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Críticas por Pablo Villaça

Datas de Estreia: Nota:
Brasil Exterior Crítico Usuários
09/06/2006 09/05/2006 2 / 5 / 5
Distribuidora
Duração do filme
103 minuto(s)

Sorte no Amor
Just My Luck

Dirigido por Donald Petrie. Com: Lindsay Lohan, Chris Pine, Faizon Love, Missi Pyle, Samaire Armstrong, Bree Turner, Makenzie Vega, Carlos Ponce e a banda McFly.

 

Depois de atravessar a infância e a adolescência nas telas, finalmente estourando no ótimo Meninas Malvadas, Lindsay Lohan virou mulher. Conseqüentemente, deu o passo inevitável de toda jovem atriz que quer se estabelecer como opção comercialmente viável para produtores à procura da nova Meg Ryan, Sandra Bullock ou Julia Roberts: decidiu estrelar sua própria comédia romântica. A boa notícia é que, mesmo contendo a energia juvenil que a tornou tão interessante em seus trabalhos anteriores, Lohan consegue demonstrar carisma e boa presença ao viver sua primeira personagem adulta. A má notícia é que, embora teoricamente pertença ao gênero citado acima, Sorte no Amor não é nem engraçado nem romântico.

           

Aqui, a atriz vive Ashley Albright, funcionária de uma grande empresa de relações-públicas de Nova York que, além de bonita e bem-sucedida, é extremamente sortuda: temporais são interrompidos quando ela sai à rua, cédulas de dinheiro grudam em seu sapato e há sempre um táxi ou elevador pronto para transportá-la. Já o pobre Jake Hardin (Pine) é o Donald que se opõe ao Gastão de Ashley: dono de um azar que chega a ser contagioso, ele é obrigado a tomar um cuidado extremo até mesmo ao atravessar a rua, já que suas tarefas mais simples podem resultar em desastre. Certa noite, durante uma festa promovida pela garota, os dois acabam se beijando e transferindo seus karmas um para o outro, transformando a vida de Ashley em um caos absoluto e a de Jake em uma sucessão de vitórias. Agora, a moça deve descobrir quem é o misterioso rapaz que roubou sua sorte (ambos estavam mascarados) e beijá-lo novamente a fim de recuperá-la.

           

Antes de qualquer coisa, permitam que eu externe meu espanto: foram necessárias quatro pessoas para criar esta história?!? Para compreender como algo assim é possível, vou até repetir o exercício de imaginação que fiz ao comentar sobre As Loucas Aventuras de James West e tentar recriar a reunião dos quatro argumentistas (se eles não precisam ser originais, eu também posso me dar um desconto, ok?): “Ei, tive uma idéia. Um filme estrelado por uma garota!”, inicia o primeiro. “Grande idéia. E por um rapaz!”, completa o segundo, dando tapinhas congratulatórios nas próprias costas. “Uau, genial. Ei! Que tal se eles trocassem de corpos?”, sugere o terceiro. “Hum... A Lindsay Lohan fez um filme assim, recentemente.”, rebate o primeiro. Neste instante, o quarto argumentista, que dormia profundamente, acorda ao ouvir o nome da atriz e entra na roda: “Oh, eu estava sonhando com ela, acreditam? Aliás, ela seria uma boa opção pro nosso projeto, hein? Se ao menos já tivéssemos uma história...”. “Nós já temos, pô! Presta atenção na reunião! O filme vai ter uma mocinha e um rapaz!”. “Uau. Vocês pensaram em tudo isso apenas enquanto eu tirava um cochilo rápido?”, espanta-se o dorminhoco – e, tragicamente, sem um pingo de cinismo. “Sim, somos rápidos. Mas voltando à Lindsay Lohan... seria uma sorte danada se ela topasse!”. “Pois é, e... ei! Sorte? Que tal se a mocinha da nossa história fosse muito sortuda?”, sugere alguém. “Que conceito espetacular! E se, em vez de trocar de corpos, o casal trocasse de sorte? Ela fica azarada e ele, sortudo!”. Silêncio respeitoso. Finalmente, o primeiro diz: “Oh... my... God! Já posso até ver o trailer!”. “Eu também! E podemos até incluir uma importante lição de moral: ela aprende a valorizar o que tinha!”. Outro silêncio cheio de reverência. “Você é um filósofo, cara! Profundo, isso. Gostei.”. “É, mas e o drama? Não podemos nos esquecer do drama!”, diz o quarto integrante do grupo, acordando assustado de outro cochilo. Todos pensam durante alguns minutos. Na realidade, algumas horas. Finalmente, o autor da idéia original levanta-se em um salto: “Encontrei! Estão preparados? Em certo momento, ela fica desiludida... e diz que vai sair da cidade! Então... (estou até arrepiando só em imaginar a cena!)... ele corre atrás dela, até a estação, a fim de impedi-la e declarar seu amor!”. Todos caem em prantos. “Agora só precisamos contratar alguém pra colocar tudo isso no papel!”. Cada um vai para sua casa. É a final de American Idol e ninguém quer perder o resultado. Antes de saírem, anotam a história em um guardanapo e enviam para o executivo do estúdio responsável pelo projeto. Que chora de emoção ao ler o argumento.

