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Críticas por Pablo Villaça

Datas de Estreia: Nota:
Brasil Exterior Crítico Usuários
01/01/1970 01/01/1970 4 / 5 / 5
Distribuidora
Duração do filme
94 minuto(s)

Ano Bissexto
Año Bisiesto ou Leap Year

Dirigido por Michael Rowe. Com: Mónica del Carmen, Gustavo Sánchez Parra, Marco Zapata.

Algo muito curioso ocorreu durante a sessão de Ano Bissexto no Festival do Rio: depois de prender a atenção do público que se encontrava na sala por quase toda a projeção, já que ninguém abandonou o local mesmo com várias seqüências de sexo quase explícito ocorrendo na tela, subitamente o longa, a apenas dez minutos do final, provocou uma clara debandada da platéia, levando várias pessoas a deixarem o cinema às pressas, como se estivessem fugindo dali. Talvez isto possa soar como um atestado de que o longa que rendeu a Câmera de Ouro ao diretor Michael Rowe falhou, mas o fato é que, ao contrário, a fuga daqueles espectadores serviu apenas para comprovar a força da narrativa, já que ocorreu como fruto de um óbvio receio que eles sentiram de testemunhar algo desagradável vitimando a protagonista – e bastou o filme acabar para que uma garota que havia saído da sala se aproximasse de mim a fim de perguntar o que havia acontecido.

Estrelado pela desconhecida atriz mexicana Monica del Carmen (que teve um pequeno papel em Babel), Ano Bissexto acompanha um mês na vida da jornalista Laura, que, morando sozinha na cidade grande, passa os dias fazendo entrevistas pelo telefone e as noites buscando algum parceiro sexual. Sem ser particularmente bonita, ela leva uma existência solitária que só tem sua rotina alterada durante as transas de uma noite só ou as visitas do irmão mais novo – e a moça marca de maneira entediada a passagem do tempo em seu calendário, que traz o dia 29 de fevereiro grifado. É então que Laura conhece Arturo (Parra), com quem estabelece uma dinâmica sado-masoquista que se torna cada vez mais intensa, aproximando-se perigosamente de um extremo que pode se revelar fatal.

Praticamente todo ambientado no apartamento da protagonista, o filme é construído a partir de longos e ininterruptos planos que salientam o cotidiano silencioso e solitário da moça, dependendo, justamente em função desta abordagem, da performance de del Carmen para funcionar – e a atriz não decepciona. Entregando-se corajosamente a um papel que não só exige que ela se exponha fisicamente, mas que também abra mão de qualquer traço de vaidade, a moça compõe sua atuação a partir de detalhes que se revelam preciosos, como ao puxar para si o rosto de um parceiro após o sexo, buscando uma intimidade que não vem, ou ao adotar uma expressão incrivelmente tocante diante de outro amante, como se dissesse com os olhos um inequívoco “me queira!”. Da mesma maneira, é significativo que Laura se masturbe ao bisbilhotar um casal vizinho não transando, mas apenas se divertindo, já que isto expõe suas fantasias comunais de aceitação. Enquanto isso, Gustavo Sánchez Parra, preso a um papel infinitamente menor, exibe uma ótima presença ao evocar os impulsos de agressividade de Arturo ao mesmo tempo em que deixa claro o medo que o sujeito sente diante das próprias ações.

Fascinante ao ilustrar como Laura finalmente encontra o carinho e a atenção que tanto desejava através da agressão e da tortura física (e após o sexo Arturo se mostra sempre gentil e doce), Ano Bissexto sugere um instinto de auto-punição experimentado pela protagonista talvez em função do trauma experimentado na pré-adolescência – algo que o filme sugere com sutileza e que não pretendo escancarar aqui.

Com um desfecho que respeita a lógica interna da protagonista até o segundo final, o longa acaba se estabelecendo como um intrigante estudo de personagem corajoso e sempre interessante.

Observação: esta crítica foi originalmente publicada como parte da cobertura do Festival do Rio 2010.

04 de Outubro de 2010

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Pablo Villaça, 18 de setembro de 1974, é um crítico cinematográfico brasileiro. É editor do site Cinema em Cena, que criou em 1997, o mais antigo site de cinema no Brasil. Trabalha analisando filmes desde 1994 e colaborou em periódicos nacionais como MovieStar, Sci-Fi News, Sci-Fi Cinema, Replicante e SET. Também é professor de Linguagem e Crítica Cinematográficas.

 

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