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ERA UMA VEZ EM TÓQUIO Cinemateca

Kyoko: A vida não é decepcionante?
Noriko [sorrindo]: Sim, ela é.

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"Vamos voltar para casa."

Yasujirō Ozu nasceu em 12 de dezembro de 1903 e faleceu exatamente sessenta anos depois, em 12 de dezembro de 1963. O cineasta japonês morreu de câncer dois anos após o falecimento de sua mãe, com quem ele morou durante toda a sua vida. Na sepultura que ele divide com ela, está escrito apenas o símbolo mu, que significa “nada”. Ozu nunca se casou, nunca teve filhos. Seus grandes filmes, no entanto, falam sobre casamento, família e relacionamentos.

O diretor nos legou mais de 50 filmes, dos quais 35 mudos. Foi depois da Segunda Guerra Mundial, que Ozu dirigiu seus filmes mais famosos, como Pai e Filha (1949), Crepúsculo em Tóquio (1957), Também Fomos Felizes (1951), Ervas Flutuantes (1959) e A Rotina Tem Seu Encanto (1962). Era uma Vez em Tóquio (1953) é visto como sua maior obra-prima. O filme é considerado por diversos especialistas como um dos melhores filmes de todos os tempos e aparece em quase todas as listas desse gênero: terceiro na lista da Sight and Sound (votos dos críticos), primeiro em outra lista da mesma revista (votos dos diretores), sétimo na lista da Total Film, para citar apenas algumas. 

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“A Mãe me contou quão boa você foi pra ela quando ela ficou na sua casa. Ela me disse que foi a noite mais feliz que passou em Tóquio.”

Apesar de ser visto, hoje em dia, como um dos maiores diretores de todos os tempos, Ozu só foi efetivamente descoberto pelo mundo ocidental nos anos 60, quando seus filmes começaram a ter uma maior exibição fora da Ásia. Era uma Vez em Tóquio, por exemplo, só estreou nos Estados Unidos em 1964. Outros mestres do cinema japonês, contemporâneos de Ozu, como Akira Kurosawa e Kenji Mizoguchi, tiveram um reconhecimento mais imediato fora de seu país.

Ozu é celebrado pelo seu estilo único: o uso rigoroso da câmera estática na altura dos olhos de uma pessoa sentada num tatami (ou um pouco abaixo); a quase ausência de movimentos de câmera; um gosto refinado pela composição do plano, pelos efeitos de simetria; e a utilização do campo-contracampo que viola a regra dos 180º (regra de posicionamento de câmera que segue um eixo imaginário de 180º). 

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“Às vezes penso que não posso continuar sozinha para sempre. Em outras ocasiões, passo a noite acordada pensando no que acontecerá se tudo continuar assim. Os dias passam e as noites vêm, e nada acontece, e sinto um pouco de solidão. Meu coração parece esperar por algo.”

O estilo de Ozu é inconfundível e, de uma certa maneira, anti-hollywoodiano (sabe-se que o diretor não era um grande fã do cinema norte-americano). O cinema de Ozu é um cinema realista, ancorado no quotidiano, nos pequenos acontecimentos do dia-a-dia. O diretor raramente usa a voz off em seus filmes. Quando um personagem fala, o vemos em cena. Em momentos de diálogo entre dois personagens, muitas vezes, ele prefere mostrá-los de costas para tê-los no mesmo plano.

O corte não é desperdiçado no cinema de Ozu. A montagem é precisa, nada é em vão. Para o espectador que não está familiarizado com o cinema de Ozu, talvez seu estilo cause um estranhamento inicial, mas, uma vez que você adere ao universo do cineasta, dificilmente deixará de apreciar a beleza da sua arte.

Não há sentimentalismo no cinema de Ozu, nada que seja excessivo. Mesmo assim, seus filmes nos tocam profundamente. Era uma Vez em Tóquio talvez seja aquele em que o diretor mais se aproxime do melodrama (ainda que mantenha uma boa distância). Esse é um dos filmes mais sentimentais do diretor. 

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“Ela não vai sobreviver… Então, este é o fim.”

Era uma Vez em Tóquio conta a história de um casal de idosos, Tomi e Shukichi (interpretados pelos maravilhosos Chieko Higashiyama e Chishu Ryu), que moram numa pequena cidade no Japão e que fazem uma longa viagem a Tóquio para visitarem seus dois filhos mais velhos, já casados. A estadia na capital japonesa, no entanto, não se dá como o casal esperava. Os filhos não têm tempo para passar com eles, já que estão muito envolvidos com suas próprias ocupações. Após alguns dias, Tomi e Shukichi são enviados para um centro termal em Atami, perto do mar. Essa é a alternativa encontrada pelos filhos mais velhos para não terem que se preocupar com os pais e evitarem maiores gastos. A estadia no spa, no entanto, é desgastante para o casal, devido aos outros hóspedes barulhentos. O casal decide, então, voltar para casa antes do previsto.

A única pessoa que se mostra gentil e acolhedora com os idosos durante a estadia em Tóquio é Noriko, viúva de um dos filhos do casal, morto na guerra. Noriko é interpretada pela encantadora Setsuko Hara, estrela do cinema japonês. O sorriso da personagem, um misto de bondade e dor, é apaixonante e de cortar o coração. Hara protagonizou outros filmes de Ozu, como Pai e Filha e Também Fomos Felizes. O ator Chishu Ryu é outro parceiro habitual de Ozu, presente em vários filmes do diretor.

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“Mas que belo amanhecer. Temo que teremos mais um dia quente hoje.”

Era uma Vez em Tóquio é um filme que permanece, mesmo quando acaba. Ele nos habita por muito tempo. A obra-prima de Ozu nos faz refletir sobre a efemeridade da vida, sobre os relacionamentos, sobre o tempo que passa, sobre a morte. Esse clássico do cinema mundial é de fato universal e atemporal. 

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“Ela era uma mulher de cabeça dura, mas se eu soubesse que as coisas ficariam assim, eu poderia ter sido um pouco melhor para ela”.

Copyright Cinema em Cena 2012LEONARDO ALEXANDER é crítico de cinema, criador e mantenedor do blog Clube do Filme, estudioso de Literatura e Cinema na Université Paris Diderot (França) e apaixonado pelo cinema clássico hollywoodiano. Na coluna Cinemateca, ele analisa obras, diretores e gêneros, além de dar curiosidades e informações sobre os grandes clássicos do cinema mundial.

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