Datas de Estreia: | Nota: | ||
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Brasil | Exterior | Crítico | Usuários |
26/02/2010 | 01/01/1970 | 5 / 5 | 5 / 5 |
Distribuidora | |||
Dirigido por Juan José Campanella. Com: Ricardo Darín, Soledad Villamil, Pablo Rago, Guillermo Francella, Javier Godino, Carla Quevedo, Mariano Argento, José Luis Gioia
Desde que estabeleceu sua parceria com o magnífico ator Ricardo Darín em 1999, quando fizeram O Mesmo Amor, A Mesma Chuva, o cineasta argentino Juan José Campanella vem mantendo uma carreira impecável. Contando histórias relativamente simples com uma abordagem igualmente direta e sem grandes invencionismos, o diretor se especializou em permitir que o charme de seus personagens conquistasse o público, concentrando-se em narrativas doces, tocantes e sempre profundamente humanas – e, seguindo esta linha, nos presenteou com maravilhas como O Filho da Noiva, Clube da Lua e, agora, com este magnífico O Segredo de Seus Olhos.
Mais uma vez protagonizado por Darín (um de meus atores favoritos, devo confessar), o roteiro escrito por Campanella e Eduardo Sacheri a partir do livro deste último gira em torno de Benjamín Esposito, um oficial de justiça aposentado que decide escrever um romance baseado em um caso ocorrido há 30 anos. Atuando na época como assistente da promotora Irene (Villamil), Benjamín se envolveu na investigação do estupro seguido de assassinato da bela esposa de um humilde bancário (Rago) – e foi com frustração que viu o caso alcançar uma resolução longe do ideal. Enquanto mergulha em suas memórias e reata relacionamentos com antigos colegas e pessoas-chave da investigação, ele se descobre ainda encantado por Irene, embora esta agora se encontre casada e com filhos grandes.
Empregando sua cronologia fluida como forma de revisitar também o turbulento passado político da Argentina na década de 70, Campanella constrói uma narrativa que traz, como tema central, a maneira com que somos eternamente aprisionados por nossas memórias mais marcantes: sendo sempre aconselhado a parar de pensar no passado por todos os seus amigos, Benjamín não consegue se libertar do peso daquelas lembranças que, de forma ainda mais cruel, se revelam incertas e inconstantes como as recordações mais importantes costumam ser. Aliás, é esta sensibilidade para retratar a experiência humana e suas idiossincrasias que transformam o argentino num cineasta tão envolvente: em certo instante, por exemplo, o personagem vivido de forma tocante e divertida pelo comediante Guillermo Francella faz um belo discurso sobre como não podemos jamais nos libertar de nossas paixões e como isso pode ser encarado como um ponto fraco do homem que perseguem – e a propriedade do que é dito é tamanha que simplesmente não podemos ignorar o que aquelas palavras revelam sobre nós mesmos.
No entanto, como costuma acontecer nos filmes de Campanella, estes instantes mais dramáticos que iluminam nossas próprias vidas são intercalados com outros de um humor extremamente eficaz e orgânico – e que normalmente surgem como resultado da simples interação dos personagens. Percebam, por exemplo, como o comentário de certo personagem sobre o fato de seu amigo “ter móveis demais” funciona como uma piada eficaz embora, de fato, nem mesmo possa ser interpretada como uma tirada cômica. Se rimos, é porque a frase revela mais sobre quem a diz do que sobre quem a ouve, sendo esta revelação uma maneira de percebermos algo curioso sobre o indivíduo em questão, o que, conseqüentemente, provoca o riso. (Já em outros momentos, o humor é mais óbvio, mas não menos eficaz, como nas cenas em que Pablo atende ao telefone da promotoria com o claro propósito de confundir aqueles que estão do outro lado da linha e de evitar o trabalho.)
Com uma montagem eficiente (do próprio Campanella) que salta no tempo sempre de maneira fluida, O Segredo de Seus Olhos também traz um belo trabalho de maquiagem, já que o processo de rejuvenescimento/envelhecimento de Darín e Villamil jamais deixa de ser convincente. Além disso, o design de produção cumpre bem o papel de criar cenários que parecem realmente ter sido ocupados há anos por aquelas pessoas, trazendo elementos das personalidades dos personagens em seus detalhes e uma impressão de desgaste natural e verossímil, desde o escritório empoeirado e amontoado de papéis dividido por Benjamín e Pablo até o detalhe da máquina de escrever estragada (e que servirá para uma bela rima narrativa ao final da projeção).
Reunindo Ricardo Darín e Soledad Villamil depois de exatos dez anos (eles formaram o inesquecível casal de O Mesmo Amor, A Mesma Chuva), O Segredo de Seus Olhos exige de seus atores uma expressividade ímpar, já que a força do título só se estabelece graças à maneira com que conseguimos perceber uma infinidade de sentimentos através do olhar daqueles personagens. Assim, quando Irene interpreta incorretamente algo que Benjamín irá dizer, notamos claramente a frustração da promotora diante de seu engano, mesmo que esta jamais expresse verbalmente este sentimento – e da mesma forma, embora seja hábil ao notar a importância de um olhar específico em uma foto, o protagonista parece incapaz de ocultar seu próprio encantamento ao observar Irene.
Contando com um plano-seqüência absolutamente fascinante que tem início em um helicóptero que sobrevoa um estádio de futebol e termina em seu gramado (é claro que há ao menos um corte oculto, mas isso não importa), este candidato argentino ao Oscar 2010 ainda traz um desfecho não só rico de significados, mas inquestionavelmente satisfatório.
Só espero que Campanella não nos obrigue a esperar outros longos cinco anos até seu próximo trabalho, já que suas parcerias com Ricardo Darín são mais do que excelentes filmes, surgindo como verdadeiros presentes para os fãs de um Cinema adulto, profundo e envolvente.
27 de Fevereiro de 2010
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