“Lembre-se, George: nenhum homem é um fracasso quando tem amigos.”
“Você quer a lua? Eu te darei a lua! Eu vou laçá-la e dar para você.”
Célebre cena final de A Felicidade Não se Compra
A Felicidade Não se Compra (It’s a Wonderful Life) é certamente um dos filmes mais inspiradores da Era de Ouro de Hollywood. O longa-metragem de 1946 é a adaptação de The Greatest Gift, conto do escritor americano Philip Van Doren Stern, publicado em 1943. A Felicidade Não se Compra é considerada a maior obra-prima do diretor Frank Capra, responsável por outros clássicos inesquecíveis como Aconteceu Naquela Noite (1934), O Galante Mr. Deeds (1936), Do Mundo Nada se Leva (1938) e A Mulher Faz o Homem (1939).
Frank Capra nasceu na Itália, mas se mudou aos seis anos para os Estados Unidos com os pais. Visto como um dos diretores mais importantes da Hollywood clássica, Capra acumulou prêmios, prestígio e honrarias em mais de 40 anos de carreira. A revista Entertainment Weekly o elegeu como o 9° maior cineasta de todos os tempos. Ele foi indicado seis vezes ao Oscar, tendo levado o prêmio de Melhor Diretor em três ocasiões (por Aconteceu Naquela Noite, O Galante Mr. Deeds e Do Mundo Nada se Leva). Capra dirigiu dez performances indicadas ao Oscar, dentre elas, duas das maiores atuações de James Stewart, em A Mulher Faz o Homem e A Felicidade Não se Compra. O diretor e o ator (que trabalharam juntos três vezes) revelaram, posteriormente, que o filme de 1946 é o favorito de suas carreiras.
Frank Capra e James Stewart em um momento descontraído nos sets.
A estreia de A Felicidade Não se Compra nos cinemas foi ofuscada pelo grande sucesso de Os Melhores Anos de Nossas Vidas (1946), filme de William Wyler que havia estreado nos cinemas na semana anterior. O drama de Wyler é centrado na vida de ex-soldados que tentavam retornar às suas vidas normais após a Segunda Guerra Mundial. O fracasso de bilheteria de A Felicidade Não se Compra explica, de certa forma, seu insucesso na premiação do Oscar no ano seguinte, tendo perdido o grande prêmio para Os Melhores Anos de Nossas Vidas e tendo saído de mãos vazias da premiação, apesar das cinco indicações (Melhor Filme, Melhor Diretor, Melhor Ator, Melhor Montagem e Melhor Som). Ainda que o clássico de Wyler seja indiscutivelmente uma obra importante, A Felicidade Não se Compra “envelheceu” melhor e é, normalmente, visto como um filme maior, ocupando um lugar especial no coração de muitos cinéfilos.
A popularidade do filme de Capra aumentou exponencialmente com o passar dos anos, muito em função da televisão, onde costumava ser exibido com frequência, principalmente no período natalino. Ainda que o próprio Capra nunca tenha pensado no filme como uma fábula de Natal, A Felicidade Não se Compra veio a se tornar um dos maiores “filmes natalinos” de todos os tempos. A mensagem edificadora da história é um dos grandes trunfos desse clássico.
A cena do primeiro beijo é uma das mais românticas do filme. Assista aqui.
O filme conta a história de George Baily (James Stewart), um homem que passou grande parte da sua vida se compromentendo a ajudar os moradores da pequena cidade de Bedford Falls, a despeito de seu sonho de viajar e conhecer o mundo. O seu maior antagonista é o poderoso e maléfico Mr. Potter (Lionel Barrymore), que anseia ter o controle absoluto da cidade. Através de sua empresa de empréstimo e financiamento, George ajuda as pessoas de Bedford Falls a realizarem seus sonhos. Certo dia, o tio de George perde uma grande quantia da empresa, colocando-a em sério risco de falência. Ainda sob o risco de ser preso e receando deixar sua família na miséria, George chega a conclusão de que vale muito mais morto do que vivo, devido ao valor do seu de seguro de vida. Sem ter a quem recorrer, George pensa em se suicidar em plena véspera de Natal. Nesse momento, o anjo Clarence (Henry Travers) intervém para ajudar o protagonista.
