Vamos aos destaques nas plataformas de streaming nesta semana:
A começar pela lembrança do Golpe que resultou na Ditadura Militar no Brasil, há 58 anos. Nosso cinema resgata e mantém viva a memória desse período em diversas obras documentais e ficcionais e aqui vão alguns títulos importantes que podem ser vistos nos streamings:
A cineasta Lúcia Murat, ela mesma vítima de tortura quando jovem militante nos anos 70, tem três filmes sobre o tema bem fáceis de achar: embora presentes numa coleção de oito obras no Reserva Imovision, o impressionante Que Bom Te Ver Viva (1989) está gratuito tanto no Itaú Cultural (basta um cadastro simples) quanto no Looke, e Quase Dois Irmãos (2004) também se encontra no Looke gratuitamente. O terceiro filme é A Memória Que Me Contam (2013), apenas no Reserva
O Belas Artes à La Carte traz alguns filmes muito importantes. Primeiro uma de nossas obras mais incríveis, Cabra Marcado Para Morrer (1984) numa ótima cópia restaurada que, como em praticamente todo o cinema de Eduardo Coutinho, reflete também sobre o próprio fazer cinematográfico; menos conhecido, o recente Operação Camanducaia (2020), de Tiago Rezende, busca resgatar um dos mais dolorosos crimes do período e pouco falado: a prisão e tortura de 93 meninos, com entrevistas de alguns deles hoje, sobreviventes; já sobre o período de transição, há o documentário Muda Brasil (1985), de Oswaldo Caldeira, que narra os principais acontecimentos que culminam nas eleições democráticas que elegem Tancredo Neves.
Para quem se interessa pela arte produzida na época, a plataforma oferece Demônios e Maravilhas (1987), uma autobiografia de José Mojica Marins que inclui, entre as muitas dificuldades para dar vida ao seu Zé do Caixão, a censura imposta pela Ditadura; e o documentário Memórias do Grupo Opinião (2019), de Paulo Thiago, sobre o grupo teatral criado em 1964 como ato de resistência, com participação de gente como Maria Bethânia, Nara Leão e Millôr Fernandes; um outro grupo teatral, e de dança, cuja irreverência desafiou e chocou os milicos, tem sua história contada no ótimo Dzi Croquettes (2009), de Tatiana Issa e Raphael Alvarez, disponível gratuitamente no YouTube, onde é possível ver também Tropicália (2012), de Marcelo Machado, sobre o movimento tropicalista; e se futebol também é arte, vale a pena conhecer as histórias de Afonsinho, Paulo Cézar Caju e Nei Conceição, três craques da história do Botafogo que desafiaram muitas das imposições da Ditadura, dentro e fora do campo, em Barba, Cabelo e Bigode (2016), de Lúcio Branco, gratuitamente no Looke; para não ficar apenas em documentários, a relação de arte, resistência e Ditadura pode ser vista em Tatuagem (2013), de Hilton Lacerda, disponível na Netflix.
Falar em Ditadura, é falar também de Carlos Marighella, e a essa altura todo mundo já conhece a dramatização de sua vida com direção de Wagner Moura, mas é bom lembrar que Marighella (2021) está disponível na GloboPlay, enquanto Marighella (2012), documentário de Isa Grinspum Ferraz, está no Telecine Play. Há um documentário anterior chamado Marighella - Retrato Falado do Guerrilheiro (2001), de Silvio Tendler e pode ser visto gratuitamente na Libreflix. Esta plataforma, totalmente gratuita, mas que aceita (e precisa) de suporte financeiro, também tem outros documentários que narram histórias e investigações importantes e essenciais, como Jango (1984), Verdade 12.528 (2013) e Em Busca da Verdade (2015).
Por fim, duas grandes ficções que não podem ficar de fora de nenhuma discussão sobre o tema, e também gratuitos, um dos maiores filmes do cinema nacional, Terra em Transe (1967), de Glauber Rocha, no Itaú Cultural, e Pra Frente, Brasil (1982), de Roberto Faria, no YouTube.
O mais tradicional e importante festival de documentários do país, o É Tudo Verdade teve início no dia 31/03 e vai até o dia 10/04, com uma enorme programação de produções novas, e alguns clássicos, de todos os lugares do mundo. Pelo terceiro ano, o festival terá exibição online e gratuita (mas também com exibições em cinemas do Rio e São Paulo). A programação está em PDF aqui, e os filmes têm limitação de visualizações e apenas disponíveis por 24 horas, então é ficar de olho para não perder o que tiver interesse. Lembrando que dois anos atrás o Festival exibiu o ótimo romeno Colectiv (2019), que posteriormente foi indicado ao Oscar de Filme Estrangeiro e Documentário, e ano passado pudemos ver na abertura uma das primeiras exibições mundiais do dinamarquês Flee (2021), indicado este ano em Filme Internacional, Documentário e Animação. A maior parte dos filmes está numa plataforma própria, o É Tudo Verdade Play, mas a Competição Brasileira de Curta-Metragem está no Itaú Cultural Play, enquanto a Competição Internacional de Curta-Metragem está hospedada no Sesc Digital.
Entre as plataformas de streaming mais acessadas, o destaque vai para a Amazon Prime que trouxe duas elogiadas obras do ano passado de cineastas mulheres e que não poderiam ser mais diferentes entre si: o sensível Pequena Mamãe, de Céline Sciamma e o terror, que segue uma tendência atual de ser continuação/remake ao mesmo tempo, A Lenda de Candyman, de Nia DaCosta; enquanto isso, a MUBI Brasil lança Drive My Car, de Ryosuke Hamaguchi, que acaba de levar o Oscar de Filme Internacional (e se tornou o primeiro filme japonês a concorrer a Melhor Filme) e, de fato, é um dos grandes filmes para marcar este ano no cinema.