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Críticas por Pablo Villaça

Datas de Estreia: Nota:
Brasil Exterior Crítico Usuários
06/04/2017 21/05/2016 2 / 5 / 5
Distribuidora
Duração do filme
95 minuto(s)

Cães Selvagens
Dog Eat Dog

Dirigido por Paul Schrader. Roteiro de Matthew Wilder. Com: Nicolas Cage, Willem Dafoe, Christopher Matthew Cook, Paul Schrader, Louisa Krause, Omar J. Dorsey, Reynaldo Gallegos, Jessica Sonneborn.

Os três criminosos que ocupam o centro de Dog Eat Dog se acham capazes de tudo, mas são profundamente estúpidos – um nível de estupidez que já os enviou para a prisão duas vezes, deixando-os próximos de atingir a marca determinada pela lei dos “three strikes”, que condena à prisão perpétua qualquer um condenado três vezes pela justiça norte-americana. Decididos a evitar este destino, eles se envolvem num “último golpe” planejado pelo sombrio Grecco o Grego (o diretor Paul Schrader, estreando como ator aos 70 anos de idade), mas, claro, nada sai como o previsto.


Se há algo que admiro profundamente é a capacidade de um artista de se reinventar e, principalmente, de fazer questão de se desafiar constantemente – e assim como aplaudi Scorsese e Wenders abraçando o 3D aos 70 anos (e bem) e George Miller usando um frame rate reduzido para impulsionar as sequências de ação de Mad Max, não só me vejo compelido a aplaudir Schrader por se arriscar como ator, mas também por seu experimentalismo ao conduzir este Dog Eat Dog. O resultado pode ser apenas mediano, mas o risco é fantástico.

Baseado em um livro de Edward Bunker (o Mr. Blue de Cães de Aluguel), o roteiro de Matthew Wilder se interessa menos pelos planos de seus personagens do que por suas personalidades. Não à toa, Schrader concebe uma linguagem visual que não busca a narrativa objetiva, exterior, mas a subjetiva, que transforma aquele universo de acordo com as percepções do trio principal. Assim, é claro que a primeira cena envolvendo Mad Dog (Dafoe) surge em cores sem qualquer naturalismo, carregando impossivelmente no rosa e no azul: completamente dopado, o sujeito não vê uma sala ao seu redor, mas uma experiência – e, assim, experimentamos com ele.

O dinamismo que o realizador emprega ao lidar com as cores de Dog Eat Dog, aliás, é um espetáculo à parte, construindo sequências em preto-e-branco e outras com cores supersaturadas que se beneficiam do design de produção extremo que se reflete também nos figurinos. A energia que o projeto exala, vale apontar, deve-se em parte a outra decisão que diz muito sobre Paul Schrader: contratar jovens estreantes em suas funções-chave, do diretor de fotografia Alexander Dynan ao montador Ben Rodriguez Jr. (e mesmo a designer de produção Grace Yun e a figurinista Olga Mill não trazem muitos créditos no currículo).

Infelizmente, Dog Eat Dog funciona melhor como conceito do que como realidade – e talvez seu maior equívoco seja na abordagem cômica dos atos de violência que retrata. Sim, há cineastas que conseguem extrair humor do choque (olá, Tarantino), mas Schrader não é um deles. Com isso, ver Mad Dog esfaqueando uma mulher repetidas vezes ou disparando contra a cabeça de uma adolescente apavorada deixa de ser simplesmente uma demonstração da natureza impulsiva e descontrolada do personagem, tornando-se um sinal da falta de julgamento do próprio diretor. Já em outros instantes, a proposta do realizador soa apenas confusa: quando um assassino escancara suas fragilidades para outro, devemos rir de sua vulnerabilidade emocional? Celebrá-la? Lamentá-la?

Já o elenco se entrega totalmente à visão do cineasta, seja esta problemática ou não: Dafoe encarna Mad Dog como uma bomba-relógio, Christopher Matthew Cook transforma Diesel numa combinação curiosa de força bruta e sensibilidade e Nicolas Cage... bom, aqui reajusta seus cageísmos para o nível 11 criado pelo Spinal Tap, culminando numa imitação de Humphrey Bogart que já se firma como uma das coisas mais estranhas e divertidas de sua carreira.

Beirando o surrealismo em um flashback que traz os três amigos brincando com mostarda e ketchup num quarto de hotel, Dog Eat Dog não é um bom filme, mas, paradoxalmente, é um indicativo perfeito da genialidade de seu diretor.

Texto originalmente publicado como parte da cobertura do Festival de Cannes 2016.

21 de Maio de 2016

Pablo Villaça, 18 de setembro de 1974, é um crítico cinematográfico brasileiro. É editor do site Cinema em Cena, que criou em 1997, o mais antigo site de cinema no Brasil. Trabalha analisando filmes desde 1994 e colaborou em periódicos nacionais como MovieStar, Sci-Fi News, Sci-Fi Cinema, Replicante e SET. Também é professor de Linguagem e Crítica Cinematográficas.

 

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