Quando pensamos nas paisagens dos principais faroestes do cinema, como Rastros de Ódio (1956), Onde Começa o Inferno (1959) e Era uma Vez no Oeste (1968), geralmente não imaginamos regiões cobertas de neve. Westerns costumam ser ensolarados e apresentar personagens várias vezes suados e cansados em terras áridas.
Porém, também existem os filmes do gênero que são ambientados em locais extremamente frios e Quentin Tarantino nos lembrou disso com sua produção mais recente: o ainda inédito Os 8 Odiados. Na história, um caçador de recompensas que está escoltando uma assassina busca refúgio em um bar por causa de uma tempestade de neve e logo se instaura um clima de tensão entre as pessoas do estabelecimento (relembre o trailer aqui).
Em homenagem ao lançamento do longa no início de 2016, a coluna Clube dos Cinco selecionou alguns exemplos de faroestes onde a presença da neve é claramente vista e sentida pelos personagens.
CONDENADOS A VIVER
Condenados a Vivir, 1972
Diretor: Joaquín Luis Romero Marchent
Já iniciamos nossa lista com uma obra inusitada: um faroeste espanhol que é considerado um dos mais violentos do gênero. Com Claudio Undari e Emma Cohen no elenco, o filme acompanha uma diligência cheia de prisioneiros escoltada por guardas pelas montanhas. Após eles serem atacados por bandidos em busca de ouro, o sargento sobrevivente precisa encontrar uma forma de levar os sete criminosos sádicos para a prisão, ao mesmo tempo em que tenta proteger sua filha de qualquer investida.
Curiosamente, Condenados a Viver recebeu nos Estados Unidos o título Cut-Throats Nine (algo como “Os 9 Degoladores” ou “As 9 Gargantas Cortadas”, em português), que é semelhante ao “Os 8 Odiados” de Tarantino. Além de se passarem na neve, os dois longas envolvem um grupo de pessoas sendo obrigadas a lidar umas com as outras e entrando em conflito por conta disso. E mais: em Os 8 Odiados, o personagem de Kurt Russell precisa proteger Jennifer Jason Leigh daqueles interessados na recompensa pela sua captura, algo que pode ser comparado ao sargento protegendo sua filha em Condenados a Viver.
Tarantino ainda não fez declarações sobre a produção de Joaquín Luis Romero Marchent, mas ela pode ter sido uma grande influência para seu faroeste.
DOMINADOS PELO TERROR
Track of the Cat, 1954
Diretor: William A. Wellman
Dominados pelo Terror apresenta os Bridges vivendo em seu rancho no vale montanhoso de Aspen, no Colorado, confinados pelas nevascas de inverno entre inflamadas discussões embaladas pela tensa trilha de Roy Webb (Interlúdio). A família é composta pelo destemido Curt (Robert Mitchum, que disse que as cenas na neve foram as mais difíceis que ele já fez na carreira), a matrona severa e beata Ma Bridges (Beulah Bondi), o derrotado pai alcoólatra (Philip Tonge), os irmãos Arthur (William Hopper) e Harold (Tab Hunter) e a solteirona Grace (Teresa Wright).
Eles são acompanhados ainda pela provocante vizinha Gwen, interpretada por Diana Lynn, e pelo centenário índio Joe Sam (Carl ‘Alfafa’ Switzer, com muita maquiagem), que alerta a todos sobre a proximidade de uma enorme pantera negra que ataca o gado da região e ameaça a segurança dos habitantes.
A produtora de John Wayne financiou o longa que foi baseado no livro de Walter Van Tilburg Clark e que não arrecadou muito nas bilheterias quando lançado. Mas como promete o trailer, “cada milha riscada pela tempestade leva a novos picos de aventura”!
QUADRILHA MALDITA
Day of the Outlaw, 1959
Diretor: André De Toth
Diante da iminente disputa territorial entre o cowboy Blaise Starrett (Robert Ryan) e o rancheiro Hal Crane (Alan Marshal), casado com uma bela mulher que desperta a cobiça de Blaise, piorando a situação, abrigam-se no lugarejo o capitão Jack Bruhn (Burl Ives) e seu bando de foragidos. Com roteiro de Philip Yordan (Johnny Guitar) inspirado pelo livro de Lee E. Wells, A Quadrilha Maldita se passa na gelada Oregon e é um dos faroestes mais respeitáveis dirigidos por André De Toth.
