Datas de Estreia: | Nota: | ||
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Brasil | Exterior | Crítico | Usuários |
02/07/2010 | 01/01/1970 | 4 / 5 | / 5 |
Distribuidora | |||
Dirigido por Laurent Tirard. Com: Maxime Godart, Victor Carles, Charles Vaillant, Vincent Claude, Benjamin Averty, Germain Petit Damico, Damien Ferdel, Valérie Lemercier, Kad Merad, Sandrine Kiberlain.
Clotaire é um garotinho inseguro: sempre incapaz de oferecer respostas às perguntas mais simples feitas por sua professora, ele já está tão acostumado a ser punido que basta ouvir o som de palmas para, num condicionamento que deixaria Pavlov orgulhoso, se dirigir à diretoria. Certo dia, temendo ser castigado por não ter levado seus deveres de casa concluídos, Clotaire encontra um pouco de esperança na carta que entrega ao rígido disciplinador da instituição e que, datilografada, traz um pedido de seus pais para que o garoto seja perdoado – uma expectativa razoável até repararmos que o bilhete traz, numa caligrafia infantil, a assinatura “Papai”.
Reside aí a força de O Pequeno Nicolas, filme de Laurent Tirard inspirado nos livros de René Goscinny e Sempé: extremamente sensível ao olhar infantil, o longa é hábil ao capturar o olhar e a lógica das crianças, criando uma narrativa ao mesmo tempo tocante e divertida. Concentrando-se no cotidiano de um grupo de garotos que freqüentam uma escola apenas para meninos na década de 50 (um período no qual puxar as orelhas dos alunos – literalmente! - era algo aceitável), esta comédia já demonstra sua capacidade de mergulhar naquele universo desde os minutos iniciais, quando, ao descrever o que seus colegas desejam ser quando adultos, o personagem-título (Godart) explica, por exemplo, que o gordinho Alceste (Claude) sonha em ser ministro por saber que esta é uma função que envolve muitos banquetes. Da mesma maneira, o pequeno Geoffroy (Vaillant), sempre entregue aos cuidados do chofer, planeja trabalhar ao lado do pai – uma profissão que, aos seus olhos, basicamente envolve sentar-se ao lado daquela figura tão ausente.
Com roteiro de Tirard, Grégoire Vigneron e Alain Chabat, o filme usa como ponto de partida o receio de Nicolas diante da possível gravidez da mãe (Lemercier), que, típica dona de casa dos anos 50, dedica-se apenas a paparicá-lo o máximo possível – um xodó que ele teme perder com a chegada de um concorrente. Assim, é natural que o diretor assuma completamente o ponto de vista infantil ao narrar a história, mantendo sua câmera sempre à altura dos olhos dos pequenos e enfocando os adultos sempre de baixo para cima, forçando o espectador a enxergar o mundo a partir da posição vulnerável e constantemente espantada das crianças. Da mesma forma, o design de produção é inteligente ao conceber a casa do protagonista como um lugar de espaços amplos, já que, para alguém daquela idade, as coisas sempre parecem bem maiores do que de fato são – e quando visita o quarto de uma garota, portanto, é natural que Nicolas enxergue tudo com um excesso de rosa e babados que certamente representa mais seu choque diante daquele ambiente feminino do que a decoração real do lugar. Enquanto isso, os figurinos cumprem a função não apenas de recriação de época, mas também de informar o espectador sobre a personalidade dos personagens, oscilando entre o uniforme engomadinho do rico Geoffroy e as roupas curtas e amarrotadas do distraído Clotaire (Carles).
Empregando um humor inocente que não hesita em usar desmaios como punchlines ou recursos narrativos como balõezinhos de pensamento que pairam sobre as cabeças dos pequenos atores, O Pequeno Nicolas já encanta desde os créditos iniciais, que não só remetem aos desenhos originais de Jean-Jacques Sempé como também dão o tom lúdico que acompanhará a história até seu desfecho. No entanto, inocente ou não, o humor que atravessa a projeção é sempre eficiente, provocando risadas que nascem da surpresa (como o que ocorre quando o dedo-duro Agnan tira os óculos para um exame de vista) ou do puro constrangimento (o jantar organizado pelos pais de Nicolas rivaliza, em desastre e embaraço, com aquele de A Gaiola das Loucas).
Irmão de alma do Menino Maluquinho de Ziraldo (que gerou o filme doce e divertido de Helvécio Ratton em 1994), O Pequeno Nicolas ainda se beneficia do senso de humor inteligente e sempre surpreendente do mestre René Goscinny, dividindo sua natureza por vezes anárquica com outras de suas criações mais famosas como Iznogoud e, claro, Asterix (que ele concebeu ao lado de Uderzo) – e não é à toa que, em certo instante do filme, os pequenos heróis empregam um plano inspirado justamente nas aventuras dos gauleses malucos.
Numa época em que o cinismo parece dominar boa parte das produções cinematográficas (mesmo aquelas voltadas para o público infantil), a doçura de O Pequeno Nicolas – que não o impede de ser incrivelmente engraçado, repito – representa mais do que bem-vinda dose de ar fresco; é algo necessário e reconfortante.
03 de Julho de 2010
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