Datas de Estreia: | Nota: | ||
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Brasil | Exterior | Crítico | Usuários |
25/03/2011 | 01/01/1970 | 3 / 5 | 3 / 5 |
Distribuidora | |||
Dirigido por Zack Snyder. Com: Emily Browning, Abbie Cornish, Jena Malone, Vanessa Hudgens, Jamie Chung, Carla Gugino, Oscar Isaac, Scott Glenn, Gerard Plunkett, Malcolm Scott, Richard Cetrone e Jon Hamm.
Madrugada dos Mortos, 300, Watchmen e A Lenda dos Guardiões: com apenas estes quatro filmes, o cineasta Zack Snyder conseguiu se estabelecer com segurança entre os realizadores mais bem-sucedidos da atualidade – e merecidamente, já que realmente é um diretor com um belíssimo olhar para composições e com dom para o espetáculo. Infelizmente, porém, ele parece ter comprado a idéia dos marketeiros da Warner, estúdio responsável por distribuir seus trabalhos, de que é uma espécie de “visionário”, o que está longe de ser verdade – e, possivelmente movido por esta convicção, entregou-se em Sucker Punch a um exercício masturbatório (em vários sentidos, como verão) no qual parece apostar na força de suas imagens em detrimento da história, dos temas ou mesmo do puro entretenimento, criando um longa indiscutivelmente belo, mas inegavelmente vazio.
Representando (não por coincidência) a primeira vez em que trabalha com um material original (todos os seus demais projetos eram adaptações ou refilmagens), Snyder e o co-roteirista estreante Steve Shibuya investem numa narrativa que não tem espaço para sutilezas - e já nos primeiros segundos de projeção, o padrasto da heroína surge sorrindo no enterro da esposa diante da expectativa dos abusos aos quais submeterá as enteadas mais tarde. Quando seus avanços despertam a fúria protetora da protagonista, porém, uma tragédia acaba levando a moça a uma prisão-hospício e uma lobotomia é marcada para dali a cinco dias, restando a ela este curto espaço de tempo para planejar sua fuga – o que ela faz enquanto cria um universo fantasioso para tornar sua situação mais suportável e no qual se imagina vivendo em uma espécie de cabaré-prisão no qual as detentas devem participar de shows burlescos montados para uma clientela selecionada. E este é apenas o primeiro nível de seus esforços imaginativos, já que ocasionalmente ela escapa para um segundo universo no qual é uma super-heroína (de videogames, provavelmente) que deve cumprir missões específicas planejadas por um sujeito misterioso (Glenn).
Parte A Origem, parte Moulin Rouge, parte Um Estranho no Ninho e parte Showgirls, Sucker Punch – Mundo Surreal já tem início assumindo sua condição de fantasia over ao abrir a narrativa com uma cortina que literalmente revela o palco no qual a protagonista se encontra – e, desta maneira, é razoável perdoar certos exageros operescos de Snyder (como o padrasto unidimensional), que, afinal, não se preocupa nem mesmo em disfarçar o fato de ter concebido uma superprodução para externar todo tipo de fantasia masculina ao trazer um elenco de beldades vestindo roupas mínimas enquanto são obrigadas a dançar sensualmente para o deleite dos poderosos homens que as controlam. Além disso, mesmo objetificando suas atrizes, Snyder simultaneamente as endeusa, jamais negando o poder que, afinal, exercem sobre o sexo oposto – algo similar à abordagem de Robert Rodriguez em Sin City e o oposto do que o demente Eli Roth faz em seus filmes ao punir suas personagens femininas por serem quem são.