Muitas vezes comparado ao clássico Os Brutos Também Amam (1953), de George Stevens, o filme foi realizado com pouca verba e risco de saúde para os envolvidos na produção devido ao clima extremamente gélido. A fotografia em preto e branco confere uma beleza melancólica às paisagens congeladas neste longa que se distancia dos clichês do gênero e impressiona pela economia de tiros, duelos e sangue, hostilizando seus homens pela constante tensão, e claro, pelo cortante frio a que estão submetidos.
MAIS FORTE QUE A VINGANÇA
Jeremiah Johnson, 1972
Diretor: Sydney Pollack
Indicado à Palma de Ouro em Cannes, Mais Forte que a Vingança foi baseado nas obras "Crow Killer" (de Raymond W. Thorp e Robert Bunker) e "Mountain Man" (de Vardis Fisher), ambas inspiradas pela história real de John “Comedor de Fígado” Johnston, que ficou conhecido assim devido ao seu hábito de se alimentar desse órgão retirado dos indígenas que matava. Na trama, um montanhês quer vingança contra a tribo que assassinou sua mulher após ele ter desrespeitado solo sagrado.
Robert Redford (Golpe de Mestre), no papel principal, disse certa vez sobre as baixíssimas temperaturas durante as filmagens em Utah, onde era proprietário de um rancho: "Houve sete casos de lesões pelo frio, quatro casos de infecções na garganta, dois casos de pneumonia [...] e até os cavalos se recusavam a sair dos estábulos. O diretor Sydney Pollack queria saber quando tudo aquilo ia acabar. Eu tinha uma boa ideia, porque vivia lá durante todo o ano e sabia o quão difícil o inverno poderia ser”.
O VINGADOR SILENCIOSO
Il grande silenzio, 1968
Diretor: Sergio Corbucci
Outra possível grande fonte de inspiração para Tarantino é O Vingador Silencioso, western spaghetti do italiano Sergio Corbucci (Django). Na trama estrelada por Jean-Louis Trintignant (Amor) e Klaus Kinski (Fitzcarraldo), caçadores de recompensas sanguinários e liderados pelo perverso Loco (Kinski) se escondem nas montanhas de Nevada (EUA). Após uma mulher perder seu marido para Loco, ela contrata um pistoleiro mudo (Trintignant) para se vingar do criminoso. Dessa forma, o silêncio do personagem aliado a sua frieza e melancolia está em consonância com as inóspitas planícies cobertas de neve.
O mestre Ennio Morricone, do clássico Três Homens em Conflito (1966) e do próprio Os 8 Odiados, compôs a bela trilha sonora de O Vingador Silencioso (confira um trecho aqui). Para encerrar, uma curiosidade: a neve da cidade de Snow Hill foi criada com galões de creme de barbear (!).
Menções Honrosas (faroestes na neve ou com algumas cenas na neve)
* Django Livre (2012), do próprio Tarantino
* Onde os Homens São Homens (1971), de Robert Altman
* Rastros de Ódio (1956), de John Ford
* O Cavaleiro Solitário (1985) e Joe Kidd (1972), dirigidos e protagonizados por Clint Eastwood
* À Procura da Vingança (2006), de David Von Ancken
* Bravura Indômita: a versão de 1969, com John Wayne, e a refilmagem de 2010, dos irmãos Ethan e Joel Coen
* Região de Ódio (1954), de Anthony Mann
* O Assassinato de Jesse James pelo Covarde Robert Ford (2007), de Andrew Dominik
* Perseguição Mortal (1981), de Peter R. Hunt
* O Grande Búfalo Branco (1977), de J. Lee Thompson
* Meu Revólver é Minha Lei (1968), de Sergio Merolle
* Cormack of the Mounties (1975), de Joe D'Amato
* O Golpe Mais Fabuloso do Oeste (1972), de José Antonio de la Loma
* Presas Brancas (1973) e Desafio ao Lobo Branco (1974), dirigidos por Lucio Fulci e estrelados por Franco Nero
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