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Críticas por Pablo Villaça

Datas de Estreia: Nota:
Brasil Exterior Crítico Usuários
21/09/2012 01/01/1970 4 / 5 4 / 5
Distribuidora
Paris Filmes
Duração do filme
106 minuto(s)

Dredd
Dredd

Dirigido por Pete Travis. Com: Karl Urban, Olivia Thirlby, Lena Headey, Rakie Ayola, Wood Harris, Domhnall Gleeson, Langley Kirkwood.

Ao assistir a Dredd, pensei constantemente em Robocop. Ambos se passam numa metrópole futurista tomada pela violência que depende de uma força policial atípica para deter a criminalidade e contam histórias que trazem a mais brutal violência como recurso narrativo central – além, claro, de girarem em torno de um policial veterano e de uma novata que se veem vitimados por quadrilhas absolutamente impiedosas. Além disso, são ótimos filmes que sobrevivem às armadilhas do gênero, criando universos realistas (apesar do absurdo de suas premissas) e angustiantes. Em outras palavras, este novo Dredd nada tem a ver com aquela besteira estrelada por Sylvester Stallone em 1995; se aqui pensei em Robocop, lá pensei em Super Mario Bros.

Escrito por Alex Garland (Extermínio, Não Me Abandone Jamais) a partir dos quadrinhos de Carlos Ezquerra e John Wagner, o filme conta uma história simples: num mundo pós-apocalíptico, a colossal Mega City One é atormentada pela violência e depende dos Juízes para tentar contê-la. Autorizados a prender, julgar e executar a sentença imediatamente, estes oficiais mantêm os rostos sempre encobertos por um capacete que mantém seu anonimato e servem como um substituto do capuz clássico do carrasco. É neste contexto que conhecemos o Juiz Dredd (Urban), que recebe a tarefa de avaliar a novata Anderson (Thirlby), que, mesmo falhando em seus testes, possui poderes psíquicos que talvez sejam uma vantagem para a organização. No primeiro chamado da dupla, porém, Dredd e Anderson vão parar na torre Peach, uma favela vertical de 200 andares dominada pela traficante Ma-ma (Headey) – que, determinada a evitar que os oficiais da lei saiam dali com o bandido Kay (Harris), isola o complexo e ordena a execução dos Juízes.

Centralizando praticamente toda a ação naquele cenário limitado, Dredd se torna, assim, menos uma ficção futurista e mais um exemplar claustrofóbico a adotar a estrutura narrativa do protagonista encurralado”, que já rendeu obras como Assalto à 13ª DP e na qual também se encaixam, em maior ou menor grau, títulos como Um Dia de Cão, A Noite dos Mortos-Vivos, [REC], entre outros – e cuja eficiência depende da criação de personagens com os quais passemos a nos importar e que enfrentam obstáculos cada vez maiores em um espaço físico restrito. Neste aspecto, aliás, o design de produção de Mark Digby merece créditos por criar ambientes que mantêm certo padrão sem soarem terrivelmente repetitivos – e os longos corredores (provavelmente completados com o auxílio de efeitos visuais) também servem bem à ótima fotografia em 3D, que explora aqueles espaços com grande profundidade de campo ao mesmo tempo em que o diretor Pete Travis e o montador Mark Eckersley enfocam a ação com intensidade, mas sem histerismo, permitindo que compreendamos o que ocorre e evitando a confusão visual de cortes excessivos em uma obra rodada em três dimensões.

Mas o experiente diretor de fotografia Anthony Dod Mantle (aliás, Dredd conta com vários integrantes da equipe habitual de Danny Boyle) acerta também na câmera extremamente lenta que emprega para filmar certas sequências – e que aqui encontram justificativa narrativa na existência da droga “slo-mo”, cujo principal efeito sobre os viciados é provocar a sensação de que o tempo se encontra numa velocidade equivalente a um centésimo do normal (e eu não me espantarei caso alguns destes planos tenham sido rodados a alguns milhares de frames por segundo). Porém, estas imagens não surgem apenas hipnóticas, mas também acabam criando uma espécie de “cosmética da morte” (para parafrasear um conceito da teórica Ivana Bentes), tornando o gore belo ao retratar balas que perfuram lentamente a pele das vítimas e jatos de sangue que se transformam em pinturas abstratas suspenses por segundos no ar.

Não que Dredd trate a violência com leveza: com exceção destes planos em extrema câmera lenta (e que também ressaltam o terror das pessoas que são obrigadas a testemunhar a iminência da própria destruição por uma eternidade), o filme é cru na maneira com que retrata as consequências dos atos dos personagens – e em certo momento a novata Anderson é obrigada a encarar a tragédia de tirar a vida de alguém, sendo obviamente impactada pelo acontecimento. Por outro lado, o longa exige que façamos um imenso compromisso moral ao aceitarmos a infalibilidade de seus heróis, já que certamente faríamos ressalvas ao próprio conceito da trama caso admitíssemos a possibilidade de Dredd e Anderson executarem alguém injustamente.

Conseguindo a proeza de conferir humanidade ao protagonista mesmo contando apenas com a boca e o maxilar para expressar sentimentos muitas vezes complexos (sendo, claro, auxiliado pela voz grave e dura que os espectadores da versão dublada perderão), Karl Urban encarna Dredd como um homem íntegro, seguro e determinado que também exibe uma gentileza insuspeita sob o profissionalismo com o qual trata a novata Anderson, revelando-se um ótimo tutor mesmo sob fogo cerrado. Enquanto isso, Olivia Thirlby é hábil ao evocar a vulnerabilidade e as dúvidas da garota sem que, com isso, sua personagem soe fragilizada a ponto de soar implausível como candidata a Juíza. Para concluir, Lena Headey se destaca como a vilã Ma-ma não só por incorporar uma rara antagonista (o gênero ação sempre traz homens como vilões), mas por compô-la sem exagero ou caricatura, apostando numa voz sempre suave que torna a mulher ainda mais ameaçadora e imprevisível.

Desta forma, Dredd se estabelece como uma grata surpresa em um gênero que tende a apostar sempre no lugar-comum.

22 de Setembro de 2012

Pablo Villaça, 18 de setembro de 1974, é um crítico cinematográfico brasileiro. É editor do site Cinema em Cena, que criou em 1997, o mais antigo site de cinema no Brasil. Trabalha analisando filmes desde 1994 e colaborou em periódicos nacionais como MovieStar, Sci-Fi News, Sci-Fi Cinema, Replicante e SET. Também é professor de Linguagem e Crítica Cinematográficas.

 

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