Datas de Estreia: | Nota: | ||
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Brasil | Exterior | Crítico | Usuários |
18/02/2011 | 01/01/1970 | 3 / 5 | 4 / 5 |
Distribuidora | |||
Duração do filme | |||
94 minuto(s) |
Dirigido por Danny Boyle. Com: James Franco, Kate Mara, Amber Tamblyn, Treat Williams, John Lawrence, Kate Burton, Clémence Poésy, Aron Ralston, Jessica Ralston.
Em 26 de abril de 2003, o jovem Aron Ralston partiu em uma caminhada exploratória pelo Blue John Canyon, no estado de Utah, sem se preocupar em avisar a ninguém para onde estava indo. Assim, quando uma pedra se deslocou durante uma de suas descidas, prendendo seu braço e mantendo-o refém por mais de cinco dias, o rapaz só tinha uma esperança de sobreviver: encontrar uma maneira – qualquer uma – de se libertar sozinho. Como é fácil imaginar, sua história tem, em sua luta pela sobrevivência, um componente dramático altamente cinematográfico, mas, por outro lado, também oferece um obstáculo considerável a qualquer cineasta: o fato da ação se manter confinada em um único e apertado espaço. Infelizmente, a maneira encontrada pelo diretor Danny Boyle para contornar este problema reside numa estratégia visual tumultuada que, embora torne a narrativa mais dinâmica, eventualmente acaba também diluindo sua força.
Escrito por Boyle e Simon Beaufoy (seu parceiro de Quem Quer Ser um Milionário?) a partir do livro de Ralston, 127 Horas faz um bom serviço ao empregar os 15 minutos iniciais da projeção para nos apresentar ao protagonista, estabelecendo sua personalidade aventureira e alegre de maneira rápida ao mostrá-lo, por exemplo, rindo de si mesmo ao cair da bicicleta ou levando duas garotas a um passeio inesquecível em um lago subterrâneo – e é mérito do cineasta encenar o acidente com a pedra sem qualquer tentativa de criar um suspense que o preceda, já que, assim, somos surpreendidos pela forma súbita com que este ocorre exatamente como o próprio Aron. A partir daí, porém, as decisões de Boyle já se tornam mais irregulares ao dividir o filme em duas linhas narrativas, já que, embora as cenas envolvendo Ralston na caverna sejam tensas e angustiantes, aquelas dedicadas ao que se passa em sua mente se mostram bem mais irregulares.
Buscando manter a câmera sempre na mão, em constante movimento, a fim de conferir um ar documental ao projeto, Boyle e seus dois experientes diretores de fotografia (Anthony Dod Mantle e Enrique Chediak) fazem jus à obsessão do próprio Aron Ralston em registrar seu dilema, já que este de fato gravou depoimentos e tirou fotos ao longo dos vários dias em que esteve preso no canyon. Em contrapartida, há um claro exagero na utilização de estranhas câmeras subjetivas – como no instante em que o sujeito corre na direção das duas garotas -, numa indicação clara de que o desejo de manter o foco em constante movimento levou o diretor a perder um pouco do seu próprio como realizador (algo que fica notório no instante em que Aron tira uma foto de si mesmo ao lado das duas moças e Boyle exibe o “retrato” na tela – sem perceber que a câmera supostamente utilizada para registrar a imagem aparece no quadro).
Da mesma maneira, o diretor não parece ter muita certeza da mensagem contida na trajetória do protagonista – ou mesmo se há alguma mensagem além de “sempre avise alguém acerca de seu paradeiro”. É curioso notar, por exemplo, como Boyle opta por abrir e encerrar a narrativa com múltiplas imagens que trazem verdadeiras multidões, mas sem jamais investir no conceito com clareza a fim de justificar sua inclusão: estará o cineasta querendo apenas contrapor a presença reconfortante daquelas pessoas ao isolamento eventual de Ralston (seguido por seu retorno à “civilização”)? Ou isto seria um comentário sobre a natureza individualista, aventureira, do rapaz – o que acabaria resultando, por contraposição, numa crítica velada (e lamentável) a esta postura? Sem estabelecer suas intenções ou mesmo sem incluir indícios que apontem em alguma direção, Boyle parece apenas querer poluir o filme para torná-lo dinâmico sem pensar muito nas conseqüências desta estratégia.
