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Críticas por Pablo Villaça

Datas de Estreia: Nota:
Brasil Exterior Crítico Usuários
20/12/2013 01/01/1970 2 / 5 / 5
Distribuidora
Paris Filmes

Ender's Game - O Jogo do Exterminador
Ender's Game

Dirigido por Gavin Hood. Com: Asa Butterfield, Harrison Ford, Viola Davis, Hailee Steinfeld, Abigail Breslin, Aramis Knight, Suraj Partha, Moises Arias, Khylin Rhambo, Nonso Anozie e Ben Kingsley.

Visualmente desinteressante, moralmente confusa, povoada por personagens aborrecidos e entediante na maior parte do tempo, Ender’s Game é uma ficção científica cujas ambições temáticas raramente encontram eco em sua abordagem tola e infantil. Se estes são problemas contidos no livro de Orson Scott Card que a originou, não posso dizer (já que não o li), mas são certamente obstáculos graves que garantem que o filme se torne um aborrecido fracasso.

Quase surgindo como uma espécie de continuação de Independence Day, já que seu início remete diretamente ao desfecho daquele longa, Ender’s Game é escrito e dirigido por Gavin Hood, um cineasta sul-africano cuja mediocridade pode ser constatada não só no trabalho que inexplicavelmente o projetou internacionalmente (Infância Roubada), mas também em seus esforços seguintes: o razoável O Suspeito e o pavoroso X-Men Origens: Wolverine. Ambientado num futuro no qual a humanidade se encontra traumatizada depois de uma guerra com alienígenas, o roteiro logo nos apresenta ao garoto Ender Wiggins (Butterfield, de O Menino do Pijama Listrado e A Invenção de Hugo Cabret), um promissor cadete da academia comandada pelo coronel Graff (Ford). Usando games como forma de treinamento dos futuros heróis (o que traz a vantagem de servir como a fantasia perfeita para jovens gamers na vida real), os militares buscam um líder que possa chefiar a batalha final contra os Formics, que, como o próprio nome indica, trazem uma lógica visual e de comportamento bastante similar às de formigas.

Assim, é curioso que, embora uma espécie de filme de guerra futurista, Ender’s Game praticamente se resuma a falatórios e mais falatórios, substituindo a ação por discussões óbvias acerca das motivações e fragilidades do protagonista – que, para que não restem dúvidas na plateia, são sempre escancaradas em diálogos expositivos que se encarregam de analisar/explicar o rapaz (e as lacunas restantes são preenchidas pela desnecessária narração em off feita pelo personagem-título). No entanto, nem mesmo toda a psicologia barata usada para dissecar Ender consegue torná-lo minimamente interessante, já que o garoto inicia a projeção como um indivíduo chato e só piora ao longo das duas horas seguintes, chegando a protagonizar clichês como o do “eu desisto!-você não pode desistir!-não insista!-eu insisto!-então tá, eu volto!”.

O mais grave, porém, é perceber como o filme jamais se preocupa em justificar toda a fé depositada no personagem-título por todos ao seu redor – especialmente o experiente Graff, que parece acreditar estar lidando com um “escolhido” como o Neo de Matrix ou um mini-Jesus magrelo e dado a explosões de violência. “Nunca vi ninguém fazer isso!”, diz, por exemplo, a major interpretada por Viola Davis em certo instante, mas sem explicar o que há de tão especial no que o rapaz fez. Da mesma maneira, quando Graff diz que Ender é “o único a usar o cérebro” entre os cadetes, tal afirmação (disparada por um riso do menino) soa gratuita e injustificada.

É frustrante, portanto, perceber que esta dinâmica se mantém durante toda a projeção, já que frequentemente vemos alguém se curvar diante da “inteligência” ou das “habilidades” de Ender por alguma razão misteriosa (e as coloco entre aspas por jamais testemunhá-las) – e quando o sargento Dap (Anozie) bate continência para o moleque depois de ter afirmado que jamais o trataria como superior, somos levados a questionar por que diabos aquele experiente militar está se curvando diante de um garoto não mais qualificado do que os colegas. Sim, vemos Graff olhar admirado enquanto “Neo” dispara suas armas ao girar em gravidade zero durante um treino, mas considerando que o rapaz também está sendo atingido por inúmeros disparos, fica difícil valorizar suas manobras evasivas.

Habitado por uma galeria de caricaturas (o antagonista Bonzo Madrid é um dos piores), O Jogo do Exterminador ainda investe em clichês como o do princípio de romance entre o personagem-título e a colega Petra (Steinfeld, tão fantástica em Bravura Indômita e tão inexpressiva aqui), pecando também por parecer tentar se tornar um Nascido para Matar Júnior através da gritaria irritante do sargento Dap. Para piorar, o filme ainda traz um Ben Kingsley beirando o ridículo quando já achávamos que a cartela de personagens unidimensionais se encontrava completamente preenchida – e, honestamente, não sei se o ator surge mais tolo aqui ou em sua outra grande superprodução de 2013, O Homem de Ferro 3.

Concentrando a maior parte de seu segundo ato em uma série de jogos (ainda que Graff grite que aquilo “não é um jogo!”), Ender’s Game não parece se dar conta de que aquele treinamento supostamente complexo e difícil não passa de uma versão glamourizada de uma partida de rouba-bandeira – com a diferença que, ali, basta chegar ao outro lado do campo de batalha para vencer a disputa. O que não é nada difícil, considerando que, em gravidade zero, a simples inércia é capaz de empurrar mesmo um jogador imobilizado na direção correta.

Algo que, acreditem, é exatamente o que acontece no filme, para imenso espanto do – repito – experiente coronel Graff.

Sem se importar em criar uma lógica minimamente coesa na fotografia, que, fria na maior parte do tempo, aposta em tons quentes justamente ao enfocar conversas dramáticas como aquela ambientada em um lago (enfraquecendo, com isso, a angústia da situação), Ender’s Game finalmente ganha algum interesse graças a uma revelação já no terceiro ato, quando se mostra disposto a discutir questões morais particularmente complexas. (Ainda assim, é preciso perguntar – sem revelar nada importante - por que Ender fica tão abalado, já que deveria saber que eventualmente teria que fazer exatamente o que fez.) Infelizmente, porém, até mesmo esta tentativa temática é logo substituída por um desfecho tolo que, mantendo-se em aberto, surge mais preocupado em possibilitar continuações do que em amarrar a história que vinha contando.

Não que isto importe, já que, considerando o que vi aqui, não posso dizer que fiquei curioso para voltar a acompanhar as aventuras deste antipático herói juvenil.

20 de Dezembro de 2013

Pablo Villaça, 18 de setembro de 1974, é um crítico cinematográfico brasileiro. É editor do site Cinema em Cena, que criou em 1997, o mais antigo site de cinema no Brasil. Trabalha analisando filmes desde 1994 e colaborou em periódicos nacionais como MovieStar, Sci-Fi News, Sci-Fi Cinema, Replicante e SET. Também é professor de Linguagem e Crítica Cinematográficas.

 

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