           

Com um roteiro aparentemente escrito por macacos, Sorte no Amor tinha mesmo poucas chances de se tornar uma surpresa agradável – e, para piorar, o cineasta Donald Petrie demonstra uma falta de inspiração preocupante. Mesmo depois de comandar as divertidas comédias Dois Velhos Rabugentos, Miss Simpatia e Como Perder um Homem em 10 Dias, Petrie parece totalmente perdido, criando gags que são telegrafadas para o espectador muito antes de acontecerem, como o guarda-chuvas que é atingido por um raio e toda a cena na lavanderia. Além disso, ele parece sem energia até mesmo para imprimir ritmo a uma montagem básica na qual a protagonista surge beijando vários homens, desperdiçando uma das poucas boas idéias do roteiro. Finalmente, Petrie comete o pecado capital de ofender a inteligência de seu público: no momento em que Ashley compreende que sua sorte foi trocada com o misterioso mascarado, o diretor inclui um flashback recapitulando tudo o que acontecera nos últimos 10 minutos, como se não fôssemos capazes de entender, sozinhos, o raciocínio da mocinha.

           

Se bem que, honestamente, não sei se a palavra “raciocínio” pode ser aplicada aos processos mentais da personagem de Lohan, já que, aparentemente, junto com sua sorte ela também perdeu cerca de 200 pontos de Q.I. – afinal, boa parte dos problemas que ela enfrenta depois do fatídico beijo é provocada não por azar, mas por decisões incrivelmente estúpidas, como ligar uma máquina de lavar roupas mesmo depois de ter despejado uns 10 quilos de sabão em pó no aparelho. E o que dizer da cena em que, depois de derrubar uma de suas lentes de contato na caixa de areia de um gato, ela recupera o disquinho de plástico e o coloca no olho sem lavar – o que, é claro, provoca uma infecção. Azarada? Não, não: “porca” é o termo mais apropriado. Enquanto isso, o mocinho vivido pelo carismático Chris Pine passa por uma transformação curiosa: como primeiro sinal da sorte encontrada depois de anos de azar, ele aparentemente descobre que não precisa mais usar óculos! Eu não sabia que problemas oftalmológicos eram resultado de má sorte, mas podem apostar que passarei a carregar trevos de quatro folhas e pés-de-coelho de agora em diante – e mal posso esperar até minha miopia desaparecer. E pensar que gastei tanto dinheiro com óculos e lentes...

           

Ainda mais prejudicado pela presença de uma boy band tão medíocre quanto suas similares, Sorte no Amor conta com a distinção de ter sido produzido por ninguém menos do que Bruce Willis – o que me leva a crer que ele tenha batido a cabeça durante as filmagens de Sin City. Mas estamos quites: depois de assistir a este longa, quem passou 15 minutos batendo a cabeça na parede fui eu.
``

 

08 de Junho de 2006

 

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Pablo Villaça, 18 de setembro de 1974, é um crítico cinematográfico brasileiro. É editor do site Cinema em Cena, que criou em 1997, o mais antigo site de cinema no Brasil. Trabalha analisando filmes desde 1994 e colaborou em periódicos nacionais como MovieStar, Sci-Fi News, Sci-Fi Cinema, Replicante e SET. Também é professor de Linguagem e Crítica Cinematográficas.

 

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