Datas de Estreia: | Nota: | ||
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Brasil | Exterior | Crítico | Usuários |
30/01/2009 | 01/01/1970 | 3 / 5 | 4 / 5 |
Distribuidora | |||
Duração do filme | |||
119 minuto(s) |
Dirigido por Sam Mendes. Com: Leonardo DiCaprio, Kate Winslet, Michael Shannon, David Harbour, Richard Easton, Kathryn Hahn, Dylan Baker, Jay O. Sanders, Zoe Kazan, Kathy Bates.
Ao escrever sobre O Curioso Caso de Benjamin Button, apontei as preocupantes semelhanças entre aquele filme e Forrest Gump – algo que se tornava ainda mais relevante ao considerarmos que ambos haviam sido escritos pelo mesmo roteirista, Eric Roth. Pois algo parecido me veio à mente ao assistir a este Foi Apenas um Sonho, cuja análise impiedosa das contradições entre a aparência idílica do american way of life do subúrbio e a crua realidade subjacente remete diretamente a Beleza Americana, primeiro longa de seu diretor, Sam Mendes. E, do ponto de vista temático, o cineasta faz realmente o mesmíssimo filme, embora, aqui, decepcione por acabar não fazendo jus ao magnífico livro de Richard Yates no qual se inspirou, mesmo mantendo-se bastante fiel a este.
Contando com a vantagem comercial de reunir o casal protagonista da produção que mais arrecadou em todos os tempos (além da coadjuvante Kathy Bates), Titanic, o roteiro de Foi Apenas um Sonho já nos apresenta a Frank (DiCaprio) e April Wheeler (Winslet, esposa de Mendes na vida real) quando estes já têm alguns anos de casamento (a cena na qual eles se conhecem dura pouco mais de um minuto) – e logo percebemos, pela forma com que conversam e até mesmo pela distância que mantêm um do outro enquanto caminham, que o relacionamento encontra-se
De certa forma, Frank e April podem ser considerados como uma versão mais jovem dos deprimentes George e Martha de Quem Tem Medo de Virginia Woolf? (interpretados por Richard Burton e Elizabeth Taylor na versão dirigida por Mike Nichols em 1966) – embora, aqui, a constante troca de insultos e de ataques extremamente cruéis seja fruto das angústias existenciais e das decepções mútuas, e não de um ódio recíproco (ainda que eles estejam claramente caminhando nesta direção). Além disso, falta a Frank e April a erudição ou simplesmente a inteligência para que seus insultos se aproximem da qualidade literária das ofensas trocadas por George e Martha – o que, curiosamente, não deixa de reforçar a tão temida mediocridade do casal. Tristes, cansados e solitários, Frank e April são amaldiçoados pela inquietude daqueles que se julgam destinados a grandes feitos e, portanto, é parte de sua tragédia que eles não tenham a inteligência ou a iniciativa para ao menos tentarem compreender que grande “destino” é este que pretendem alcançar.
Aliás, é justamente a capacidade que têm de sonhar que compromete de vez a estabilidade do casal: brevemente em sintonia, felizes e esperançoso com a idéia de uma possível fuga, eles parecem finalmente prestes a alcançar uma utópica liberdade de suas amarras sociais – e não é à toa que o casal vizinho aos Wheeler parece tão abalado e ofendido com a notícia da viagem: quando Milly (Hahn) chora ao falar sobre a viagem dos “amigos”, está lamentando, na realidade, sua própria incapacidade de fugir (e quando comemora ao perceber que Paris talvez permaneça apenas nos sonhos de April, está, de fato, em júbilo com o retorno de sua companheira de cela). Como se não bastasse, os Wheeler ainda são obrigados a confrontar a própria fraqueza através dos comentários do instável matemático John Givings, que, saído de um sanatório, encontrou sua própria forma de liberdade ao abraçar o rótulo de insano – e Michael Shannon cria, em apenas três cenas, um personagem que, em sua aparente loucura, mostra-se o mais lúcido de todos ao dissecar, certeira e cruelmente, o cadáver do casamento de Frank e April.
Vale dizer, aliás, que as atuações vistas
Conformistas (por comodismo ou pressão) num mundo que valoriza este traço e condena a imprevisibilidade, os Wheeler ainda têm o azar de morar numa rua cujo nome (Caminho Revolucionário) parece ridicularizá-los – e esta alfinetada, melhor trabalhada no livro, aqui surge apenas como um simbolismo sem qualquer sutileza, o que é lamentável. Da mesma maneira, é decepcionante perceber como Mendes e o roteirista Justin Haythe (Refém de uma Vida) suavizam o horror daquelas brigas ao sempre manterem os filhos do casal fora da equação, como se não existissem ou jamais testemunhassem as brigas pavorosas dos pais.
Fotografado com beleza pelo sempre competente Roger Deakins (que também salienta o clima claustrofóbico daquela relação ao sempre retratar as paredes se fechando sobre o casal), Foi Apenas um Sonho é terrivelmente prejudicado em função da abordagem distanciada e excessivamente racional de Mendes, que parece estar sempre julgando e condenando seus personagens. Assim, embora possamos até compreender as razões de Frank e April, toda aquela gritaria, retratada com um claro repúdio pelo diretor, acaba impedindo nosso investimento emocional na narrativa, levando-nos a analisar os Wheeler em vez de sentirmos sua dor, transformando-os, com isso, em apenas duas criaturas desagradáveis e presunçosas - e nem mesmo a riqueza temática do plano final é capaz de reverter esta problemática, mas inevitável impressão.
Observação: Zoe Kazan, que interpreta a secretária que flerta com DiCaprio, é filha de Robin Swicord, co-autora do argumento de O Curioso Caso de Benjamin Button. Coincidência boba mesmo se considerarmos o primeiro parágrafo deste texto, claro, mas que achei curiosa.
30 de Janeiro de 2009
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