Datas de Estreia: | Nota: | ||
---|---|---|---|
Brasil | Exterior | Crítico | Usuários |
26/11/2010 | 01/01/1970 | 3 / 5 | 3 / 5 |
Distribuidora | |||
Dirigido por John Erick Dowdle. Com: Chris Messina, Jenny O’Hara, Bojana Novakovic, Bokeem Woodbine, Geoffrey Arend, Logan Marshall-Green, Matt Craven, Jacob Vargas.
Em certo momento de Demônio, longa baseado em uma história concebida por M. Night Shyamalan, um segurança de origem latina e profundamente religioso tenta convencer o cético protagonista de que ninguém menos do que o Diabo está por trás dos acontecimentos por eles testemunhados e, para isso, atira uma torrada com geléia no chão. Seu argumento: com a proximidade do Coisa-Ruim, tudo dá errado – e o fato de o lado com a geléia cair virado para o chão é a prova disso. Em outras palavras: sempre que alguém fizer a experiência, haverá 50% de chance de o Diabo não só existir, mas estar por perto, já que, de acordo com Shyamalan, a Lei de Murphy é obra do capeta.
Mas o pior não é ser obrigado a ouvir sandices como esta, mas sim perceber que o tal imbecil, vivido por Jacob Vargas, é encarado pelo roteiro de Brian Nelson (MeninaMá.com, 30 Dias de Noite) como a voz da razão à qual todos eventualmente passam a escutar – afinal, é ele quem acerta a origem sobrenatural do óbvio terror que toma conta de um elevador que, parado entre andares e trazendo cinco pessoas de passado questionável, serve de palco para uma carnificina gradual e inexplicável. Enquanto isso, o detetive vivido por Chris Messina, recuperando-se de uma fase de alcoolismo provocada pela perda da família (alguma chance disso vir a se revelar importante na trama?), é chamado para investigar o que está ocorrendo e passa a monitorar os passageiros através da câmera de segurança ao mesmo tempo em que tenta descobrir quem são eles e por que parecem tão propensos a morrer sempre que as luzes do elevador começam a piscar.
Fotografado pelo veterano Tak Fujimoto (O Silêncio dos Inocentes, O Sexto Sentido), o filme é hábil ao construir uma atmosfera sombria através dos constantes establishing shots que revelam o céu tomado pelo cinza e também através da paleta levemente dessaturada – e, da mesma maneira, os planos constantemente inclinados sugerem de forma eficiente o estranhamento vivido pelos personagens diante daquela situação assustadora. E se a utilização de quadros fechados ressalta o confinamento das cinco vítimas (ou quatro, já que, a rigor, uma é Keyser Söze), os cortes rápidos empregados pelo montador Elliot Greenberg conseguem conferir dinamismo mesmo às cenas que se passam naquele pequeno ambiente.
Ainda assim, Demônio falha ao jamais conseguir se tornar verdadeiramente claustrofóbico – e parte da responsabilidade por este problema se deve ao tempo que passamos fora do elevador (na realidade, a maior parte da projeção). Porém, esta é uma decisão quase inevitável do roteiro, já que seria difícil manter a narrativa envolvente caso permanecêssemos presos com os personagens durante os 80 minutos do filme. Menos perdoável, no entanto, é a subtrama utilizada para justificar as seqüências externas ao elevador: um trauma no passado do herói que, claro, soa tão artificial em sua exposição quanto em sua resolução. Além disso, fica difícil aceitar a inteligência do detetive vivido por Messina quando este começa a conjecturar que o assassino (um dos cinco “prisioneiros”) está matando os companheiros apenas para despistar suas reais intenções: a morte de alguém em específico (uma teoria besta que poderia ser desmontada com uma única pergunta: e como, exatamente, o assassino pretende despistar a própria culpa quando os demais estiverem mortos?). Contudo, se levarmos em consideração que o tal detetive não demora muito a dar ouvidos às baboseiras religiosas do segurança latino, sua falta de inteligência não deveria surpreender, já que, é bom lembrar, ele não sabe que está em um filme de terror intitulado Demônio.
Beneficiado pela onipresença da trilha de Fernando Velázquez, que ajuda a construir o clima de tensão mesmo que pecando pelo exagero, o longa decepciona pela falta de coesão de seu roteiro, desde uma narração em off que jamais se justifica até elementos da trama que são abandonados sem explicação (como o suicídio que abre a trama). Além disso, se a estupidez do segurança de Vargas já irrita habitualmente, acaba se tornando insuportável quando ele solta um inacreditável “de onde eu venho, esse fenômeno se chama Encontro com o Demônio”.
Pois de onde eu venho, isso se chama “caricatura étnica ofensiva”.
Elegante na rima visual que abre e encerra a projeção – e que ao menos evoca bem a relativa harmonia alcançada pela trama -, Demônio é uma besteira que ao menos não abusa da paciência do espectador, sendo curto o bastante para não tornar sua falta de coesão excessivamente ofensiva. Neste sentido, aliás, é uma benção que apenas seu argumento tenha sido criado por Shyamalan, já que, caso tivesse assinado o roteiro e a direção, o cineasta certamente teria torturado o público com uma bobagem de 120 minutos que se levaria a sério e traria personagens dizendo suas falas com a mesma velocidade de lesmas na areia.
A triste verdade é que o problema de Shyamalan não reside exatamente na espiral de mediocridade na qual mergulhou nos últimos dez anos, desde que concebeu um filme sobre aliens que, alérgicos à água, tentam invadir um planeta dominado pela substância; não, na realidade o problema é que o realizador parece acreditar que a inteligência de seu público afundou ao lado de seu discernimento. Mas felizmente a geléia nem sempre cai virada para baixo.
26 de Novembro de 2010
Siga Pablo Villaça no twitter clicando aqui!
Comente esta crítica em nosso fórum e troque idéias com outros leitores! Clique aqui!