu ciclo de vida. E se Johann Krauss parece menos impressionante em seu design, ao menos seu intenso gesticular, que remete às séries de tevê japonesas, diverte pela referência bem-humorada.

 

Adotando uma paleta de cores sempre fortes (e que é óbvia e apropriadamente dominada pelo vermelho e pelo dourado), o design de produção de Hellboy II impressiona pela escala e pela criatividade, ao passo que a montagem, que abusa das cortinas disfarçadas pela movimentação de personagens ou de objetos de cena, surge fluida e dinâmica.

 

Abraçado pela Universal depois que a Sony desistiu de continuar com a franquia em função da bilheteria apenas mediana do original, Hellboy II encontrou, no velho estúdio dos clássicos monstros, um lar ideal (e não é à toa que A Noiva de Frankenstein e O Lobisomem podem ser vistos em certo momento da projeção). Resta torcermos para que del Toro possa dar continuidade à série com a mesma liberdade com que aparentemente a conduziu até agora, já que é reconfortante perceber como sua sensibilidade particular se presta perfeitamente ao sombrio, mas divertido, universo concebido por Mike Mignola. 

05 de Setembro de 2008

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Pablo Villaça, 18 de setembro de 1974, é um crítico cinematográfico brasileiro. É editor do site Cinema em Cena, que criou em 1997, o mais antigo site de cinema no Brasil. Trabalha analisando filmes desde 1994 e colaborou em periódicos nacionais como MovieStar, Sci-Fi News, Sci-Fi Cinema, Replicante e SET. Também é professor de Linguagem e Crítica Cinematográficas.

 

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