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O mestre Lean e o Dr. Jivago Cinemateca

“Can you play the balalaika?” 

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Dr. Jivago é o 14º filme de David Lean. O cineasta britânico dirigiu 16 longas-metragens. Ele foi premiado com o Oscar de Melhor Diretor em duas ocasiões, por Lawrence da Arábia (1962) e por A Ponte do Rio Kwai (1957). 

Quarenta e dois anos separam o primeiro filme de David Lean, Nosso Barco, Nossa Alma (1942), do seu último projeto, Passagem para a Índia (1984). Sua carreira no cinema começou, no entanto, muito antes de seu primeiro filme, no final dos anos 20. Durante toda a década seguinte, ele trabalhou como montador. É dele, por exemplo, a montagem do filme Pigmaleão (1938), clássico do cinema britânico. Lean nos legou uma filmografia impressionante. Ela contém grandes clássicos como Oliver Twist (1948), Grandes Esperanças (1946), Quando o Coração Floresce (1955) e obras-primas como Desencanto (1945), Lawrence da Arábia (1962), A Ponte do Rio Kwai (1957) e A Filha de Ryan (1970).

Dr. Jivago foi o maior sucesso comercial da carreira do diretor, um dos filmes de maior bilheteria da história do cinema americano e um dos produtos mais rentáveis do estúdio MGM. Ainda que tenha recedido críticas mistas na época de seu lançamento, o clássico de 1965 tem hoje um lugar de destaque na filmografia de Lean, sendo um dos filmes mais populares do diretor. 

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Dr. Jivago
ganhou cinco Oscars em 1966. Na mesma cerimônia, Julie Christie ganhou o Oscar de Melhor Atriz, mas por outro filme: Darling, a que Amou Demais. Em Dr. Jivago, ela interpreta Lara.

David Lean é constantemente apontado como o maior cineasta britânico de todos os tempos (ao lado de Alfred Hitchcock), tendo sido aclamado por diretores como Steven Spielberg e Stanley Kubrick. Ele ocupa a nona posição na lista de melhores diretores da história do cinema da revista Sight & Sound. publicada em 2002.

Apesar de ser muitas vezes associado a grandes produções e filmes épicos, David Lean tem uma filmografia bastante diversificada e foi por muito tempo visto como um diretor intimista. Esse aspecto de sua filmografia pode ser conferido no belíssimo Desencanto. Especialistas costumam dividir sua obra em dois períodos: a fase britânica, de 1942 a 1955; e, a partir de 1957, a fase dos filmes-espetáculos, em colaboração com Hollywood.

David Lean é um cineasta sentimental e romântico. Seu cinema é caracterizado por um imenso lirismo e, ao mesmo tempo, uma certa frieza, um antissentimentalismo. Essa combinação de características é um dos charmes e encantos dos filmes do cineasta.

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David Lean dirigiu 11 atores indicados ao Oscar, dentre eles Omar Sharif (direita) e Alec Guinness (esquerda), que ganhou por A Ponte do Rio Kwai (1957). Guinness era o ator favorito de Lean. Os dois trabalharam juntos em seis filmes.

A partir de Quando o Coração Floresce, protagonizado por Katharine Hepburn, o cinema de Lean começa a mudar. Esse clássico marca o início de uma nova fase da filmografia do diretor. Foi a primeira vez que Lean filmou fora do Reino Unido, em Veneza. O cinema de Lean se torna um cinema do exterior, do exótico, das grandes paisagens.

A Ponte do rio Kwai é o primeiro de uma série de filmes monumentais que dariam ao diretor a reputação de mestre do cinema épico. A partir de então, a duração dos filmes do cineasta ficou cada vez maior. Para se ter uma ideia, Desencanto (1938) tem 1h26 de duração e Lawrence de Arábia (1965), 3h36.

A Filha de Ryan foi um de seus projetos mais ambiciosos e um dos mais queridos ao diretor. Após o fracasso do filme e uma série de críticas negativas, Lean ficou 14 anos sem dirigir outro longa-metragem. Em 1984, ele lançou o seu último filme, o bem sucedido Passagem para Índia.

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Com a ajuda da maquiagem, Omar Sharif, que é egípcio, interpreta o personagem-título, que é russo. O filho do ator, Tarek Sharif, interpreta o personagem quando criança. Tarek fez apenas mais um filme depois de Dr. Jivago.

