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Críticas por Pablo Villaça

Datas de Estreia: Nota:
Brasil Exterior Crítico Usuários
08/04/2011 01/01/1970 3 / 5 3 / 5
Distribuidora
Duração do filme
105 minuto(s)

Rio
Rio

Dirigido por Carlos Saldanha. Com as vozes de Jesse Eisenberg, Anne Hathaway, Leslie Mann, Rodrigo Santoro, Wanda Sykes, Jane Lynch, Jamie Foxx, Will.i.Am, Bernardo de Paula, Carlos Ponce, Jake T. Austin, Thomas F. Wilson, George Lopez, Bebel Gilberto, Judah Friedlander, Tracy Morgan.

O plano inicial de Rio funciona como um resumo perfeito de todo o filme: depois de vermos a belíssima capital ao amanhecer e num silêncio impossível numa metrópole mesmo neste período do dia, a câmera (virtual) se afasta até chegar a uma selva densa na qual pássaros sambam alegremente. Em outras palavras: ao mesmo tempo em que romantiza a Cidade Maravilhosa, Rio não hesita em investir nos clichês relacionados ao Brasil, refletindo a visão de um cineasta que, ali nascido, agora a enxerga de longe com uma visão nostálgica e saudosista enquanto se deixa influenciar pela interpretação exótica do olhar estrangeiro que agora ocupa.

Escrito por Don Rhymer (o gênio por trás da série Vovó...Zona), o roteiro acompanha Blu (Eisenberg), uma arara azul que, depois de contrabandeada para os Estados Unidos (ou simplesmente “Not Rio”, como indicado por uma bem-humorada legenda), estabelece uma profunda ligação com sua dona, a tímida Linda (Mann). É então que o ornitólogo Túlio (Santoro) convida a dupla para uma viagem ao Brasil para que Blu possa “conhecer” a arara Jade (Hathaway) e evitar a extinção da espécie. No entanto, depois que são roubados do viveiro, os dois pássaros iniciam uma fuga enquanto lidam com o fato de que estão acorrentados um ao outro e com o obstáculo representado pelo medo que o protagonista tem de voar.

Assim, Rio logo se apresenta como um amontoado de subgêneros e de estruturas narrativas: é um road movie, mas também traz um herói que segue o modelo do “peixe-fora-d’água”; tem como foco o desejo de Blu de reencontrar a dona, mas não foge do clichê do “acredite em si mesmo” ao retratar sua incapacidade de voar; conta uma historinha de amor centrada no “casal que se odeia, mas se ama”, mas investe numa secundária centrada na dupla que descobre similaridades ao longo de uma perigosa jornada. Em suma, o longa é prejudicado por um roteiro bobo, sem imaginação e extremamente convencional que jamais permite que seus personagens se tornem figuras complexas, obrigando os realizadores a investirem em designs excessivamente engraçadinhos para que estes conquistem o espectador, fazendo sozinhos o trabalho que deveria ser compartilhado com a história.

Não que a construção dos personagens e a trama sejam os únicos problemas do roteiro de Rhymer: a própria construção da narrativa é decepcionante, já exibindo sua fraqueza na montagem que busca ilustrar a evolução da amizade entre Blu e Linda através de vinhetas bobas que empalidecem, por exemplo, diante de seqüências semelhantes em Up ou Toy Story 3. Além disso, os números musicais presentes em Rio são jogados na projeção de maneira forçada, jamais se encaixando organicamente na história mesmo que, de um ponto de vista puramente plástico, sejam encantadores. Como se não bastasse, o filme ainda introduz um grupo de macaquinhos ladrões que, completamente deslocados na trama, tentam se estabelecer como os novos “pingüins de Madagascar” ou como o novo esquilinho Scratch – e eu não ficaria espantado caso logo surgissem protagonizando seus próprios curtas ou uma série produzida para a televisão. (Além disso, os espectadores brasileiros certamente perceberão a falta de lógica do clímax, que obriga os personagens a desfilarem na Sapucaí como única forma de chegarem a um “aeroporto clandestino”.)

Mas Rio, apesar de todos os problemas, é beneficiado pelos personagens adoráveis (ainda que unidimensionais), que se tornam ainda mais cativantes graças ao design engraçadinho que, seguindo todas as convenções estéticas possíveis (uma abordagem correta neste caso, vale dizer), aposta em olhos grandes e expressivos, cores básicas e alegres e em trejeitos antropomorfizados que remetem à falta de jeito infantil. Da mesma forma, o design de produção concebe um Rio que, parecendo ter parado na década de 70, surge limpíssimo e banhado em cores e luzes sempre românticas e quentes. Além disso, o diretor Carlos Saldanha investe pesadamente em todos os cartões postais da cidade, dos arcos da Lapa ao Cristo Redentor, passando pelo Pão-de-Açúcar, pela Baía de Guanabara e pela já citada Marquês de Sapucaí – uma opção nada criativa, mas provavelmente inevitável.

Assim, há momentos em que Rio soa mais como vídeo turístico do que como um longa-metragem de ficção – e por mais que seja visualmente arrebatador acompanhar a jornada de Blu sobre uma asa-delta enquanto conhece a cidade, é impossível deixar de pensar que nada daquilo contribui de fato para o desenvolvimento da narrativa. Em contrapartida, há outros momentos nos quais Saldanha consegue combinar com sucesso seus arroubos turísticos e suas obrigações como realizador – algo que pode ser comprovado na seqüência em que acompanhamos o garotinho Fernando por um passeio pela favela e que culmina num plano melancólico e belíssimo no qual o amontoado de barracos surge em contraponto às  luzes distantes da Guanabara.

Contando ainda com uma trilha sedutora, mas igualmente lugar-comum, de John Powell (com contribuições de Carlinhos Brown e Sérgio Mendes), Rio parece se contentar em ser um espetáculo puramente visual que jamais se esforça para explorar melhor o potencial dos cenários – e reparem, por exemplo, como a longa cena na Sapucaí, embora povoada por centenas de objetos de cena e “figurantes”, jamais resulta numa única gag memorável. Por outro lado, é impossível se deixar irritar pelos estereótipos incluídos por Saldanha (como os turistas furtados – mesmo que por macacos – e os personagens que se entregam à excentricidade do Carnaval, como a dentista e o segurança), já que estes são contrabalançados por uma interpretação até generosa da cidade, que surge como um paraíso na Terra.

Sem fugir nem mesmo da já irritante mania de encerrar a projeção com um número musical dispensável e bobo que traz os personagens dançando para a câmera (algo solidificado pelo sucesso do primeiro Shrek), Rio comprova sua fragilidade narrativa ao concluir sua história através de fotos espalhadas pelos créditos finais e que buscam amarrar as pontas soltas de forma preguiçosa e artificial.

Pena. Caso tivesse sido concebido com o cuidado que a Pixar confere às suas produções, Rio poderia ter se tornado o Manhattan de Carlos Saldanha. Em vez disso, virou um guia turístico para aqueles que sonham em visitar a capital fluminense. Em 1970.

08 de Abril de 2011

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Pablo Villaça, 18 de setembro de 1974, é um crítico cinematográfico brasileiro. É editor do site Cinema em Cena, que criou em 1997, o mais antigo site de cinema no Brasil. Trabalha analisando filmes desde 1994 e colaborou em periódicos nacionais como MovieStar, Sci-Fi News, Sci-Fi Cinema, Replicante e SET. Também é professor de Linguagem e Crítica Cinematográficas.

 

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