Aliás, é importante observar também como o roteiro investe pesadamente em várias seqüências que trazem delírios ou divagações do protagonista – mas se isto até funciona pontualmente para ilustrar sua degradação física e psicológica (como na montagem que traz vários planos envolvendo bebidas e piscinas, expondo sua sede desesperadora), na maior parte do tempo acaba apenas servindo para tornar o ritmo da narrativa irregular ou revelando-se como preguiçoso recurso expositivo (como no “talk show” claramente incluído para que possa explicar ao espectador as circunstâncias exatas envolvendo o dilema de Ralston, como o fato de que a polícia só iniciaria a busca quando fosse tarde demais).
O curioso é que, provando que as freqüentes escapadas alucinatórias da caverna talvez fossem desnecessárias, 127 Horas sempre ganha intensidade e força quando se concentra nas tentativas de Aron de se libertar – e a decupagem de Boyle, aliada à montagem enérgica de Jon Harris, mantém o espectador tenso enquanto sua câmera explora praticamente todas as possibilidades do estreito cenário, desde planos plongé (leia-se: diretamente de cima para baixo) que revelam sua situação desesperadora até o travelling (certamente criado em computador) que começa em um plano fechado no rosto do rapaz até se afastar por vários quilômetros, expondo com eficiência a inutilidade de seus gritos por socorro. Além disso, Harris é inteligente ao diminuir o ritmo das cenas em vários instantes a fim de ilustrar a calma auto-imposta de Ralston, que, de maneira surpreendentemente racional (dadas as circunstâncias), busca encontrar soluções a partir do escasso equipamento que carregava consigo no momento do acidente.
James Franco, aliás, merece créditos por carregar com tranqüilidade um projeto que basicamente depende de sua atuação para funcionar – e um ator menos intenso, carismático ou expressivo certamente teria afundado o filme. Retratando o amor de Ralston pela vida ao ar livre, o ator evoca toda a empolgação do sujeito ao apresentar o lago às novas amigas ou simplesmente ao passar as mãos carinhosamente pelas rochas do canyon. Ao mesmo tempo, esta sua impulsividade de explorador logo cede espaço ao raciocínio lógico à medida que ele compreende a seriedade da situação na qual se encontra, buscando traçar diferentes estratégias a fim de se libertar da rocha enquanto avalia com frieza o tempo que lhe resta antes que a água chegue ao fim. Da mesma forma, Franco retrata o enfraquecimento de seu personagem com talento, sendo auxiliado na tarefa pela excelente maquiagem, que se encarrega de trazê-lo empalidecido, com os lábios secos e rachados e com olheiras profundas – e é tocante perceber que, mesmo constatando estar à beira da morte, Ralston jamais parece desistir completamente, mostrando-se também sempre preocupado com o impacto que tudo aquilo provocará em sua família.
É uma pena, portanto, que o pavor de Danny Boyle diante da possibilidade de entediar o público acabe sempre retornando para sabotar o projeto, levando-o a incluir seqüências repletas de planos curtíssimos, cortes rápidos e movimentos de câmera absurdos que, tentando evocar o estado de espírito do protagonista, funcionam apenas para destruir o clima opressivo de sua prisão natural. Tivesse investido no silêncio sufocante do canyon em vez de disparar em pirações desnecessárias, o cineasta certamente teria estabelecido um clima muito mais fiel à situação vivida por Ralston; em vez disso, aposta não só na fantasia como também em intervenções musicais absolutamente desastradas que apenas distraem e enfraquecem a experiência.
Ainda assim, não há como deixar de admirar a força do jovem Aron Ralston – e se há um elemento do filme que jamais falha é justamente a persistência do rapaz. E subestimar a capacidade de sua história de manter o espectador interessado não só é sinal de covardia de Boyle, mas também um imenso desrespeito ao protagonista.
19 de Fevereiro de 2011
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