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Críticas por Pablo Villaça

Datas de Estreia: Nota:
Brasil Exterior Crítico Usuários
21/04/2011 01/01/1970 1 / 5 4 / 5
Distribuidora

A Garota da Capa Vermelha
Red Riding Hood

Dirigido por Catherine Hardwicke. Com: Amanda Seyfried, Gary Oldman, Julie Christie, Billy Burke, Shiloh Fernandez, Max Irons, Virginia Madsen, Lukas Haas, Shauna Kain, Adrian Holmes.

A Garota da Capa Vermelha é uma combinação de A Lenda do Cavaleiro Sem Cabeça, da fábula de Chapeuzinho Vermelho e da franquia Crepúsculo – ou, em termos culinários, uma mistura de chocolate, pudim e câncer.

Cometida no papel pelo roteirista David Johnson (que já havia defecado A Órfã), a trama acompanha Valerie (Seyfried), a filha caçula de um casal humilde que, morando numa vila no meio da floresta, se apaixona por Peter, um lenhador órfão (Fernandez), embora esteja prometida a Henry (Irons). Decidida a fugir com o namorado, ela acaba desistindo depois que a irmã mais velha é morta pelo lobisomem local (identidade a descobrir), atraindo para a aldeia o sanguinário padre Solomon (Oldman), conhecido por caçar bestas, bruxas e baratas com o auxílio de um enorme elefante de metal (não perguntem; nem mesmo o roteirista consegue levar isto a sério). Enquanto todos tentam desvendar quem é a pessoa por baixo dos pelos de lobo, Peter e Henry disputam a atenção de Valerie, que ocasionalmente faz visitas à sua bizarra vovozinha (Christie).

Trazendo reviravoltas dignas de uma novela mexicana envolvendo amores do passado, traições, meio-irmãos que se apaixonam desavisadamente e até mesmo um Tonho da Lua (é preciso ter mais de 30 anos para entender a referência), A Garota da Capa Vermelha é um esforço tão débil que nem mesmo a história pregressa do padre Solomon faz muito sentido, já que aparentemente ele foi de tolo incrédulo a uma das figuras mais poderosas da nação em apenas 5 anos (a julgar pela idade de sua filha caçula) - e o mais trágico é que o caso que o sujeito narra sobre seu passado ainda assim se revela muito mais interessante do que o filme no qual está contido, sendo lamentável que o restante da trama não tenha sido atirado no lixo para abrir espaço apenas para a trajetória do personagem de Oldman.

Mas não. Aparentemente, Johnson e a diretora Catherine Hardwicke são incapazes de conceber uma imbecilidade sem se apaixonarem por esta – e, assim, temos cenas nas quais uma mãe em luto esquece temporariamente a filha morta apenas para oferecer conselhos amorosos à irmã desta ou outras que apresentam Henry como um jovem abastado que poderia oferecer uma vida muito melhor à protagonista (algo curioso quando percebemos que ninguém naquela vila parecer ter dinheiro e que o próprio Henry não passa de um ferreiro). E prefiro nem comentar clichês como “Se a ama, a deixará em paz” ou a tentativa de frase de efeito “Imaginei que diria isso”.

Buscando desesperadamente emular a série Crepúsculo, cujo primeiro episódio dirigiu, Hardwicke não hesita em transformar Peter e Henry em genéricos óbvios de Jacob e Edward: enquanto o primeiro surge impulsivo e perigoso, o segundo se estabelece como um emo medieval que provavelmente delineia os olhos com carvão enquanto chora ao som de um alaúde. Mas o mais grave é que apesar de tentar estabelecer o primeiro como o verdadeiro amor de Valerie, é o segundo quem surge compassivo e digno da garota, o que quase me fez mudar, por tabela, para o Team Edward (eu disse “quase”). Como se não bastasse, a diretora comprova as suspeitas de que o ótimo Aos Treze, seu longa de estréia, foi mesmo um acidente ao demonstrar não ter a menor noção de mise-en-scène, criando cenas patéticas nas quais Julie Christie salta da cama como uma atração de trem-fantasma e os habitantes da vila se entreolham desconfiados e com efeitos acidentalmente hilários. Da mesma forma, a mixagem do som se esforça ridiculamente para atirar pequenas informações ou esclarecimentos como falas de fundo, como no instante em que um personagem morre e ouvimos alguém dizer “O pai de [fulano]!” (algo absurdo em uma aldeia na qual todos se conhecem intimamente).

Movendo sua câmera sem qualquer propósito narrativo a não ser o de aparentemente mostrar que havia um diretor comandando o projeto, Hardwicke percorre quilômetros de travellings descartáveis enquanto tenta infantilmente levar o espectador a suspeitar de vários personagens – e é fácil concluir que o(a) culpado(a) será justamente aquele(a) praticamente ignorado(a) pela diretora ao longo da projeção. Sem manter qualquer coerência visual, Hardwicke chega a empregar câmeras subjetivas para vários personagens, exibindo seu desespero também ao incluir nada menos do que três planos-detalhe da mesma porta enfeitada com um lobo, como se procurasse se certificar de que iremos aplaudir seus cenários.

O que nos traz ao único elemento realmente admirável do longa: seu design de produção – função que a própria Catherine Hardwicke exercia com certo talento até cismar que sabia dirigir, em 2003. Trazendo a vila como um cenário fabulesco mais do que apropriado aos propósitos do projeto, o filme pinta aquele espaço com uma artificialidade que beira o exagero, mas sem jamais alcançá-lo – e há algo até mesmo de funcional nos espinhos de madeira que parecem cobrir todas as edificações do lugarejo. Além disso, o fato de até mesmo a floresta surgir como um óbvio set poderia conferir charme à narrativa caso esta prestasse em seus demais elementos.

Porque a verdade é que se até mesmo intérpretes veteranas e talentosas como Christie e Virginia Madsen surgem frágeis em A Garota da Capa Vermelha, jovens mais frágeis como Seyfried, Irons e Fernandez pouco poderiam fazer. Já Gary Oldman se salva por abraçar a natureza patética de seu personagem – e repito que um filme centrado no passado do padre Solomon renderia uma bobagem muito mais divertida.

Apelando sem o menor pudor para uma cena de sonho apenas para incluir as falas clássicas da fábula de Chapeuzinho Vermelho (“Por que olhos tão grandes, vovozinha?”), A Garota da Capa vermelha é tão estúpido que a única pergunta que posso fazer aos seus realizadores é “Por que têm orelhas tão grandes?”.

Mas temo que não entenderiam a indagação.

Observação: Há um susto “adicional” (um termo incorreto que implica erroneamente que houve algum outro durante a projeção) após os créditos finais.

20 de Abril de 2011

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Pablo Villaça, 18 de setembro de 1974, é um crítico cinematográfico brasileiro. É editor do site Cinema em Cena, que criou em 1997, o mais antigo site de cinema no Brasil. Trabalha analisando filmes desde 1994 e colaborou em periódicos nacionais como MovieStar, Sci-Fi News, Sci-Fi Cinema, Replicante e SET. Também é professor de Linguagem e Crítica Cinematográficas.

 

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