Datas de Estreia: | Nota: | ||
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Brasil | Exterior | Crítico | Usuários |
01/01/1970 | 01/01/1970 | 4 / 5 | / 5 |
Distribuidora | |||
Duração do filme | |||
208 minuto(s) |
Dirigido por Martin Scorsese.
“George Harrison tinha dois lados: um doce e outro agressivo”. Esta é uma observação feita repetidas vezes ao longo dos 208 minutos de Living in the Material World, documentário dirigido por Martin Scorsese que busca abordar a maior parte da trajetória profissional do ex-Beatle. O problema é que, embora o filme se dedique a trazer vários exemplos do lado “doce” de Harrison, sua agressividade jamais é ilustrada de fato, sugerindo uma clara tendência por parte do cineasta de pintar o músico com as melhores cores possíveis.
Claro que trazendo Olivia Harrison como uma das produtoras, o filme não poderia seguir uma linha muito diferente, mas comparando este documentário ao igualmente extenso e infinitamente mais complexo No Direction Home, que Scorsese realizou sobre Bob Dylan, torna-se inevitável imaginar o que o diretor teria feito caso não contasse com a viúva e companheira de décadas de George tão envolvida no projeto. Por outro lado, é justamente graças à presença de Olivia que o longa ganha acesso a um infindável material de arquivo sobre o personagem-título, incluindo vídeos raros do início de sua carreira, o que certamente compensa um pouco a óbvia perda de objetividade.
Fascinante por sua escala e pelas imagens que resgata, Living in the Material World já impressiona desde o princípio ao trazer belíssimas fotos registradas por Astrid Kirchherr no ateliê pertencente a Stuart Sutcliffe, primeiro baixista dos Beatles, e que revelam Lennon e Harrison entristecidos pela morte precoce do amigo. Além disso, considerando que ninguém recusaria conversar com Scorsese (especialmente considerando o envolvimento de Olivia Harrison), o documentário tem a oportunidade de trazer um grupo impressionante de entrevistados, entre os quais, claro, Ringo Starr (provavelmente o mais divertido) e Paul McCartney, que, entre outras coisas, revela como Harrison criou o refrão musical de “And I Love Her” no momento da gravação, numa prova de seu imenso talento criativo.
Saltando no tempo de maneira eficiente para cobrir as várias fases da carreira do músico (mérito do montador David Tedeschi, que trabalha com Scorsese em todos os seus documentários, com exceção de Uma Carta para Elia, desde No Direction Home), este Living in the Material World inicia sua narrativa com a formação dos Beatles até chegar à carreira solo de Harrison, passando por incidentes como a morte de Brian Epstein, empresário do grupo, e por sua constante busca espiritual, que envolveu desde os estudos com o polêmico Maharishi até sua duradoura amizade com Ravi Shankar. Assim, quando finalmente chegamos aos anos finais de sua vida, à facada que levou de um estranho em sua casa e ao câncer que o derrotaria, o filme criou um retrato tão abrangente do músico que se torna impossível não sentirmos a perda representada por sua morte.
Homem de muitos interesses, George Harrison se envolveria não só com a música (como cantor, instrumentista, compositor e produtor), mas também com o Cinema (produzindo A Vida de Brian, por exemplo) e até mesmo com as corridas automobilísticas – e, de fato, é revelador perceber como respeitados profissionais de todas estas áreas surgem falando sobre o amigo de maneira tão lisonjeira, mesmo que o resultado seja um pouco exagerado ao tentar estabelecer Harrison como um sábio generoso, altruísta e perfeito.
Sem tentar fazer drama barato com a morte do ex-Beatle, Living in the Material World é mais do que um documentário; é uma homenagem a um homem que, santo ou pecador (ou melhor: e, não “ou”), certamente ajudou a iluminar o planeta enquanto aqui esteve. E que, através de sua música, continua a fazê-lo ainda hoje.
Observação: esta crítica foi originalmente publicada como parte da cobertura do Festival do Rio de 2011.
22 de Outubro de 2011