Datas de Estreia: | Nota: | ||
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Brasil | Exterior | Crítico | Usuários |
01/03/2002 | 01/01/1970 | 1 / 5 | / 5 |
Distribuidora | |||
Duração do filme | |||
144 minuto(s) |
Dirigido por Ridley Scott. Com: Josh Hartnett, Eric Bana, Tom Sizemore, Ewan McGregor, William Fichtner, Jason Isaacs, Ewen Bremner, Ron Eldard, Jeremy Piven, Orlando Bloom e Sam Shepard.
Como toda produção de Jerry Bruckheimer, Falcão Negro em Perigo é irrepreensível em sua parte técnica: montado com vigor estonteante e contando com efeitos sonoros ensurdecedores, este novo filme de Ridley Scott simplesmente atira o espectador para dentro de um sangrento confronto de forma incrivelmente realista.
Inspirado no livro de Mark Bowden, o roteiro de Ken Nolan narra os eventos relativos a uma fracassada (e verídica) manobra militar promovida pelo exército americano na Somália, em outubro de 1993. Concebida pelo general William Garrison, a operação visava a captura de dois importantes integrantes do governo do ditador Mohamed Farrah Aidid, que vinha promovendo um longo massacre no país. Porém, ao subestimar a força das milícias locais, a Inteligência Militar americana colocou suas tropas em uma posição vulnerável, resultando na queda de dois helicópteros Falcão Negro. Determinados a não deixar companheiro algum para trás, os soldados tentam resgatar os feridos, mas acabam sendo cercados por uma hostil (e absolutamente assustadora) multidão de guerrilheiros. Com isso, uma manobra que deveria durar apenas trinta minutos se arrastou por várias horas, resultando na morte de 19 americanos e de mais de mil somalis.
Se do ponto de vista técnico Falcão Negro em Perigo é perfeito, infelizmente o mesmo não pode ser dito sobre seus aspectos narrativos: obcecado pela idéia de reproduzir o terrível incidente de forma realista, o filme acaba se resumindo a uma longa seqüência envolvendo trocas de tiros, explosões e mortes, sem se preocupar com o lado humano da tragédia. Aliás, nos poucos momentos em que faz pequenas pausas para se concentrar em seus personagens, o roteiro de Nolan não consegue escapar das mais velhas convenções do gênero, apelando para diálogos do tipo `Diga ao meu pai que lutei com bravura`, `Envie esta carta para minha família`, e assim por diante. Para piorar, a produção se revela insuportavelmente `patriota` (eufemismo para `tendenciosa`) ao retratar os somalis como sádicos selvagens, enquanto os americanos são vistos como soldados justos e idealistas (nem é preciso dizer que cada morte do lado dos heróis é pranteada como uma terrível tragédia, ao passo que as infinitamente superiores baixas entre os inimigos são vistas como motivo de júbilo).
Outro aspecto que incomoda é a tal filosofia do `Não deixaremos ninguém para trás`: na teoria, esta é uma postura admirável e inspiradora, mas, na prática, acaba soando um pouco diferente: em certo momento, os militares levam três horas para recuperar o corpo de um piloto, arriscando, com isso, as vidas de dezenas de soldados – algo que só pode ser explicado pela obsessão americana pela figura do herói (isto sempre me lembra de Duro de Matar, quando Hans Gruber pergunta se John McClane é `mais um órfão de uma cultura falida que viu muitos filmes quando criança e que acredita ser John Wayne`). Aliás, não deixa de ser curioso observar que estes corajosos militares são capazes de tudo para resgatar um cadáver, mas não hesitam em deixar meia dúzia de soldados para trás em função da `falta de espaço` em seus meios de transporte.
Por outro lado, Falcão Negro em Perigo repete o feito de O Resgate do Soldado Ryan ao ilustrar a brutalidade repulsiva da guerra, bombardeando o espectador com imagens fortes que revelam a fragilidade do corpo humano frente aos seus armamentos (há uma seqüência envolvendo uma cirurgia que certamente chocará os integrantes mais sensíveis da platéia). Na verdade, Ridley Scott não poupa esforços para conferir uma dramática veracidade ao filme, que jamais soa como uma `aventura hollywoodiana` (a exemplo do que ocorreu em Pearl Harbor). Não é à toa que, em diversos momentos, o cineasta fotografa a ação com a câmera nos ombros, como se assistíssemos a uma reportagem realizada no campo de batalha – impressão realçada pela ótima utilização do Marrocos como locação.
É uma pena que Scott venha emprestando seu talento a produções com roteiros tão medíocres. Estes projetos podem até lhe render um bom dinheiro, mas dificilmente trarão o reconhecimento de gerações futuras, como em Blade Runner ou Alien, o Oitavo Passageiro (e considero duvidosa sua indicação ao Oscar por este filme, já que um projeto como este certamente envolveu uma participação colossal do diretor de segunda unidade. No mínimo, portanto, Scott deveria dividir a indicação com Alexander Witt, que o acompanhou em seus três últimos projetos).
No fim das contas, Falcão Negro em Perigo nada mais é do que a competente recriação de uma terrível batalha – uma recriação que ignora completamente o drama humano envolvido na questão. Aliás, é lamentável que o filme exija nossa compaixão pelos 19 americanos mortos em face aos mais de mil somalis que pereceram no conflito – o que me leva à seguinte indagação: se as vidas destes americanos são tão preciosas, por que o governo dos Estados Unidos não se cansa de enviar seus jovens soldados para a morte em vários países do mundo?
A esta altura, eles já deveriam ter aprendido a lição.
11 de Março de 2002