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Críticas por Pablo Villaça

Datas de Estreia: Nota:
Brasil Exterior Crítico Usuários
15/06/2007 01/01/1970 3 / 5 / 5
Distribuidora

Shrek Terceiro
Shrek the Third

Dirigido por Chris Miller, Raman Hui. Com as vozes de Mike Myers, Eddie Murphy, Antonio Banderas, Cameron Diaz, Julie Andrews, Rupert Everett, John Cleese, Eric Idle, Justin Timberlake, Larry King, John Krasinski, Ian McShane, Cheri Oteri, Amy Poehler, Maya Rudolph, Amy Sedaris.

Com seu humor ácido, irreverente e politicamente incorreto, Shrek foi a primeira animação computadorizada a representar uma ameaça real à hegemonia até então inquestionável da brilhante Pixar, derrotando a produtora de John Lasseter justamente no ano inaugural da categoria de Melhor Longa de Animação (na cerimônia do Oscar em 2002). Já em 2004, Shrek 2 fez jus ao original e expandiu o universo da série, trazendo personagens novos e adoráveis, além de comprovar o significativo avanço técnico da PDI/DreamWorks – uma evolução que continua a ser visível em Shrek Terceiro, cujos valores de produção jamais deixam de impressionar o espectador. Infelizmente, o mesmo não pode ser dito sobre sua narrativa, que empalidece em comparação aos capítulos anteriores.

Trocando a irreverência pelo pastelão, este novo longa raramente investe em piadas arriscadas (e memoráveis) como aquelas que surpreenderam o público no passado: não há, aqui, nem sombra da hilária crueldade de uma princesa capaz de fritar os ovos de um passarinho morto em um duelo musical ou do corajoso senso de humor de roteiristas que não hesitam em retratar Pinóquio como um travesti enrustido. Em vez disso, temos o ogro verde pedindo para que lhe cocem a bunda e piadinhas frágeis envolvendo vômito, cocô e arrotos. No restante do tempo, os vários roteiristas do projeto se limitam a copiar a estrutura dos filmes anteriores, enviando Shrek e seus companheiros em uma jornada e utilizando, como clímax, um evento público. E se anteriormente a série se mostrou hábil ao subverter personagens como fadas-madrinhas e princesas, desta vez temos a participação especial de um Merlin “New Age” completamente dispensável e sem a menor graça. Aliás, até mesmo a estrutura básica da franquia é ignorada, já que, pela primeira vez, não temos o clássico livro de conto de fadas abrindo a narrativa.

Por outro lado, desta vez as alusões a outros longas-metragens soam mais orgânicas e não tão gratuitas quanto em Shrek 2: quando momentos saídos de O Bebê de Rosemary, A Primeira Noite de um Homem, O Exorcista, Cantando na Chuva e A Noviça Rebelde surgem na tela, sentimos que estão ali em função de um propósito bem definido, e não apenas como citações adicionadas para que o espectador se sinta inteligente ao reconhecê-las (a única exceção diz respeito ao instante em que Cinderela age como Gollum, numa exibição de dupla personalidade que surge sem mais nem menos e jamais é desenvolvida pela história). Infelizmente, estes momentos de inspiração não são freqüentes; quando dois personagens trocam de corpo, por exemplo, o roteiro se mostra completamente incapaz de explorar a oportunidade de maneira eficaz, limitando-se somente a uma ou duas gags mais óbvias, o que é uma pena.

Não que o filme seja despojado de qualquer indício de humor – afinal, é difícil resistir ao charme de todos aqueles personagens que passamos a conhecer tão bem nos longas anteriores. Assim, quando o Homem-Biscoito vê sua vida passar rapidamente diante de seus olhos (com direito a uma referência a O Homem de Seis Milhões de Dólares que o público mais jovem simplesmente não perceberá), a graça surge não apenas em função do conceito da montagem, mas da familiaridade que temos com aquela figura. Da mesma maneira, nos poucos instantes em que os roteiristas conseguem recapturar o tom de humor negro típico da série os resultados são hilários, como na cena – repleta de sadismo - envolvendo o Rei Sapo. E se o rápido plano de um sutiã sendo queimado diverte por levar o movimento feminista ao universo das fábulas, ainda mais subversiva soa a cena em que a cantoria infantil de Branca de Neve se converte num clássico do Led Zeppelin.

A trilha sonora de Shrek 3, diga-se de passagem, é um atrativo à parte, incluindo de Ramones (“Do You Remember Rock’n’Roll Radio?”) a McCartney (“Live and Let Die”, tema de Com 007 Viva e Deixe Morrer). Em contrapartida, a montagem do filme mais uma vez deixa a desejar com relação àquela do original, embora tente desesperadamente criar algumas das transições tão elegantes daquele longa – e o máximo que consegue é relacionar a sombra das grades que prendem Shrek às barras da cela de Fiona (ou – ainda mais pedestre – fundir a fogueira que aquece o protagonista às chamas de uma tocha carregada por sua esposa).

Porém, nada é mais frustrante em Shrek 3 do que seu ato final. Ao contrário da ação irreverente e dos confrontos divertidos vistos nos capítulos anteriores, aqui os roteiristas comprovam a total pasteurização da franquia ao incluírem mais um daqueles discursos batidos e ofensivamente simplistas sobre “a importância de acreditar em si mesmo” e por aí afora, substituindo a anarquia da série por uma mensagem água-com-açúcar mais apropriada aos filmes da Disney tão acidamente criticados no primeiro longa. Como se não bastasse, o roteiro parece só se dar conta de ter esquecido o já tradicional número musical final quando já era tarde demais – e, no desespero, os animadores tentam incluí-lo desajeitadamente durante os créditos, o que representa a decepção derradeira para todos os fãs que aprenderam a esperar algo novo de Shrek e seus amigos.

14 de Junho de 2007

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Pablo Villaça, 18 de setembro de 1974, é um crítico cinematográfico brasileiro. É editor do site Cinema em Cena, que criou em 1997, o mais antigo site de cinema no Brasil. Trabalha analisando filmes desde 1994 e colaborou em periódicos nacionais como MovieStar, Sci-Fi News, Sci-Fi Cinema, Replicante e SET. Também é professor de Linguagem e Crítica Cinematográficas.

 

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