David Lean adaptou diversos romances para o cinema, dois de Charles Dickens: Grandes Esperanças e Oliver Twist. Dr. Jivago é a adaptação do romance homônimo de Boris Pasternak, um grande best-seller que deu ao escritor russo o prêmio Nobel de literatura em 1958. A obra de Pasternak tem como pano de fundo os acontecimentos políticos que marcaram a primeira metade do século 20 na Rússia, dentre eles, a Revolução de 1917. Muitos críticos condenaram a opção feita por Lean de dar mais importância à história de amor de Yuri Jivago e Lara que aos fatos históricos. Tal escolha é compreensível, se considerarmos que o filme foi lançado em plena Guerra Fria.

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Geraldine Chaplin, filha de Charlie Chaplin, interpreta Tonya. Dr. Jivago foi o primeiro filme em língua inglesa da atriz. Dizem que David Lean queria Audrey Hepburn no papel, mas que ele mudou de ideia depois de ver a audição de Geraldine.

Dr. Jivago acompanha os encontros e desencontros de Lara e o médico/poeta Yuri Jivago e a tumultuada história de amor desses dois personagens. Na época de seu lançamento, muitos torceram o nariz para o caráter romântico e sentimental. Essa característica, aliada às mais de três horas de duração do filme, parecem repelir alguns espectadores ainda hoje. Motivo de repulsa para uns, motivo de idolatria para outros. A triste história de amor de Lara e Yuri é contada com um refinamento estético único, que faz do filme um belo espetáculo.

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A famosa trilha sonora de Dr. Jivago é de autoria de Maurice Jarre, que havia trabalhado com Lean pela primeira vez em Lawrence da Arábia (1962). O compositor francês ganhou o Oscar pelos dois trabalhos e ganharia um terceiro por outro filme de Lean, Passagem para a Índia (1984).

A maestria da direção de Lean é comprovada já no início do filme, na belíssima cena do funeral da mãe do pequeno Yuri, uma experiência estranha e misteriosa para o menino. Nesse momento, vemos o nascimento do poeta, a atenção difusa da criança para os pequenos acontecimentos ao seu redor. A partir da utilização de planos subjetivos, de uma brilhante montagem e da música, Lean nos apresenta esse despertar do olhar do poeta. Esse é apenas um dos grandes momentos de Dr. Jivago. Ao longo do filme, o espectador atento e curioso pode se deliciar com o refinamento formal da obra, com as metáforas visuais, com os símbolos etc. 

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O roteiro de Dr. Jivago foi escrito por Robert Bolt, outro parceiro habitual de David Lean. Bolt ganhou o Oscar de Melhor Roteiro por Dr. Jivago. A parceria de Lean, Bolt e Jarre é uma das mais bem sucedidas do cinema.

Uma das qualidades do filme é o seu ótimo elenco. Lean reuniu grandes atores britânicos, já veteranos, como Alec Guinness e Ralph Richardson, e atores que representavam a nouvelle vague do cinema britânico como Rita Tushingham, Julie Christie e Tom Courtenay. O resultado não poderia ser melhor. Destaque deve ser dado à beleza e ao talento de Julie Christie, à sensibilidade de Omar Sharif, à força de Rod Steiger, à versatilidade de Guinness e ao carisma de Geraldine Chaplin.

Extremamente perfeccionista, David Lean gostava de tirar o melhor dos seus atores. Dizem que para fazer a cena em que Yuri Jivago presenciava o massacre de inúmeros civis, Lean pediu a Omar Sharif que a interpretasse como se ele estivesse tendo um orgasmo, para que o seu olhar tivesse a intensidade que o diretor queria. Lean era o diretor do olhar.

Além do ótimo elenco, da direção primorosa, Dr. Jivago conta com uma belíssima fotografia e com uma trilha sonora inesquecível, que se tornou um imenso sucesso. O tema de Lara é um dos grandes ícones musicais do cinema. Dr. Jivago pode dividir opiniões, mas é sem dúvida um espetáculo e a prova viva do talento do seu diretor.

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Ouça um trecho da trilha do filme - clique aqui

Copyright Cinema em Cena 2012LEONARDO ALEXANDER é crítico de cinema, criador e mantenedor do blog Clube do Filme, estudioso de Literatura e Cinema na Université Paris Diderot (França) e apaixonado pelo cinema clássico hollywoodiano. Na coluna Cinemateca, ele analisa obras, diretores e gêneros, além de dar curiosidades e informações sobre os grandes clássicos do cinema mundial.

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