Adotando uma lógica visual interessante ao lado do diretor de fotografia Larry Fong, o cineasta é hábil ao estabelecer o universo “real” (que já é estilizado, diga-se de passagem) como um mundo no qual o cinza drenou todas as demais cores e no qual os humanos surgem como criaturas sempre pálidas – algo que se contrapõe diretamente à paleta mais forte do “cabaré” imaginado por Baby Doll (Browning) e cuja natureza teatral é realçada pelo excesso de maquiagem que cobre até mesmo os personagens masculinos (o vilão interpretado por Oscar Isaac, por exemplo, surge sempre com delineador). Ao mesmo tempo, o design de produção concebe esta fantasia como um espaço que combina de forma curiosa o glamour do showbusiness (como nos camarins, no palco e na platéia) e a opressão oferecida pela prisão (como nos dormitórios, no espaço para ensaios e na cozinha, com suas paredes descascadas e de cores chapadas). Mas é no nível mais profundo da fantasia de Baby Doll que a produção realmente se liberta, criando um mundo imaginativo que, mesmo calcado em cores tristes, oferece visões espetaculares como a da catedral semidestruída cuja escadaria termina em trincheiras da Primeira Guerra, os aviões de madeira e por aí afora (e é preciso aplaudir também a coerência de detalhes como os elementos cor-de-rosa que acompanham a personagem Amber em todas as suas aparições, por exemplo).
Porém, Sucker Punch não é apenas a satisfação dos fetiches de seu diretor, mas também uma oportunidade para que possa brincar com diferentes estilos narrativos – e cada “missão” executada por Baby Doll e suas parceiras assume as características de um gênero em particular, do wuxia pian chinês (com suas lutas que desafiam a gravidade) à ficção-científica (com seus robôs e cidades futuristas), passando pelo filme de guerra (com a câmera inquieta, grão mais grosso e cortes freqüentes) e pela fantasia ao estilo O Senhor dos Anéis (com direito a orcs e tudo mais). Aliás, Snyder se permite até mesmo brincar com os zumbis que marcaram sua estréia no comando de longas enquanto homenageia (suga?) obras que vão de O Resgate do Soldado Ryan a Matrix, passando por praticamente todos os longas anteriores do próprio diretor.
O problema é que a mesma estrutura que torna Sucker Punch interessante (e é bacana acompanhar a fluidez entre os vários universos) também o condena ao fracasso, já que, em última análise, sabemos que nenhuma das aventuras protagonizadas pelas mocinhas representa risco real, existindo apenas em suas fantasias – e, com isso, somos obrigados a acompanhar os desvarios visuais de Snyder sem que estes tragam qualquer benefício à narrativa, funcionando como um fim em si mesmos. E é neste sentido que o cineasta expõe seu narcisismo ao parecer acreditar que a beleza de seus quadros seria o bastante para sustentar o projeto – e não é, resultando num clímax emocionalmente vazio e, portanto, decepcionante.
Mas até mesmo enquanto exercício estético Sucker Punch desaponta. Sim, os planos criados pelo cineasta são belos, elegantes e muitas vezes surpreendentes, mas seu apego patológico à câmera lenta, já presente em grande escala em seus trabalhos anteriores, aqui assume características de transtorno obsessivo-compulsivo - e há uma seqüência em um trem em movimento no qual Snyder parece diminuir a velocidade dos planos de dois em dois segundos, como se dissesse: “Viram isso? Viram isso? Vejam este cartucho saindo da arma! E que tal este salto da protagonista? Hein? Hein? Hein? Não sou genial?”. Como se não bastasse, ainda que invencionismos como o travelling que traz três garotas conversando diante de um espelho e que magicamente parece atravessá-lo sejam interessantes, não contribuem de fato para a narrativa, soando como exibicionismo do diretor – e o mesmo se aplica a planos como aquele que mostra as cinzas de um cigarro se partindo sobre os sapatos de um vilão e que, mesmo bonito, é totalmente descartável para o desenrolar do filme.
Com um elenco feminino tentador (além das belas Abbie Cornish e Vanessa Hudgens, Emily Browning, com sua fantasia de colegial, surge como uma Mini-me de Cameron Diaz), o longa mostra-se obviamente apaixonado por suas atrizes ao mesmo tempo em que estabelece os personagens masculinos como criaturas gordas, suadas, violentas e repulsivas, o que não é necessariamente ruim.
Aliás, se tivesse o bom senso de se reconhecer como uma bobagem-fetiche, Sucker Punch seria uma besteira divertida, mas ao levar-se a sério – como comprova a filosofada besta que encerra a projeção – acaba obrigando o espectador a reconhecê-lo como o que é: um templo dedicado aos exercícios estéticos de seu diretor que, embora talentoso, parece ter se esquecido de criar uma história que explorasse melhor suas imagens.
25 de Março de 2011
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