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Críticas por Pablo Villaça

Datas de Estreia: Nota:
Brasil Exterior Crítico Usuários
17/12/2004 26/11/2003 3 / 5 / 5
Distribuidora
Duração do filme
101 minuto(s)

The Cooler - Quebrando a Banca
The Cooler

Dirigido por Wayne Kramer. Com: William H. Macy, Maria Bello, Alec Baldwin, Ron Livingston, Shawn Hatosy, Paul Sorvino, Estella Warren, Ellen Greene e Joey Fatone.

Bernie Lootz é um sujeito tão azarado que todas as plantas de seu apartamento morrem em uma questão de dias e seu gato (preto) de estimação vive fugindo. Aliás, a má sorte do pobre homem é tamanha que chega a ser contagiosa – e não é à toa que ele trabalha em um cassino de Las Vegas exercendo a função de `cooler` (algo como `pé-frio`): sempre que algum jogador começa a ganhar mais do que o esperado, Bernie é despachado para acabar com sua maré de sorte, bastando ficar ao lado da `vítima` para que esta perca no jogo. Prestes a abandonar a cidade depois de mais de uma década trabalhando como `pé-frio profissional`, Bernie se envolve com uma das garçonetes do cassino e seu envolvimento amoroso provoca um efeito inesperado, já que ele começa a dar sorte para os jogadores – algo que obviamente irrita o administrador do lugar, o veterano Shelly Kaplow.

Escrito pelo diretor Wayne Kramer e pelo estreante Frank Hannah (um especialista em Las Vegas), The Cooler aposta todas as suas fichas (com o perdão do trocadilho) em seu protagonista, um homem patético e pessimista que praticamente traz o aviso `Perdedor` grudado na testa. Vivido pelo sempre competente William H. Macy como um sujeito incapaz de acreditar em si mesmo, Bernie não consegue sequer acreditar que uma mulher poderia se sentir atraída por ele – e, quando isto parece acontecer, ele comete uma gafe tremenda ao julgar que a garota é uma prostituta.

Experiente em interpretar tipos infelizes que despertam a compaixão do espectador (como em Fargo, Boogie Nights e Magnólia), Macy explora ao máximo o arco dramático vivido por seu personagem, que acredita ter finalmente encontrado a felicidade, mas que ainda teme que sua habitual falta de sorte destrua tudo. Enquanto isso, Maria Bello transforma a garçonete Natalie na própria personificação da Esperança, levando-nos a acreditar que a moça é realmente a solução perfeita para a insegurança de Bernie – especialmente em função do contraste entre sua vivacidade habitual e a eterna apatia de seu amante azarado. Além disso, sua honestidade depois da primeira transa com Bernie é hilária e, ao mesmo tempo, reconfortante: `Eu já tive piores`, ela afirma – e, em vez de ficar arrasado, o sujeito parece se tranqüilizar ao saber que encontrou alguém em quem pode realmente confiar.

Aliás, The Cooler é um raro exemplo de produção americana que utiliza o sexo não como forma de atrair o interesse superficial do espectador, mas sim para desenvolver a relação entre seus personagens. Aqui, a câmera não se afasta quando o casal principal se atira na cama, dando um salto no tempo para voltar a retratá-los depois do sexo, já enrolados no lençol. Nada disso: sem se preocupar em esconder as imperfeições dos corpos de Macy e Bello (mas também sem ridicularizá-los), Wayne Kramer confere realismo ao envolvimento do casal, permitindo que o público compartilhe de sua intimidade – e, com isso, realmente acreditamos naquela relação. Bernie e Natalie não são simplesmente caricaturas de Hollywood, declarando amor já no primeiro encontro; para eles, dizer `Eu te amo` demanda confiança e coragem – e é comovente ver aquelas duas pessoas se tornando cada vez mais importantes uma para a outra.

Mas The Cooler ainda conta com uma terceira performance que merece aplausos: Alec Baldwin, como Shelly Kaplow, é indubitavelmente a figura mais enigmática do filme. Responsável pelo cassino Shangri-La há 16 anos, Shelly orgulha-se por manter a classe do lugar, que conta até mesmo com um crooner (uma participação curta, mas eficaz, de Paul Sorvino) contemporâneo de Dean Martin e Frank Sinatra. Com a expressão sempre cansada, como se não dormisse há anos, Kaplow é exatamente o oposto de Bernie, já que valoriza a própria importância (ao ver uma garota que lhe interessa, ele simplesmente entrega um cartão para a moça e diz `Veja quem sou`). Porém, sua arrogância é mais do que justificada por sua vasta experiência: nada escapa aos olhos de Shelly – como o filme se encarrega de demonstrar em uma sensacional tomada na qual ele `enxerga` os dados preparados que estão escondidos na manga de um trapaceiro. E, embora confira grande carisma ao personagem, Baldwin mantém o público ciente de que este é um indivíduo perigoso e pouco confiável.

Fotografado com eficiência por Jim Whitaker, The Cooler faz jus ao título e está constantemente banhado em cores frias que realçam a atmosfera impessoal e cruel do cassino Shangri-La (que, apesar de ter o nome do `paraíso` de Horizonte Perdido, nada tem de benigno). Em certo momento, quando Bernie diz que quer morar em um lugar em que seja possível `diferenciar o dia da noite` e `que tenha relógios na parede`, o espectador compreende exatamente o que ele quer dizer, já que o filme conta com poucos planos em que os personagens se encontram sob a luz do sol.

É uma pena que, apesar de todas as suas qualidades, The Cooler não consiga provocar maior impacto, já que, ao exagerar na `virada de sorte` de Bernie , abandona seu vínculo com a realidade, tornando-se fantástico demais – o que diminui nosso envolvimento com os personagens de Macy e Bello nos minutos finais de projeção (quando, teoricamente, deveríamos alcançar uma intimidade maior com o casal). Pelo jeito, nem mesmo o filme conseguiu escapar totalmente do pé-frio de seu protagonista...
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13 de Dezembro de 2003

Pablo Villaça, 18 de setembro de 1974, é um crítico cinematográfico brasileiro. É editor do site Cinema em Cena, que criou em 1997, o mais antigo site de cinema no Brasil. Trabalha analisando filmes desde 1994 e colaborou em periódicos nacionais como MovieStar, Sci-Fi News, Sci-Fi Cinema, Replicante e SET. Também é professor de Linguagem e Crítica Cinematográficas.

 

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