Datas de Estreia: | Nota: | ||
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Brasil | Exterior | Crítico | Usuários |
21/01/2011 | 01/01/1970 | 2 / 5 | / 5 |
Distribuidora | |||
Dirigido por Florian Henckel von Donnersmarck. Com: Angelina Jolie, Johnny Depp, Paul Bettany, Timothy Dalton, Rufus Sewell, Steven Berkoff, Raoul Bova. .
Em 1992, a Universal Pictures, responsável por Perfume de Mulher, levou os membros da Associação de Imprensa Estrangeira de Hollywood (HFPA) para um fim-de-semana em Paris como forma de “divulgar” o filme (que não se passa na França, diga-se de passagem) – algo que magicamente resultou na vitória do longa no Globo de Ouro daquele ano. Uma década antes, a mesma associação havia premiado a pavorosa Pia Zadora como “Novata do Ano” por sua atuação risível em Butterfly embora a moça já houvesse estreado no Cinema há 18 anos – e logo descobriu-se que o marido multimilionário da atriz havia (adivinhem) levado os votantes para um passeio em seu cassino em Las Vegas antes que preenchessem suas cédulas. Este escândalo, aliás, ecoava apenas o que havia ocorrido em 68, quando a NBC desistiu de exibir a cerimônia por seis anos depois que um órgão do governo norte-americano denunciou o lobby praticado na escolha dos vencedores.
Mas por que estou repassando a vergonhosa história do Globo de Ouro? Simples: porque a indicação deste O Turista e seus protagonistas como “melhores do ano” pela premiação representa um absurdo tão grande e inexplicável quanto a coroação de Pia Zadora – e se considerarmos que neste mesmo ano os votantes da HFPA foram levados pela Sony para Las Vegas para um fim-de-semana de diversão que contou com um show de Cher (culminando na indicação de Burlesque ao lado de O Turista), não é difícil constatar que, de fato, velhos hábitos custam a morrer.
O mais lamentável, porém, é que esta produção exibia imenso potencial, já que se trata da refilmagem de um longa francês (Anthony Zimmer – A Caçada) que, embora correto, certamente trazia uma premissa bem mais interessante do que sua execução. Escrito por Christopher McQuarrie (Oscar por Os Suspeitos), Julian Fellowes (Oscar por Assassinato em Gosford Park) e pelo diretor Florian Henckel von Donnersmarck (Oscar por A Vida dos Outros e por ter um nome gigantesco), o projeto parece demonstrar de forma inequívoca que nem todas as estatuetas douradas do mundo podem garantir a qualidade de um filme.
Iniciando em Paris enquanto a polícia local acompanha os passos da bela Elise (Jolie) a pedido da Scotland Yard., O Turista nos apresenta assim à amante do ex-contador de um poderoso gângster e que representa a única pista que as autoridades têm do paradeiro do sujeito, que alterou o rosto através de cirurgia plástica a fim de fugir do antigo chefe depois de roubar mais de dois bilhões de euros de sua fortuna conquistada ilegalmente. Recebendo instruções para abordar um estranho que tenha o tipo físico do namorado, Elise acaba conhecendo o professor de matemática Frank (Depp), que está a caminho de Veneza para passar as férias – e, com isso, o turista acaba se tornando alvo do vilão Reginald Shaw (Berkoff) e do inspetor John Acheson (Bettany).
Os primeiros 20 minutos de projeção, aliás, são os mais promissores, já que não apenas somos informados sobre as intenções de Elise como também percebemos que a própria Scotland Yard já sabe que o turista Frank é inocente, despertando nossa curiosidade acerca dos rumos de uma história obviamente protagonizada por pessoas inteligentes. Isto é, até que o roteiro sente a obrigação de introduzir o vilão como uma caricatura que, como seus capangas, insiste em vestir-se de preto e descobrimos que, na realidade, todos os personagens possuem Q.I. inferior ao do Espantalho de O Mágico de Oz. Como se não bastasse a trama rasa e tola, o cineasta Florian Henckel von Donnersmarck (FHD de agora em diante) não consegue imprimir energia alguma à narrativa, que não ganha vida nem mesmo nas poucas e prosaicas seqüências de ação (como a péssima perseguição no telhado), tropeçando ainda nas patéticas tentativas de fazer humor (como na cena em que Frank é colocado em uma cela e o roteiro, sem conseguir pensar em uma forma de tornar o momento interessante, apela para o clichê do prisioneiro grandalhão que aterroriza o frágil herói com um “Oi”).
