Um pequeno grande filme escondido no catálogo da Netflix é este Mais uma Chance, da cineasta Tamara Jenkins. O drama basicamente é: casal nos seus 40 e poucos anos de idade tenta, sem sucesso, engravidar. Mas toda a construção em torno disso tem inteligência, sutilezas e ideias que acaba se tornando um ótimo exemplar de cinema para confrontar com o que a plataforma lança quase semanalmente, dramas e romances sem vida, protocolares e que se sustentam unicamente numa premissa "da moda", muitas vezes progressista, ou como comumente vem sendo chamados, "filmes de algoritmo". O básico da dramaturgia e da linguagem audiovisual para um público que se satisfaz com o mínimo. O filme de Jenkins pode ser visto por esse público médio como exemplo de que o simples não precisa ser simplório.

Mais uma Chance mostra suas garras já no início, quando o casal passa por procedimentos médicos de fertilização. São longos minutos, e a paciência dedicada pelo filme tem um propósito claro de contrastar o drama demasiadamente humano de seus protagonistas com a frieza e desumanidade do "olhar" da ciência e dos profissionais necessários para realizar seu desejo. Ambos, vividos com muita verdade e intensidade por Kathryn Hahn e Paul Giamatti, são intelectuais novaiorquinos, ela uma escritora, ele um diretor de teatro. Suas vidas param e giram em torno desse objetivo que nunca se concretiza. Ou seja, artistas que deixam de criar em busca de uma concepção que parece impossível.

O filme já nos situa num momento de saturação e obsessão e que a alternativa por uma doadora de óvulos seja considerada. É quando uma sobrinha do casal se hospeda com eles, num misto de relação paternal ("meus pais intelectuais") e solução viável para o problema. Jenkins, que também é a roteirista, é muito hábil nos diálogos e na construção dos conflitos que vêm daí. Há muito humor, uma fácil identificação com os personagens e suas fragilidades, ao mesmo tempo que intensifica gradativamente a sensação de esgotamento e como a busca por uma solução de um problema acaba se tornando a própria razão de viver. Algo muito forte sublinhado na sua muito bonita e triste conclusão.

Mais Uma Chance (Private Life, 2018) está disponível na Netflix Brasil.

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