A fotografia é um elemento essencial do cinema, no entanto, o diretor de fotografia poucas vezes tem seu nome lembrado pelo público. Apesar de estar nos créditos, ser premiado e, não raro, se tornar parceiro frequente de cineastas famosos, este profissional (assim como o montador, o compositor, o designer de produção, entre outros) é injustamente relegado à “categoria técnica”.
O uruguaio César Charlone, que foi indicado ao Oscar por Cidade de Deus, de Fernando Meirelles (eles repetiram a parceria em O Jardineiro Fiel e Ensaio Sobre a Cegueira), está lançando o seu segundo longa-metragem como diretor. Artigas – La Redota segue O Banheiro do Papa, que chegou aos cinemas em 2007.
Recentemente, também tivemos o anúncio de que Wally Pfister, fotógrafo de Christopher Nolan desde Amnésia, está dirigindo seu primeiro longa, Transcendence, que conta com Johnny Depp, Morgan Freeman, Cillian Murphy e Rebecca Hall no elenco.
Estar no comando de um filme não significa exatamente uma busca por reconhecimento para esses e outros diretores de fotografia. Talvez seja mais uma questão de experimentar ou exercer mais livremente suas ideias. Seja como for, o intuito desta lista é lembrar vários outros fotógrafos que, ao longo de suas carreiras, colaboraram para a criação de produções de sucesso, mas, também, quiseram realizar seus próprios filmes. Alguns sequer voltaram a trabalhar para outros cineastas, enquanto outros fizeram melhor em sua profissão de origem.
Vamos começar com três brasileiros e seguimos com alguns destaques estrangeiros.
Walter Carvalho - por Renato Silveira
Ele é o principal nome da fotografia para cinema no Brasil. Tendo trabalhado com os irmãos Walter Salles (Terra Estrangeira, Central do Brasil, Abril Despedaçado) e João Moreira Salles (Notícias de uma Guerra Particular, Entreatos, Santiago) e outros grandes nomes do cinema brasileiro contemporâneo (Cláudio Assis em Amarelo Manga, Baixio das Bestas e Febre do Rato; Beto Brant em Crime Delicado; Karim Aïnouz em O Céu de Suely; Luiz Fernando Carvalho em Lavoura Arcaica; Laís Bodanzky em Chega de Saudade), Walter Carvalho também tem no currículo filmes de diretores veteranos como Hector Babenco (Carandiru), Ruy Guerra (O Veneno da Madrugada), Júlio Bressane (Filme de Amor, Cleópatra, A Erva do Rato) e seu irmão, Vladimir Carvalho (O Engenho de Zé Lins).
Por mais que tenha trabalhado com tantos cineastas, de estilos tão distintos, é possível reconhecer a fotografia de Walter Carvalho. E essa autoria naturalmente o conduziu a dirigir seus próprios filmes, já no auge da carreira. São seis ao todo: os documentários Janela da Alma (2001, codirigido por João Jardim), Lunário Perpétuo (2003), Moacir Arte Bruta (2006) e Raul - O Início, o Fim e o Meio (2011) e as ficções Cazuza - O Tempo Não Para (2004, codirigido por Sandra Werneck) e Budapeste (2009). Ele prepara mais um documentário atualmente: Brincante, sobre a vida do ator, músico e coreógrafo Antonio Nóbrega.
Murilo Salles - por Larissa Padron
Mesmo já tendo dirigido alguns curtas, Murilo Salles começou sua carreira como diretor de fotografia em 1972 com o documentário Sai Dessa, Exu!, de Roberto Mauro. Nos anos seguintes, ele assinou a fotografia de famosos longas, como Dona Flor e Seus Dois Maridos (1976) e Beijo no Asfalto (1981), ambos de Bruno Barreto, e Eu Te Amo (1981), de Arnaldo Jabor.
