Clássico da Sessão da Tarde, Um Príncipe em Nova York é uma comédia romântica escrita por Eddie Murphy, dirigida por John Landis e com figurino de Deborah Nadoolman, estabelecida como um dos grandes nomes dos anos 80. A figurinista criou trajes icônicos como a jaqueta vermelha de Michael Jackson no clipe de “Thriller” e a roupa de Indiana Jones, incluindo a jaqueta e o chapéu característicos do personagem; mas, infelizmente, precisou parar de trabalhar na área para cuidar dos filhos.
Neste filme de 1988, Murphy interpreta o príncipe Akeem, herdeiro do trono de Zamunda, país fictício da África. É seu 21º aniversário e ele precisa casar-se, mas pede ao seu pai, Rei Jaffe Joffer (James Earl Jones), e a sua mãe, Rainha Aoleon (Madge Sinclair), quarenta dias nos Estados Unidos antes de fazê-lo. Zamunda é retratado de maneira idílica, repleto de zebras e elefantes e com um grande palácio em meio a palmeiras. A decoração no interior utiliza elementos da flora e fauna local. Nesse contexto, o príncipe possui uma rotina de ócio e cuidados especiais, mas o distanciamento em relação aos pais é destacado. Em oposição, os Estados Unidos aparecem com ruas sujas, mendigos, violência e uma sociedade de consumo que valoriza a imagem pessoal.
A corte contava com petaleiras, moças que jogavam pétalas de rosas para que a realeza pisasse sobre elas. Elas vestem roupas com corte marcante da década e estampas intrincadas, além de turbantes.
A variedade de estampas, bem como o colorido dos trajes aliados a turbantes e grandes ombreiras, marcam as roupas das mulheres da corte. Trata-se da composição de uma África imaginária, que tem elementos de diferentes origens como referência.
A roupa da mulher que banha Akeem, por exemplo, remete a outra visão fantasiosa, dessa vez do Egito.
Os dançarinos são adornados com miçangas coloridas e penas de faisão. O traje, apesar de ter enfeites pesados, precisa permitir os movimentos e acrobacias.
Croqui do traje das dançarinas
Os acessórios são de grande importância, mesmo em personagens secundários; e é possível ver o uso de braceletes, tornozeleiras, colares e brincos, tanto por homens quanto por mulheres. Há, ainda, a influência da moda do período, que aparece nas grandes ombreiras, no dourado e nas silhuetas grandiosas.
O rei utiliza paletó, mas acrescido de elementos que indicam a tradição do país, como o colar com grandes peças de ouro e coral vermelho, os barretes decorados com elementos geométricos e a capa com uma grande cabeça de leão. A coroa é adornada por pedrarias e corais dispostos de forma orgânica.
A rainha, por sua vez, usa menos elementos estrangeiros, dando preferência a túnicas estampadas, turbantes, muitos bordados e joias grandes, além de peles.
O próprio Akeem possui uma versão do adorno de leão de seu pai: um pequeno leopardo que carrega no ombro. Além disso, tem um colar semelhante ao dele. Ao chegar em Nova York, também utiliza um sobretudo com as mangas atadas às costas, vestido como uma capa. As grandes ombreiras e peles ampliam a sensação de ombros largos.
Croquis dos trajes de Akeem na corte e na cidade de Nova York
Para passar despercebido entre os locais, adquire, juntamente com Semmi, roupas de turista, repletas de referências à cidade, que tornam sua aparência cômica. Mas logo eles se adaptam ao visual cinza e marrom da cidade, com uso de sobretudos e suéteres.
Lisa (Shari Headley) foge dessa regra: ela sempre veste elementos rosas ou vermelhos, de maneira a marcar a feminilidade tradicional que Akeem busca em sua noiva, uma vez que o tratamento conferido às mulheres no filme é bastante conservador. Quando ela briga com seu namorado e conversa com Akeem, que está trabalhando em sua casa, as roupas dos dois os conectam.
Não por acaso, seu vestido de noiva é cor-de-rosa. Não somente isso, é volumoso e com uma grande cauda, digno de uma princesa do conto de fadas que aqui se delineia. As demais mulheres também usam tons pastel, adequando-se àquele momento.
Esboço do vestido de noiva de Lisa
O figurino de Um Príncipe em Nova York, assim como a ótima maquiagem, foi indicado ao Oscar, perdendo para Ligações Perigosas (1988), de Stephen Frears. Se por um lado nem o diretor nem a figurinista são pessoas negras (e é possível questionar a imagem de africanicidade que o filme compõe), por outro Deborah Nadoolman trabalha com a criação de um conto de fadas com uma expressividade não-europeia, como raramente se vê. O resultado é memorável.
É antropóloga e doutoranda em Antropologia Social pela USP, apaixonada por cinema e autora do blog Estante da Sala.