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As mães nordestinas e o teorema paulistano Assinantes

O reconhecimento de óbvia referência à obra de Pasolini não compromete o interesse provocado pelo filme de Anna Muylaert, antes o enriquece. Em "Teorema" de 1968,uma típica familia de alta burguesia de Milão, hospeda um rapaz que vem não se sabe de onde, e se comporta como um anjo exterminador das convenções e da tranquilidade da unidade social,repercutindo o momento político italiano e as convicções de seu criador. A atitude desinibida do personagem de Terence Stamp se reproduz no ar blasé com que a figura da filha da empregada se insere na tensão controlada da casa paulistana, "meio modernista", retratada no filme brasileiro. Não vai ao extremo desagregador de Pasolini,mas incomoda, e aí está demonstrado seu alcance. O registro é mais neo realista que a alegoria fria milanesa e ganha uma humanidade quente na escalação de Regina Casé,arquetípica como uma mãe migrante que abandona compulsoriamente sua filha para fazer a vida no sul desenvolvido. A empregada doméstica pernambucana é o centro moral e o elemento afetivo do filme. É ela que faz sua redenção e evita a repetição modernizada da sua história pela filha,modificando ou complementando-a. Os demais personagens, um tanto esquemáticos,embora bem representados , dão o ambiente para a trajetória da empregada e sua filha. O decadente dono da casa é o que mais deve ao filme de Pasolini ,a matrona moderna veste Prada e cumpre bem o papel de antagonista. O carente/mimado filho prenuncia a desmotivação do pai e serve para preencher a lacuna emocional da "Pietá" nordestina emprestada. Não tem como não lembrar de "Casa Grande e Senzala", mas embora em alguns momentos quase didático, o filme é seduzido pela forte presença cênica de Regina que humaniza o tom alegórico do Pasolini tropical. Belo e oportuno.

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