Foi na década de 80 que Salles começou sua promissora carreira de roteirista e diretor com Nunca Fomos Tão Felizes (1984) e Faca de Dois Gumes(1989). Seus créditos na direção também incluem os elogiados Como Nascem os Anjos (1996), Seja o que Deus Quiser (2002) e Nome Próprio (também assinando a fotografia deste último, de 2007).
Mesmo já estabelecido como cineasta, em 2005 ele voltou a atuar apenas como diretor de fotografia em Árido Movie, de Lírio Ferreira.
Luiz Carlos Barreto - por Larissa Padron
Os créditos de fotografia de Luiz Carlos Barreto (pai de Bruno e Fábio Barreto) incluem “apenas” dois filmes. O apenas está entre aspas porque são os dois filmes mais representativos de um dos mais marcantes movimentos do cinema nacional, o Cinema Novo: Vidas Secas (1963), de Nelson Pereira dos Santos, e Terra em Transe (1967), de Glauber Rocha.
Depois disso, Barreto já podia se aposentar feliz, mas ele decidiu se dedicar a ser um mega produtor, tendo em seu currículo longas como Dona Flor e Seus Dois Maridos, A Dama da Lotação e O Que é Isso, Companheiro?
Como diretor, ele realizou o clássico documentário Isto é Pelé, de 1974, ao lado de Eduardo Escorel.
Michael Chapman - por Luísa Gomes
Por trás da fotografia urbana e suja de Taxi Driver e Touro Indomável está mais um grande parceiro de Martin Scorsese, Michael Chapman. É perceptível nos trabalhos de fotografia de Chapman a total sincronia entre o ambiente e o personagem que está inserido nela, como o pessimismo do taxista Travis Bickle (Robert De Niro) refletido em uma Nova York sombria. Seu trabalho na fotografia de Touro Indomável e O Fugitivo lhe rendeu duas indicações ao Oscar. Antes disso, porém, ele já tinha um grande clássico em seu currículo: Tubarão, de Steven Spielberg, onde ele foi operador de câmera.
Já os trabalhos mais notáveis de Chapman como diretor foram em A Tribo da Caverna do Urso, de 1986, estrelado por Daryl Hannah, e A Chance, de 1983, marcando um dos primeiros grandes papéis de Tom Cruise.
Também parceiro importante de Scorsese no filme-concerto The Last Waltz, Chapman não abandonou a fotografia depois da estreia como diretor. É verdade que ele não esteve em mais nenhum clássico, mas trabalhou em algumas produções elogiadas, sendo a mais recente Ponte Para Terabítia, de 2007. Ele está aposentado desde então.
Nicolas Roeg - por Luísa Teixeira de Paula
Um dos primeiros filmes da carreira de Nicolas Roeg foi Lawrence da Arábia, de 1962. O inglês, então com 34 anos, era o segundo assistente de fotografia do longa que ganhou sete Oscars. Quatro anos depois, ele assinou a fotografia do primeiro filme em cores de François Truffaut, Fahrenheit 451. Em seu currículo nessa função estão ainda Longe Deste Insensato Mundo (1967), de John Schlesinger, e Petulia (1968), de Richard Lester.
Quando estreou como diretor, em 1970, Roeg já era um veterano no cinema britânico – estava há 23 anos na indústria. Performance foi seu primeiro longa, com Mick Jagger como um dos protagonistas. Um ano depois, ele lançaria A Longa Caminhada.
Inverno de Sangue em Veneza (1973), O Homem Que Caiu na Terra (1976) e Convenção das Bruxas (1990) se tornaram suas produções mais conhecidas na direção.
MENÇÃO HONROSA
Peter Andrews - por Renato Silveira
Não, a foto não está errada. Peter Andrews nada mais é do que o pseudônimo adotado por Steven Soderbergh para assinar a fotografia de seus próprios filmes. Ele começou com essa curiosa prática justamente no filme que lhe deu o Oscar de Melhor Direção, Traffic, de 2001. De lá para cá, foram 16 longas-metragens, dois curtas (um deles, o segmento da antologia Eros) e uma série de TV (K Street) usando seu alter-ego, que foi indicado ao Satellite Awards e aos prêmios da British Society of Cinematographers e associações de críticos de Los Angeles, Chicago e Phoenix por Traffic e à premiação da Online Film Critics Society por Traffic, Che e Che 2 - A Guerrilha.
