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Críticas por Pablo Villaça

Datas de Estreia: Nota:
Brasil Exterior Crítico Usuários
30/09/2007 10/05/2007 5 / 5 / 5
Distribuidora
Duração do filme
83 minuto(s)

El Otro
El Otro

Dirigido por Ariel Rotter. Com: Julio Chávez, Inés Molina, María Ucedo, María Onetto, Arturo Goetz, Osvaldo Bonet.

 

Certo dia, ao viajar para uma cidade do interior da Argentina para visitar um cliente, o advogado Juan Desouza (Chávez) surpreende-se ao constatar que o passageiro que ia ao seu lado encontra-se morto, mas cumpre seus compromissos sem parecer se importar muito com o ocorrido. Porém, desistindo de retornar a Buenos Aires no último instante, ele opta por hospedar-se em um hotel utilizando o nome do falecido, empregando os dias seguintes em caminhadas sem rumo pela cidade.

 

O que leva Juan a um ato tão impulsivo? Anteriormente, testemunháramos sua surpresa ao ser informado sobre a gravidez da esposa (que, oftalmologista, também o notificou da necessidade de usar óculos) e o acompanháramos até o apartamento do pai adoentado, mas a aparente serenidade do sujeito em nada indicara alguma insatisfação com a vida que levava ou com suas obrigações filiais, conjugais e, agora, paternais.

 

E é isto que torna El Otro tão fascinante: estudo de personagem escrito com sensibilidade pelo diretor Ariel Rotter, o filme acompanha a busca de um homem em clara crise de meia-idade por algum tipo de equilíbrio interno que o deixe em paz consigo mesmo. Provavelmente deflagrada pela morte daquele desconhecido – que, afinal de contas, poderia ser ele em outras circunstâncias – e até mesmo pelo reconhecimento de sua decadência física (os óculos recém-prescritos), Juan leva uma vida cuja estabilidade pode ser facilmente confundida com monotonia (e sua roupa sempre igual indica isso). Assim, ao visitar a casa de um homem morto há alguns meses e descobrir vestígios de sua existência, como cartas, bilhetes e um bule ainda sobre a mesa do café, o advogado constata mais uma vez a própria efemeridade – e seu hábito de observar homens mais velhos em restaurantes denuncia sua preocupação com o futuro.

 

Não é à toa que, inicialmente, Juan fornece os nomes de dois mortos ao hospedar-se em hotéis diferentes (o primeiro tinha uma vista deprimente): é isto que ele teme e assim que se sente. Aliás, o excelente Julio Chávez mantém uma respiração pesada durante toda a projeção (com freqüentes suspiros), ilustrando, assim, o estado de sufocamento de seu personagem – e aqueles dias de liberdade temporária representam uma clara tentativa de voltar a respirar melhor.

 

Mas não só isso: subitamente consciente de já ter passado da metade de sua vida, Juan dá início a um processo de resgate dos elementos mais primordiais da experiência humana, como o contato com a Natureza e também seus sentimentos e medos mais infantis (como o pavor do escuro). Neste sentido, o trabalho de design de som merece aplausos, já que, descartando a utilização de uma trilha convencional, o filme depende ainda mais dos sons diegéticos para ilustrar as experiências do protagonista.

 

Rico em simbolismos, El Otro exibe um elegante equilíbrio temático ao amarrar a conformação da crise de Juan (percebam que não falei em “solução) com um de seus estopins: os óculos. Se por um lado o alertaram sobre seu envelhecimento, também são eles que, simbolicamente, levam o sujeito a enxergar o valor daquilo que o cerca – que, perfeito ou não, representa seu passado e (o mais importante) o legado que deixará para trás.

 

24 de Outubro de 2007

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Pablo Villaça, 18 de setembro de 1974, é um crítico cinematográfico brasileiro. É editor do site Cinema em Cena, que criou em 1997, o mais antigo site de cinema no Brasil. Trabalha analisando filmes desde 1994 e colaborou em periódicos nacionais como MovieStar, Sci-Fi News, Sci-Fi Cinema, Replicante e SET. Também é professor de Linguagem e Crítica Cinematográficas.

 

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