Datas de Estreia: | Nota: | ||
---|---|---|---|
Brasil | Exterior | Crítico | Usuários |
22/03/2002 | 01/03/2002 | 4 / 5 | / 5 |
Distribuidora | |||
Duração do filme | |||
111 minuto(s) |
Dirigido por Marc Foster. Com: Halle Berry, Billy Bob Thornton, Peter Boyle, Heath Ledger, Sean ‘Puffy’ Combs e Coronji Calhoun.
A Última Ceia é um filme que traz, em pouco menos de duas horas, uma série de tragédias de difícil assimilação. No entanto, em vez de se transformar em um melodrama sobre morte e violência, o filme opta por analisar o comportamento de personagens que vivem em constante sofrimento – e a busca destes por algo que se assemelhe, ao menos em parte, ao conceito de felicidade.
Quando a história tem início, somos apresentados a Hank Grotowski (Thornton), um oficial de polícia que reside em uma pequena cidade do sul dos Estados Unidos e que recebe a incumbência de comandar a execução de um preso condenado à morte. Entre seus auxiliares na tarefa, está seu filho, o sensível Sonny (Ledger), com quem ele mantém uma relação conturbada. Completando esta pequena família desarmoniosa, temos Buck (Boyle), pai de Hank – um homem amargo e profundamente racista que guarda mágoas de sua falecida esposa, cujo suicídio ele considera como uma traição. Depois de ter sua vida abalada por uma tragédia, o policial se envolve com a bela Leticia (Berry), que também enfrenta um período difícil (e o fato da moça ser negra não o impede de levar o relacionamento adiante, apesar do preconceito racial herdado do pai). O que a garota não sabe – e que Hank não tem coragem de revelar – é que seu novo namorado foi o responsável pela execução de seu ex-marido.
No entanto, não é o amor ou mesmo a pura atração sexual que atraem estas duas pessoas – algo que o roteiro de Milo Addica e Will Rokos explora com grande sensibilidade. Marcados por vidas infelizes e sem possuírem perspectivas de um futuro melhor, Hank e Leticia recorrem um ao outro com um desespero comovente, como se buscassem algum tipo de conforto temporário através do simples contato com outra (leia-se: qualquer) pessoa. Quando se entregam ao sexo (em uma cena quase explícita), eles não procuram o orgasmo, mas apenas uma sensação agradável que afaste provisoriamente o vazio de suas existências.
Halle Berry, como Leticia, oferece indubitavelmente o melhor desempenho de sua carreira, conferindo enorme autenticidade a uma personagem sofrida, mas não inocente. Leticia é uma mulher simplória que, além de guardar mágoas de seu ex-marido, não hesita em espancar o filho ao surpreendê-lo comendo doces às escondidas (ela não esconde seu desagrado com relação ao peso do garoto). Hank, enquanto isso, está longe de ser o par romântico ideal: preconceituoso e violento, ele é capaz de dizer coisas terríveis para o próprio filho, e passa boa parte do filme exibindo tamanha introspecção que o espectador permanece constantemente confuso com relação aos verdadeiros sentimentos do sujeito. Fechando o elenco estão Peter Boyle, vivendo um personagem odioso, e Heath Ledger, em uma participação curta, mas marcante.
Dirigido por Marc Foster com uma atmosfera sufocante, mas ideal para a proposta do roteiro, A Última Ceia mergulha sem reservas no triste universo de seus protagonistas, retratando-os de forma honesta e, justamente por isso, despertando reações ambíguas na platéia. Em certo instante, por exemplo, alguém diz a Hank que este cuida muito bem de Buck e que, portanto, deve amá-lo muito, ao que ele responde: `Não, não amo. Mas ele é meu pai`. A resposta é sincera – e compreensível, já que Buck é mesmo abominável -, mas não podemos deixar de constatar que a frieza de Hank jamais o deixaria ser o que poderíamos chamar de uma companhia agradável.
É claro que, a certa altura, Leticia descobre o segredo do namorado (não estou contando nada de mais, já que qualquer um poderia deduzir facilmente que isso aconteceria) – e sua reação, que não vou revelar, é a prova máxima da ambição do filme, que evita os clichês e utiliza a descoberta como artifício para conferir uma profundidade ainda maior à personagem.
A Última Ceia não prega a felicidade perfeita comercializada por Hollywood. Para sermos felizes, diz o filme, precisamos fazer constantes concessões – e algumas destas exigem verdadeiros sacrifícios pessoais. Em certo momento da história, alguém diz: `Acho que ficaremos bem`. Este não é um sonho ambicioso, mas já é bastante satisfatório para o mundo de violência e mentiras no qual vivemos atualmente. Não é o Paraíso, mas, ao menos, não chega a ser uma espécie de inferno.
22 de Março de 2002