Vale lembrar que Soderbergh tem um segundo pseudônimo, Mary Ann Bernard, usado para assinar a montagem de seus filmes a partir de Solaris (2002), embora ele também tenha trabalhado com outros montadores nesse período.
Mais diretores de fotografia que dirigiram seus próprios filmes:
Cinco medalhões
Gordon Willis: reconhecido pela fotografia da trilogia O Poderoso Chefão, tem também no currículo Todos os Homens do Presidente (1976) e vários dos principais filmes da primeira metade da carreira de Woody Allen, como Noivo Neurótico, Noiva Nervosa (1977), Manhattan (1979), Zelig (1983) e A Rosa Púrpura do Cairo (1985). Dirigiu apenas o thriller Windows, em 1980, estrelado por Talia Shire, considerado um grande fracasso. Está aposentado desde 1997, quando assinou a fotografia de Inimigo Íntimo.
Janusz Kaminski: fotógrafo de Steven Spielberg desde A Lista de Schindler, que lhe rendeu seu primeiro Oscar (o segundo veio por O Resgate do Soldado Ryan, além de indicações por Amistad, Cavalo de Guerra e Lincoln). Também fez a fotografia de Jerry Maguire (1996) e O Escafandro e a Borboleta (2007, também indicado ao Oscar). Estreou como diretor em 2000 com o terror Dominação, estrelado por Winona Ryder, e em 2007 fez o drama Hania, em um retorno às suas origens na Polônia. Atualmente, ele trabalha na finalização da produção independente American Dream.
Vilmos Zsigmond: mais um que trabalhou com Steven Spielberg (foi seu primeiro diretor de fotografia, em Louca Escapada, de 1974) e ganhou o Oscar. A estatueta veio em 1978 por Contatos Imediatos de Terceiro Grau. Fez a fotografia de vários outros filmes famosos, como Amargo Pesadelo (1972), O Portal do Paraíso (1980) e As Bruxas de Eastwick (1987), e voltou a ser indicado ao Oscar por O Franco Atirador (1978), O Rio do Desespero (1984) e Dália Negra (2006). Como diretor, só fez o drama The Long Shadow, em 1992, estrelado por Michael York e Liv Ullmann, em sua terra natal, a Hungria.
Caleb Deschanel: indicado a cinco Oscars (Os Eleitos, Um Homem Fora de Série, Voando para Casa, O Patriota e A Paixão de Cristo) também assina a fotografia de A Lenda do Tesouro Perdido e Killer Joe - Matador de Aluguel, entre outros. Dirigiu The Escape Artist, em 1982, e Crusoé, em 1988. Depois dirigiu episódios de variadas séries de TV: Twin Peaks, Lei e Ordem, Conviction e Bones.
Christopher Doyle: fotógrafo da maioria dos filmes de Wong Kar Wai (Dias Selvagens, Amores Expressos, Cinzas do Passado, Felizes Juntos, Amor à Flor da Pele, premiado em Cannes, 2046 - Os Segredos do Amor), trabalhou também com Phillip Noyce (O Americano Tranquilo), Zhang Yimou (Herói), M. Night Shyamalan (A Dama na Água), Gus Van Sant (Psicose, Paranoid Park), Jim Jarmusch (Os Limites do Controle). Como diretor, seu trabalho é um tanto obscuro. Estreou em 1999 com Away with Words, coprodução Japão/Hong Kong exibida na mostra Um Certo Olhar do Festival de Cannes, assinou um segmento de Paris, Te Amo, em 2006, e comandou o thriller Izolator, de 2008.