Frank Capra é reconhecido por sua habilidade de realizar grandes obras a partir de histórias relativamente simples. Muitos de seus filmes são centrados em um protagonista masculino, um indivíduo de bom coração e de boas intenções, que tenta se impor em uma sociedade marcada pela corrupção e pela ambição. Capra é normalmente lembrado por seus “feel good movies”, obras marcadas pela idealização do homem e pela fé na humanidade. Os heróis de Frank Capra são homens comuns que simbolizam a alma nacional norte-americana. Tais heróis são construtores de uma América ideal onde reinam a justiça e a liberdade. As narrativas de Capra são também marcadas pelo sentimentalismo e pela ideia de que a coragem individual pode ser páreo ao mal coletivo e de que a integridade dos “pequenos” pode rivalizar com a iniquidade dos poderosos.
Lionel Barrymore interpreta um dos vilões mais desprezíveis do cinema clássico.
A Felicidade Não se Compra foi o único filme em que Capra acumulou as funções de diretor, produtor, financiador e co-roteirista (ao lado de Frances Goodrich e Albert Hackett). O custo de filmagens foi considerado extremamente alto para uma produção independente, batendo os 3 milhões de dólares. Para as filmagens, foi fabricado um dos maiores sets da história do cinema americano até então. Uma verdadeira cidade com mais de 75 prédios foi construída para representar a cidadezinha fictícia de Bedford Falls.
A Felicidade Não se Compra foi o primeiro filme de James Stewart após a Segunda Guerra. O ator, que teve uma proeminente carreira militar e que participou ativamente do conflito, ficou cinco anos sem atuar. O filme de 1946 foi, portanto, sua reestreia no cinema. Além de ser o seu personagem favorito, George Bailey é um dos personagens mais icônicos da carreira do ator, também conhecido por suas memoráveis parcerias com Alfred Hitchcock.
Ao lado de James Stewart, temos o grande Lionel Barrymore que encarna Mr. Potter, um dos vilões inesquecíveis do cinema clássico. O ator começou sua carreira no cinema mudo e chegou a trabalhar com o mestre D. W. Griffith. Mr. Potter é o seu mais célebre personagem em quase cinquenta anos de carreira.
Outro destaque do filme é a bela atriz Donna Reed, que interpreta sua primeira protagonista no cinema num papel inicialmente oferecido à estrela Ginger Rogers. Reed viria a ganhar o Oscar de coadjuvante, oito anos depois, por A Um Passo da Eternidade (1953).
Donna Reed encarnou sua primeira protagonista em A Felicidade Não se Compra.
A obra-prima de Frank Capra é frequentemente citada em diversas listas produzidas por várias associações ligadas ao cinema. O American Film Institute o elegeu como o filme mais inspirador de todos os tempos. Em 2007, a mesma instituição o colocou em 20° lugar, na lista dos 100 melhores filmes americanos de todos os tempos. Mr. Potter foi escolhido com o 6° maior vilão e George Bailey, o 9° maior herói do cinema. A Premiere Magazine classificou a atuação de James Stewart como a 8a melhor de todos os tempos. Além das cinco indicações ao Oscar, o filme levou o Globo de Ouro de Melhor Diretor em 1947.
A Felicidade Não se Compra é, ao lado de O Mágico de Oz (1939) e de De Ilusão Também se Vive (1947), um dos filmes de fantasia mais importantes do cinema clássico hollywoodiano. A encantadora fábula de Natal é uma celebração da amizade e do poder transformador de cada indivíduo no seio de sua comunidade. Algumas das cenas do filme permanecem impactantes na memória afetiva de muita gente. Como não se emocionar ao (re)ver a última cena do filme ao som da "Valsa da Despedida" (Auld Lang Sine)? Ouça.
No filme, George Bailey (Stewart) tem a oportunidade de ver como seria o mundo se ele nunca tivesse existido.