Não, aparentemente o diretor aposta todas as suas fichas no interesse inato de um público leitor de “Caras” em ver duas grandes e belas celebridades se beijando na telona e, assim, se limita a incluir repetidas cenas nas quais Jolie e Depp se olham de forma intensa e romântica como se tivéssemos pago ingresso não para um filme chamado O Turista, mas sim para um outro intitulado Angie & Johnny: Ricos, Famosos, Bonitos e Apaixonados. Para piorar, a estrela apresenta aqui o mesmo problema que acompanha todas as suas atuações em longas de ação: uma postura tão inabalável e segura de si que nos tornamos incapazes de acreditar que sua personagem possa enfrentar algum perigo (e já em sua primeira cena sabemos que os policiais franceses não serão páreo para ela). Aliás, Elise se torna muito mais um ícone do que uma figura crível, o que é salientado até mesmo pela reação de praticamente todos os figurantes ao longo da projeção, que reagem a ela como se estivessem vendo... bom, Angelina Jolie. Enquanto isso, Johnny Depp, como é seu costume ao encarnar tipos “normais” (algo raro em sua carreira), vive Frank em tom sempre baixo e entediado, sem vida – o que, aqui, até funciona por se tratar de um homem solitário e desiludido. Além disso, os detalhes da composição do ator, como ao oferecer-se para ajudar outras pessoas a descerem do trem ou ao se atrapalhar ao abrir a porta da varanda, ajudam a torná-lo mais vulnerável e real, contrapondo-o ainda mais à sua companheira de cena, como se cada um estivesse em seu próprio filme. Por outro lado, ator algum conseguiria conferir verossimilhança a um personagem obrigado a murmurar para si mesmo “Mas eu estou apaixonado por você” enquanto vê a amada partindo de lancha.
E esta é uma das grandes decepções representadas por O Turista: além de não corrigir os problemas do original (como os furos que surgem em função das reviravoltas), o filme ainda transforma a dupla principal em um casal desinteressante e absurdo: se Sophie Marceau e Yvan Attal estabeleciam uma ótima química em cena e nos mantinham interessados nas motivações de seus personagens, aqui supostamente devemos apenas nos contentar com o encontro de dois astros – e se Emile e Frank se chamassem Angelina e Johnny, talvez o roteiro tivesse sido mais honesto. Para piorar, o restante do elenco não se sai melhor: Timothy Dalton completa a transição de 007 para “M”, surgindo como um burocrata aborrecido (algo que FHD salienta sem sutileza ao apresentá-lo enquanto assina um monte de documentos), e Paul Bettany é desperdiçado num papel mais apropriado a um ator em ascensão, desesperado por trabalho, do que a um intérprete de sua estatura. (Ou talvez ele agora esteja em decadência e precise da exposição, quem sabe?) Para completar o elenco, o cineasta resgata Steven Berkoff, que já fazia vilões caricatos na década de 80 (007 Contra Octopussy, Um Tira da Pesada e Rambo II – A Missão) e continua a interpretá-los 30 anos depois – e que aqui surge numa cena absolutamente risível na qual, para provar sua maldade, mata um capanga diante do alfaiate que tomava suas medidas (e que provavelmente não deve ter vivido por muito mais tempo).
Não conseguindo nem mesmo transformar Veneza, a mais cinematográfica das cidades, em uma locação interessante para o projeto (ela surge tão sem vida quanto os protagonistas), O Turista não sobrevive nem mesmo à primeira visita, bastando uma pergunta para que o projeto desmorone: e se Elise houvesse se sentado em outro lugar no trem que a levou a Veneza?
Taí. Acho que teria sido melhor acompanhar a viagem da personagem (que, afinal, tem os lábios de Angelina Jolie) em tempo real durante a jornada até a cidade italiana do que vê-la percorrendo sonâmbula as maquinações estúpidas de um roteiro sabotado pela falta de entusiasmo de um cineasta com preguiça.
21 de Janeiro de 2011
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