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Críticas por Pablo Villaça

Datas de Estreia: Nota:
Brasil Exterior Crítico Usuários
01/07/2011 01/01/1970 1 / 5 1 / 5
Distribuidora
Duração do filme
150 minuto(s)

Transformers: O Lado Oculto da Lua
Transformers: Dark of The Moon

Dirigido por Michael Bay. Com: Shia LaBeouf, John Turturro, Frances McDormand, Josh Duhamel, Tyrese Gibson, Patrick Dempsey, John Malkovich, Kevin Dunn, Julie White, Rosie Huntington-Whiteley, Alan Tudyk, Ken Jeong, Glenn Morshower e as vozes de Peter Cullen, Hugo Weaving, Leonard Nimoy, James Remar.

Transformers: O Lado Oculto da Lua é o tipo de filme cujos defensores não se envergonham de proteger alegando que, para apreciá-lo, basta “desligar o cérebro”. Infelizmente, porém, esta é uma opção com a qual não posso contar, já que: 1) Eu normalmente me divirto mais quando sou mentalmente estimulado; e 2) Meu cérebro não veio com chave on/off. Aliás, esta foi a mesma defesa oferecida a Transformers 2 – até que o próprio diretor do longa, Michael Bay, veio a público reconhecer que aquela continuação era mesmo ruim e que tudo seria melhor neste terceiro capítulo. Pena que o cineasta também deixou sua chave intelectual no off ao assumir o trabalho.


Escrito por Ehren Kruger a partir de uma ideia incrivelmente estúpida (criar uma série cinematográfica a partir de bonecos de plástico), Transformers 3 já tem início desrespeitando mais uma vez a lógica cronológica interna da trilogia ao anunciar que, décadas antes dos eventos relatados nos longas anteriores, um importante Autobot havia caído em nosso satélite natural e chamado a atenção dos terráqueos (o que leva, claro, o presidente Kennedy a dizer “Então temos que ir à Lua! E temos que chegar antes dos russos!”, provando ser um autêntico personagem de Michael Bay). Já no presente, os malvados Decepticons buscam manipular seus inimigos para que resgatem o Sentinel Prime (Nimoy) com um objetivo obscuro e importante que, sabe-se lá o motivo, foi completamente ignorado nas duas primeiras partes da série embora Megatron (Weaving) já estivesse a par da localização do ex-líder Autobot. Enquanto isso, Sam (LaBeouf), o herói da franquia, encontra-se desempregado após salvar o mundo duas vezes, sendo sustentado pela bela Carly (Huntington-Whiteley), com a qual se envolveu após sua namorada anterior ter sido demitida  por ofender o diretor.

Com um roteiro que não parece possuir estrutura aparente, apresentando novos personagens e elementos importantes da história mesmo já quase no fim do segundo ato e apenas quando estes têm alguma função imediata a desempenhar, Transformers 3 não exibe a menor vergonha por sua falta de coerência ou lógica: em um segundo, por exemplo, Carly se esforça para proclamar a importância estratégica de Sam diante de uma figurona da CIA (McDormand) apenas para, logo em seguida, ficar revoltada ao descobrir que – oh! – ele agora está novamente trabalhando ao lado dos Autobots (e é só aí, com mais de uma hora de projeção, que somos informados de sua motivação através de uma rápida foto do irmão militar que ela perdeu em combate). Além disso, desde o princípio o roteiro de Kruger carrega nos diálogos irritantemente expositivos, chegando a empregar narrações esporádicas feitas por Optimus Prime que surgem artificiais e desnecessárias. Como se não bastasse, os diálogos concebidos pelo roteirista são simplesmente pavorosos, tornando-se ainda mais torturantes graças ao hábito de Optimus de fazer discursos extraídos dos mais estúpidos livros de auto-ajuda (“Vocês podem perder a fé nos Autobots, mas jamais em vocês mesmos!”).

Mas a coisa fica pior: diretor já sem o menor talento para a comédia, Michael Bay ainda aposta nas horrorosas piadas de Kruger ao mesmo tempo em que permite que atores como Ken Jeong e Alan Tudyk criem personagens caricaturais que apenas ressaltam a irrealidade daquele universo. O primeiro, embora funcione na fabulosa série Community e a conta-gotas em Se Beber, Não Case, se limita a investir em estereótipos étnicos, como de hábito, ao passo que o segundo, um ator bem mais competente, parece tentar fazer algo de diferente com seu personagem ao usar a língua presa e sugerir sua homossexualidade, não percebendo que isto apenas o transforma em mais uma das muitas tiradas homofóbicas típicas do cineasta. John Malkovich, por sua vez, busca se divertir ao criar um tipo absurdo com seu bronzeamento artificial, seus maneirismos exagerados e sua peruca grisalha, mas o personagem é tão descartável que mal registramos sua saída de cena – o contrário do que ocorre com Shia LaBeouf, que, embora continue a demonstrar talento e carisma, aqui surge aborrecido e repetitivo, transformando a piada dos gritos efeminados em uma overdose de histrionismos.

Igualmente triste, diga-se de passagem, é ver Frances McDormand e John Turturro, dois veteranos do Cinema dos irmãos Coen, vendendo seus talentos para um picareta como Michael Bay – e deve ter doído, na primeira, dizer uma fala como “Se contar para alguém sobre aquela nossa noite em Quantico, eu mando prendê-lo!” ao perceber que o diretor a obrigaria a soltá-la em meio a uma multidão de observadores, desrespeitando qualquer lógica mais básica da natureza humana. (Já Turturro aqui se mostra menos insuportável do que no longa original, mas este é um elogio ambíguo.) E se Julie White volta a encarnar a mãe de Sam como a personagem que eu mais gostaria de ver sendo pisoteada por Decepticons e Autobots, a estreante Rosie Huntington-Whiteley se apresenta como a grande revelação do projeto, exibindo talento ao transformar Carly em uma figura tridimensional e tocante – e com isso quero dizer que suas formas físicas repletas de volumes e curvas são capazes de levar os adolescentes da plateia a se tocarem enquanto trancados em seus quartos. Como atriz, por outro lado, ela consegue fazer Megan Fox soar como Fernanda Montenegro, já que seu relacionamento com Sam, além de inverossímil, falha no propósito básico de levar o espectador a se importar com os personagens humanos da narrativa – algo grave, já que tampouco nos importamos com os metálicos.