Cinco especialistas em blockbusters
Ronald Neame: começou a carreira como diretor de fotografia nos anos 30, sendo posteriormente reconhecido nessa função por filmes como Major Barbara (1941), Nosso Barco, Nossa Alma (1942), Este Povo Alegre (1944) e Uma Mulher do Outro Mundo (1945), todos esses com direção (ou codireção) de David Lean. Por E... um Avião não Regressou (1942), de Michael Powell e Emeric Pressburger, foi indicado ao Oscar, não pela fotografia, que também assinou, mas pelos efeitos especiais. Voltou ao Oscar como roteirista por Desencanto (1945) e Grandes Esperanças (1946). A partir daí, decidiu seguir a carreira como diretor e fez dois famosos filmes-catástrofe: O Destino do Poseidon (1972) e Meteoro (1979). São dele também: Glória Sem Mácula (1960), Como Possuir Lissu (1966), A Primavera de uma Solteirona (1969), O Adorável Avarento (1970), entre outros, além de duas comédias com Walter Mathau: O Espião Trapalhão (1980) e Um Juiz Muito Louco (1981).
Dean Cundey: tem no currículo como diretor de fotografia vários filmes de sucesso. Trabalhou com John Carpenter em Halloween (1978), Fuga de Nova York (1981), O Enigma de Outro Mundo (1982), Os Aventureiros do Bairro Proibido (1986), entre outros. Fez parceria também com Robert Zemeckis em De Volta Para o Futuro (1985) e suas duas continuações, Uma Cilada Para Roger Rabbit (1988, indicado ao Oscar) e A Morte Lhe Cai Bem (1992), e com Steven Spielberg em Jurassic Park (1993). Já como diretor, sua única tentativa foi com Querida, Encolhi a Gente!, de 1997, terceiro filme da franquia estrelada por Rick Moranis - e foi feito para TV.
Barry Sonnenfeld: fotógrafo de Gosto de Sangue (1984), Arizona Nunca Mais (1987), Ajuste Final (1990), todos dos irmãos Coen, além de Te Pego Lá Fora (1987), Quero Ser Grande (1988), Harry e Sally: Feitos Um Para o Outro (1989) e Louca Obsessão (1990); virou diretor no ano seguinte com A Família Adams e não parou mais: O Nome do Jogo (1995), As Loucas Aventuras de James West (1998) e a trilogia Homens de Preto são todos dele.
Jan de Bont: saiu da Holanda, onde trabalhou ao lado de Paul Verhoeven em Louca Paixão, e se mudou para Hollywood, onde assinou a fotografia de blockbusters como Duro de Matar (1988) e Caçada ao Outubro Vermelho (1990), ambos de John McTiernan, Chuva Negra (1989), de Ridley Scott, Instinto Selvagem (1992), novamente de Verhoeven, e Máquina Mortífera 3 (1992), de Richard Donner. Virou diretor em 1994 com Velocidade Máxima, sucesso que foi seguido pelas bombas Twister (1996), Velocidade Máxima 2 (1997), A Casa Amaldiçoada (1999) e Lara Croft Tomb Raider: A Origem da Vida (2003).
Andrzej Bartkowiak: polonês, fez a fotografia de Laços de Ternura (1983, vencedor de 5 Oscars e indicado a 11 estatuetas, mas, curiosamente, não a de Melhor Fotografia), Irmãos Gêmeos (1988), Um Dia de Fúria (1993), Velocidade Máxima (1994), A Experiência (1995), Advogado do Diabo (1997), entre outros. Como diretor, comandou apenas filmes de ação, começando por Romeu Tem Que Morrer (2000), com Jet Li, com quem voltou a trabalhar em Contra o Tempo (2003). Dirigiu ainda Rede de Corrupção (2001), com Steven Seagal, e as adaptações de games Doom - A Porta do Inferno (2005) e Street Fighter: A Lenda de Chun-Li (2009).
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