A dica do dia é um filme que tem 50 anos, mas que só mais recentemente parece ter sido descoberto, ou pelo menos mais visto, por ter sido o provável responsável pela denominação que damos hoje a um subgênero do terror muito amado e rico em que lendas, mitos e tradições antigas ressurgem para assombrar os personagens e estreitar as relações entre humanos e a natureza: o folk horror.

Não que O Estigma de Satanás (1971) pode ser tomado como influente ou percursor, tanto por não ter sido um sucesso na época quanto por toda uma história do cinema povoada por este horror “folclórico” desde muito antes. Mas foi anunciando a produção deste filme que um jornalista usou o termo folk horror e que 30 anos depois o diretor Piers Haggard usou novamente sobre a intenção do que estava realizando. A partir daí a expressão “colou” e, apesar da variedade de filmes que podem se encaixar, é muito comumente usada para se referir ao filme de horror feito na Grã-Bretanha, principalmente entre os anos 60 e 70, tanto no cinema quanto na televisão. E o filme de Haggard de certo modo formaria uma trinca definidora do subgênero, juntamente com O Caçador de Bruxas (1968), de Michael Reeves, e O Homem de Palha (1973), de Robin Hardy, trazendo quase todos os elementos mais facilmente identificáveis: caça às bruxas, paganismo, demônios, seitas, rituais, vilarejos rurais (sejam medievais ou não), etc.

O Estigma de Satanás talvez seja o mais difícil de se ver, tanto pelo pessimismo como pelo roteiro cheio de buracos e principalmente porque visto com os olhos de hoje, traz algumas sequências altamente incômodas – e que eu não citarei aqui para que ninguém se recuse a ver o filme por conta delas. A força do filme está nas suas entrelinhas e, a ausência de muitas explicações do que é este Mal/Satanás que se ocupa da comunidade, traz uma ambiguidade fascinante, estimulante desde sua sequência inicial quando um camponês acidentalmente desenterra algo maligno e que, sem perder muito tempo, irá afetar alguns personagens (que sumirão) e adolescentes que daí pra frente tocarão o terror, liderados pela bela jovem de nome (nada sutil) Angel. O Mal vem da Terra ou era contido por ela? Os jovens são o puro Mal ou apenas se rebelam contra um sistema opressor, simbolizado por um padre e suas missas obrigatórias e assustadoras? Um juiz incrédulo, mas que irá buscar meios para conter o Mal, é um herói ou um representante de uma nova ordem castradora?

O filme coloca essas e outras questões numa trama tão episódica que é difícil definir um protagonista ou para onde ela está caminhando, mas com diversos momentos de impacto, em especial aqueles mais cruéis, e que compensam um final abrupto que parece muito o resultado de uma produção barata ou com financiamento acabando.

O Estigma de Satanás (The Blood on Satan’s Claw, 1971) está disponível na Darkflix.

O Sacrifício (The Wicker Man, 1973) também está na Darkflix e na Oldflix.

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