Beneficiado por incríveis efeitos visuais (nada mais do que uma obrigação em uma superprodução como esta), Transformers 3 ainda assim não consegue ilustrar com clareza a metamorfose entre as diferentes versões de seus robôs – e embora isto talvez me faça soar como um daqueles malucos que reclamam que as calças do Hulk jamais se rasgam totalmente, não posso deixar de acreditar que, considerando a premissa do longa, seria importante explicar como um carro de dois ou três metros pode se tornar um robô de 15. E por que eles têm formas humanoides ou que remetem a animais? E por que alguns falam com sotaques regionais da Terra? E por que eles aceitam trabalhar para o governo norte-americano em detrimento de outros países, já que, como seres avançados de outro planeta, nosso contexto sócio-político-econômico-geográfico não deveria importar para eles?

Ah, mas quem estou tentando enganar? Seria demais esperar algum tipo de coerência narrativa de um cineasta cujos principais interesses são explosões e a objetificação das mulheres e que, confiante em sua escrotice de macho-alfa, não tem qualquer pudor ou senso de auto-crítica ao apresentar a principal personagem feminina enfocando sua bunda em um plano-detalhe enquanto, vestindo apenas uma calcinha, ela sobe uma escadaria para despertar seu inútil namorado (que, não por acaso, é o protagonista). Assim, quando um outro personagem discute sua coleção de carros apontando a beleza das curvas de sua lustrosa lataria, percebemos um raro momento de sinceridade e – por que não? - autoralidade por parte de Michael Bay, que, ao comparar automóveis e mulheres, escancara sua visão de mundo, reafirmando-a ao enfocar praticamente todas as atrizes do longa como bibelôs carnudos cujas formas são realçadas por microssaias justíssimas.

Por outro lado, o diretor vem se tornando cada vez mais preguiçoso e incompetente ao estabelecer a lógica espacial de suas cenas, jamais permitindo que percebamos com clareza o que está acontecendo e a distribuição dos elementos em cena. Para piorar, sua noção sobre mise-en­-scène beira o ridículo, chegando ao fundo do poço na cena em que McDormand diz aos Autobots que quer apresentá-los ao ex-astronauta Buzz Aldrin – que só então entra no galpão cercado por agentes federais, como se estivesse esperando ser chamado ao palco pelo apresentador de uma cerimônia. Da mesma maneira, chega a ser hilário o plano no qual Bay enfoca Huntington-Whiteley em câmera lenta e (claro) com a boca entreaberta e o rosto congelado enquanto uma série de explosões ocorre ao fundo – e a esta altura do campeonato, nem perco mais tempo em comentar seu hábito de usar travellings circulares e ângulos de câmera baixos sem qualquer propósito narrativo (não, nem com a básica função de engrandecer os heróis, já que chega a enfocar um soldado desta maneira enquanto este expõe seu medo dos robôs).

Sabendo ao menos usar com eficiência o 3D, já que emprega planos com grande profundidade de campo ao enfocar espaços amplos e deixando aqueles com menor profundidade apenas para quadros mais fechados, Michael Bay ainda acaba sendo beneficiado pela técnica por ser obrigado a cortar com menos frequência para evitar o caos visual. Isto, porém, não contorna a estupidez da história, cujo longo terceiro ato basicamente se limita a acompanhar os personagens enquanto são atacados pelos Decepticons e escapam apenas para imediatamente serem novamente atacados em outro ambiente e em outro e em outro e em outro. Neste sentido, o filme converte-se numa verdadeira tortura em seus intermináveis 157 minutos, conseguindo ser uma experiência entediante mesmo contando com inúmeras explosões, robôs gigantes e viagens espaciais – e o inchaço desnecessário do projeto pode ser comprovado por apenas uma pergunta: o que mudaria na história caso todas as cenas envolvendo Malkovich e os pais de Sam fossem excluídas? Para concluir, se a psicologia barata empregada por Carly para manipular Megatron prova alguma coisa é que os tais robôs, embora pertencentes a uma raça “avançada”, há muito colocaram suas mentes na posição em off defendida por seus fãs terráqueos.

Povoado por personagens que mesmo depois de três filmes ainda precisam ser lembrados de atacar os inimigos (“Mirem nos Decepticons!”, instrui alguém em certo instante, no meio de uma batalha), Transformers 3 é o retrato não só do que Hollywood tem de pior, mas também da maneira com que esta enxerga um público sempre disposto a engolir sanduíches de estrume desde que estes tenham um numeral no título e sejam apresentados em glorioso 3D. Ao que parece, com o cérebro desligado tudo tem gosto de filé.

30 de Junho de 2011

Pablo Villaça, 18 de setembro de 1974, é um crítico cinematográfico brasileiro. É editor do site Cinema em Cena, que criou em 1997, o mais antigo site de cinema no Brasil. Trabalha analisando filmes desde 1994 e colaborou em periódicos nacionais como MovieStar, Sci-Fi News, Sci-Fi Cinema, Replicante e SET. Também é professor de Linguagem e Crítica Cinematográficas.

 

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