Datas de Estreia: | Nota: | ||
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Brasil | Exterior | Crítico | Usuários |
11/02/2016 | 25/11/2015 | 4 / 5 | 4 / 5 |
Distribuidora | |||
Paris Filmes | |||
Duração do filme | |||
111 minuto(s) |
Dirigido por John Crowley. Roteiro de Nick Hornby. Com: Saoirse Ronan, Jim Broadbent, Maeve McGrath, Julie Walters, Emory Cohen, Eva Birthistle, Jane Brennan, James DiGiacomo, Fiona Glascott, Eileen O’Higgins, Emily Bett Rickards, Nora-Jane Noone, Jessica Paré, Brid Brennan e Domhnall Gleeson.
Brooklyn é uma obra tocante construída a partir de uma história simples. Baseado em um livro de Colm Tóibín, o longa se passa no início da década de 50 e acompanha a jovem Eilis (Ronan), que, morando em uma pequena vila na Irlanda com a mãe e a irmã, se prepara para viajar para os Estados Unidos a fim de iniciar uma nova vida. E basicamente é isso. Porém, não se engane: ao longo de seus 111 minutos, o filme faz um sensível estudo de personagem ao acompanhar a garota, que, de imigrante insegura, frágil e que basicamente faz o que os outros determinam, se transforma aos poucos em uma mulher forte, capaz de tomar decisões difíceis e que enxerga as nuances de seu cotidiano e reage a estas com segurança.
Mas Brooklyn é também um romance envolvente: adaptado por Nick Hornby (autor dos livros que originaram Um Grande Garoto e Alta Fidelidade), o roteiro encontra drama no cotidiano aparentemente prosaico da protagonista e em seu relacionamento com o jovem Tony (Cohen), que, membro de uma família de italianos quase caricaturais (seu irmão caçula praticamente rouba o filme), demonstra uma devoção intensa à sua paixão recém-nascida. Assim, quando Eilis é obrigada a retornar à Irlanda temporariamente, o espectador percebe, surpreso, como havia sido capturado pela narrativa, passando a se importar profundamente com o destino de cada uma daquelas pessoas.
Dirigido pelo irlandês John Crowley (do ótimo Dias Selvagens e dos corretos Rapaz A e Circuito Fechado), o longa estabelece uma clara distinção em sua abordagem ao lidar com os três atos da narrativa: se o primeiro ato, ambientado na Irlanda, é concebido como um mundo frio, triste, escuro e com cores dessaturadas, tudo muda radicalmente com a chegada de Eilis a Nova York, já começando pela superexposição que marca sua passagem pela Imigração, quando abre a porta para sair rumo a uma explosão esperançosa de luz. A partir daí, o diretor de fotografia Yves Bélanger converte a produção em um mundo de cores quentes, saturadas e variadas de um país idealizado pelo american way of life, mantendo o calor da luz e da paleta ao retornar à Irlanda, quando vemos os mesmos ambientes do primeiro ato agora sob uma ótica menos sombria - e que Bélanger não tenha sido indicado ao Oscar por seu trabalho é algo incompreensível.
Enquanto isso, o design de produção de François Séguin (também absurdamente ignorado pela Academia) complementa a abordagem estética do projeto ao empregar as cores como símbolos da trajetória de sua heroína: frequentemente vista com roupas de um verde intenso (ela é irlandesa, afinal de contas), Eilis não tem dificuldade em atrair o olhar do espectador – seja ao se encontrar em meio a vários companheiros de viagem vestidos em tons pastéis ou ao caminhar pelas ruas de Nova York. Por outro lado, sua timidez no que diz respeito a relacionamentos amorosos e ao sexo é ressaltada por seus encontros com duas mulheres que, não enfrentando qualquer problema nestas áreas, surgem em roupas vermelhas que logo contagiam a moça (que, depois de ouvir os conselhos de uma delas, traz uma peça avermelhada sob o casaco verde). Ainda assim, o mais interessante é reparar como a adaptação da protagonista ao novo país se reflete em seu figurino, que se torna mais variado, trazendo tons em azul e, principalmente, amarelos em tom dourado que expressam sua felicidade crescente. (E também é curioso notar como o simples fato de usar óculos escuros ao retornar à Irlanda marca as profundas mudanças experimentadas pela personagem.)
Aliás, Brooklyn é um filme que jamais encontra dificuldades em expressar visualmente suas ideias: reparem, por exemplo, como a foto de Eilis na mesa de trabalho da irmã é substituída posteriormente por outra bastante similar, mas que traz uma pessoa diferente, e irão constatar como o retrato simboliza uma quase âncora naquele ambiente de trabalho. Da mesma maneira, a diferença na quantidade de roupas presentes na mala da protagonista em pontos diferentes da projeção aponta para suas conquistas pessoais e profissionais, por mais simples que sejam, ao passo que a solidão da garota é sugerida por planos como aqueles que a trazem encolhida no canto do quadro ou com o reflexo aprisionado pelas bordas de um espelho. E não é à toa que Crowley transforma o simples ato de aproximar a câmera lentamente do rosto de Saoirse Ronan quase em uma rima narrativa, já que boa parte da força da obra reside na performance da jovem atriz.
Neste aspecto, Brooklyn pode também ser visto como um veículo ideal para exibir o talento de Ronan (já óbvio desde Desejo e Reparação), que, em boa parte da projeção, enfrenta o complicado desafio de expressar as emoções de Eilis simplesmente através do olhar, seja através da intensidade com que acompanha uma aula, do embaraço ao desviar os olhos quando o namorado menciona os futuros filhos ou da melancolia com que estuda um salão de dança por saber que não voltará a vê-lo. Mantendo a voz constantemente baixa para ilustrar a timidez da moça, Ronan é hábil também ao evocar a dor de Eilis diante das perdas que sofre ou a saudade que experimenta ao ouvir uma canção que remete ao seu país de origem. Mas, acima de tudo, a atriz leva o público a sentir as dúvidas que atormentam sua personagem no terceiro ato e a reconhecer as razões que as inspiram.
Enquanto isso, Emory Cohen vive Tony como um sujeito doce cuja paixão por Eilis parece explodir em seu olhar de devoção e na timidez com que se comporta ao lado da amada. A dinâmica entre Ronan e Cohen, aliás, é fundamental para que passemos a nos importar tanto com o futuro do casal, sendo contraposta também com eficácia por aquela que é construída por Ronan e Domhnall Gleeson, que acaba por exibir uma vulnerabilidade instrumental para que também aprovemos suas intenções românticas. (Aliás, que ano fantástico teve Gleeson, que se destacou em O Despertar da Força, O Regresso e Ex Machina.) Fechando o elenco, Jim Broadbent encarna a bondade do padre Flood com seu carisma habitual, enquanto Julie Walters transforma a sra. Keogh em alívio cômico embora jamais pareça estar tentando provocar o riso, numa demonstração louvável de seu talento.
Como resultado, Brooklyn nos leva a torcer pelo amor de um casal com ambições humildes e a perceber que estas não os tornam menos importantes, valiosos ou bem sucedidos, já que suas vitórias são determinadas não apenas pelo ponto de chegada, mas pela distância que percorreram desde o ponto de partida.
06 de Fevereiro de 2016