Quando o primeiro filme da franquia X-Men foi lançado em 2000, ele tornou-se sucesso imediato e foi um dos principais responsáveis por deixar “heróis de quadrinhos” em voga e, consequentemente, pelas produções subsequentes de filmes com esta temática. A trama focada nos protagonistas mutantes cria empatia facilmente, pois claramente traça paralelos entre estes e outras minorias perseguidas em nossas próprias sociedades, com Xavier e Magneto como lideranças com posturas opostas em relação a como lidar com essa opressão.
O diretor Bryan Singer, responsável pelos dois primeiros filmes, precisava tirar das plateias a visão exagerada e ridícula dos filmes do Batman de Joel Schumacher da década de 90. Para isso, optou pelo uso de um estilo contido.
Partindo dessa proposta de fugir de uma estética cartunesca, a figurinista Louise Mingenbach criou para X-Men: O Filme e X-Men 2 um conjunto que fugia das cores utilizadas pelos mutantes nos quadrinhos: os polêmicos uniformes pretos. Embora tenham sido fortemente criticados, eles devem ser entendidos como um produto de sua época, reação aos já citados filmes do Batman e influenciados pelos sucessos de Blade (também vindo dos quadrinhos) e Matrix.
No terceiro filme, X-Men: O Confronto Final, o diretor passou a ser Brett Ratner e com isso a equipe também foi alterada. As figurinistas passaram a ser Lisa Tomczeszyn e Judianna Makovsky (de A Princesinha). Apesar disso, trabalharam em cima dos conceitos já utilizados nos outros filmes, alterando pouco os uniformes e mantendo uma identidade visual entre os três longas.
Apenas em X-Men: Primeira Classe, dirigido por Matthew Vaughn, com figurino de Sammy Sheldon, é que o uniforme passou a referenciar o visual clássico dos mutantes nos quadrinhos, com uso marcado de amarelo. A história acontece em 1962, de forma que esse design pode ser usado como uma versão retrô, adequada ao período, da mesma forma que acontece no flashback no início de Watchmen.
Por fim chegamos ao quinto filme da franquia, X-Men: Dias de um Futuro Esquecido, que estreou nos cinemas no último dia 22 de maio e novamente conta com direção de Bryan Singer e figurino de Louise Mingenbach. Desta vez, a trama se divide entre um futuro desolado, em que mutantes estão sendo caçados e eliminados, e um passado em 1973, para onde Wolverine retorna em seu próprio corpo de então para tentar impedir que aquele futuro se concretize.
No futuro, os uniformes voltam a ser pretos, mas desta vez menos justos e mais utilitários, com calças largas e botinas, além de apliques no tronco que simulam o efeito de uma armadura, garantindo mobilidade, conforto e proteção na luta pela sobrevivência.
Mesmo Xavier (Patrick Stewart), sempre com impecável paletó, abre mão de seu estilo por esse mais seguro, visto que não faria sentido buscar a elegância com o mundo acabando ao seu redor.
No passado, com a desativação do Instituto Xavier para Jovens Superdotados, os uniformes deixaram de ser utilizados e cada personagem se veste como indivíduo autônomo. A paleta de cores, bastante fiel ao período, é dominada por tons terrosos.
Mística (Jennifer Lawrence) segue em sua jornada de autoaceitação e busca por autonomia e já se mostra totalmente à vontade em sua própria pele, sem a necessidade de roupas ou disfarces que escondam sua verdadeira natureza, a não ser que seja necessário.
Wolverine (Hugh Jackman) é quem mais abraça a década, fazendo uso de calças justas, cinto de couro com grande fivela do mesmo material (o que é interessante, visto que Magneto não pode manipulá-la), camisa de estampa chamativa e jaqueta de couro marrom. O estilo lhe cai como uma luva.
Fera (Nicholas Hoult) encarna o bom menino, com um estilo bastante certinho: camisas de botão ou camisetas listradas e jaqueta de veludo cotelê. Suas roupas são menos ajustadas do que as dos demais homens, com exceção da jaqueta jeans, o que causa maior contraste quando muda sua forma.
Xavier (James McAvoy) passa por uma fase em que perdeu tudo e está emocionalmente abalado. A sua trajetória pode ser percebida através de suas roupas. No começo, desesperançoso e dependente de um soro de cura e de álcool, veste-se de acordo com a extravagância do período, como uma versão atenuada de Wolverine. Também faz uso de camisa estampada (embora menos chamativa) e jaqueta de couro, mas em um marrom mais avermelhado. Com o desenrolar da história e a retomada de sua autoconfiança, volta a utilizar o paletó que lhe é característico.
Já a Magneto (Michael Fassbender) o que não falta é autoconfiança. Acredita na superioridade dos mutantes e por isso utiliza seus poderes da forma que for preciso para acabar com a perseguição e a opressão deles. Seu cuidado com sua imagem fica patente nas roupas muito bem cortadas e sempre com um toque de design diferenciado. Isso é perceptível na assimetria marcada em suas roupas: a falta de lapela em um dos lados de seu sobretudo e a capa com barra cortada na diagonal. Ao mesmo tempo, essa assimetria reflete a sua tendência para métodos que podem ser considerados pouco convencionais ou mesmo questionáveis: ele sempre vai agir de acordo com suas próprias ideias, mesmo ao se aliar com os demais.
Acima, à esquerda, croqui do sobretudo de Magneto, por Louise Mingenbac. À direita, ele sendo usado pelo personagem.
Um personagem que merece ser mencionado é o novato Mercúrio (Evan Peters), que teve uma ótima participação. O filho não declarado de Magneto veste-se predominantemente de preto. Como seu poder é a grande velocidade, faz sentido que o corte de suas roupas pareça futurista em relação à época, de maneira que sua jaqueta prateada (além de acessórios como fone de ouvido e boné) remeta muito mais à década de 1980 que à de 1970.
Não apenas os figurinos, mas toda a direção de arte exerce muito bem a função de ambientar os espectadores nas diversas linhas temporais do filme (e isso fica particularmente marcado nas duas cenas em que Wolverine acorda, com as diferenças de decoração ao seu redor e foco nas luminárias e cortinas de cada época). X-Men: Dias de um Futuro Esquecido, assim como o filme anterior, Primeira Classe, consegue não só ser um bom filme de heróis de quadrinhos, como um bom filme de época, com ambientações e construções de vestuários bastante críveis dentro daquilo que é a sua proposta.
É antropóloga e doutoranda em Antropologia Social pela USP, apaixonada por cinema e autora do blog Estante da Sala.