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Críticas por Pablo Villaça

Datas de Estreia: Nota:
Brasil Exterior Crítico Usuários
09/02/2007 01/01/1970 5 / 5 / 5
Distribuidora
Duração do filme
90 minuto(s)

Antônia
Antônia

Dirigido por Tata Amaral. Com: Negra Li, Cindy, Quelynah, Leilah Moreno, Chico Andrade, Sandra de Sá, Nathalye Cris, Ezequiel da Silva, Thobias da Vai-Vai, Giulio Lopes, Fernando Macário, Thaíde.

Um grupo musical formado por jovens mulheres negras de origem humilde que precisam lutar contra vários preconceitos em sua trajetória profissional:  Dreamgirls – Em Busca de um Sonho? Não, muito melhor: Antônia, novo longa de Tata Amaral, que deixa o filme de Bill Condon no chinelo. Sem qualquer afetação ou delírios de grandeza (como a produção norte-americana), esta produção brasileira conta sua história de maneira simples, mas tremendamente eficaz, demonstrando que cenários grandiosos, figurinos milionários e um elenco estelar não são pré-requisitos para se criar um musical bem sucedido.

Adotando um estilo quase documental, com a câmera sempre em movimento e abundância de cortes secos, Antônia acompanha Preta (Negra Li), Barbarah (Leilah Moreno), Lena (Cindy) e Mayah (Quelynah), quatro amigas de infância que sonham em viver da música. Atuando como coro de um grupo de rap masculino, elas são descobertas por um pequeno empresário, Diamante (Thaíde), e passam a se apresentar em pequenos eventos com seu próprio grupo – o “Antônia” do título. Escrito pela própria Tata Amaral ao lado de Roberto Moreira, o roteiro passa a se concentrar na dinâmica entre as quatro mulheres e nas dificuldades que estas enfrentam rumo à realização artística e profissional.

E que dificuldades: moradoras de uma região extremamente pobre e violenta, as amigas devem se desvencilhar das amarras da miséria que conspiram contra sua ascensão – e elas nem sequer se espantam muito quando, depois de retornarem de uma festa luxuosa na qual se apresentaram, encontram o corpo ensangüentado de um homem no caminho, como se reconhecessem que isto é algo já esperado em seu triste cotidiano. Aliás, o fotógrafo Jacob Solitrenik (Bellini e a Esfinge, Quase Dois Irmãos) explora de maneira eficaz as locações para ilustrar esta realidade sufocante, mergulhando a câmera nos caminhos sinuosos do morro e revelando, com um visual adequadamente granulado, as condições freqüentemente miseráveis nas quais as personagens vivem em suas casas com paredes de reboco exposto. Além disso, a falta de estrutura econômica e social também se reflete nos demais problemas enfrentados pelas garotas, como a gravidez indesejada de uma, as dificuldades de outra para criar a filha pequena e os encontros de uma terceira com a Lei – e é claro que tantos contratempos acabam interferindo no relacionamento das amigas que, com maior ou menor razão, se entregam a brigas que tornam ainda mais difícil o sucesso de seu grupo musical.

Preparado pelo sempre genial Sérgio Penna, o elenco de Antônia é simplesmente admirável: as jovens e inexperientes atrizes, em particular, encarnam seus papéis com uma naturalidade impressionante, aumentando a sensação de estarmos, de fato, assistindo a um documentário – algo ressaltado pelo fato de que, em diversos momentos, as garotas olham para a câmera, como se reconhecessem sua presença (apesar disso, em um momento ou outro sentimos uma notinha falsa de “improviso roteirizado”, especialmente quando este parte de Cindy, que está um degrauzinho abaixo de suas companheiras). Da mesma forma, o empresário Marcelo Diamante vivido por Thaíde é sempre divertidíssimo em suas intervenções, sendo beneficiado ainda pelo imenso carisma do ator (que, aliás, me lembrou muito Spike Lee).

Mas não menos importante para um projeto que se propõe a abordar a carreira de cantoras talentosas é o fato de que as quatro atrizes têm vozes inegavelmente poderosas – algo que Tata Amaral explora com eficiência. Em certo momento, por exemplo, um sujeito que contratou as moças começa a cantar Killing Me Softly para a namorada, sendo acompanhado desajeitadamente pelo grupo. Por alguns segundos, a cena cambaleia, hesitante, e esperamos um número musical pavorosamente ruim – até que as cantoras encontram a harmonia, culminando numa apresentação belíssima e profissional.

Comovente e divertido, Antônia é construído a partir de pequenos momentos como este, que ajudam a levar o espectador para o universo das protagonistas, que se tornam reais de uma maneira intensa e admirável. Aliás, isto só é possível porque a cineasta sempre encontra tempo para interromper a narrativa a fim de acrescentar cenas que, embora periféricas à trama principal, servem justamente para desenvolver estas personagens – e um exemplo magnífico pode ser encontrado na conversa que Preta mantém com a filha Emília (a encantadora Nathalye Cris) depois que esta acorda assustada em função de um pesadelo. Ao ouvirmos o que a pequena desejaria em um mundo ideal (“Que chuva não derrubasse casa; que papai não brigasse com mamãe; que tivesse chocolate todo dia.”), não apenas compreendemos ainda mais o que está em jogo para aquela jovem mãe, que deseja uma vida melhor para a filha, como nos sentimos tocados pela oportunidade de testemunharmos um momento tão íntimo e doce entre duas personagens com as quais passamos a nos importar tanto.

10 de Fevereiro de 2007

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Pablo Villaça, 18 de setembro de 1974, é um crítico cinematográfico brasileiro. É editor do site Cinema em Cena, que criou em 1997, o mais antigo site de cinema no Brasil. Trabalha analisando filmes desde 1994 e colaborou em periódicos nacionais como MovieStar, Sci-Fi News, Sci-Fi Cinema, Replicante e SET. Também é professor de Linguagem e Crítica Cinematográficas.

 

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