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Críticas por Pablo Villaça

Datas de Estreia: Nota:
Brasil Exterior Crítico Usuários
04/01/2008 29/09/2007 2 / 5 4 / 5
Distribuidora
Duração do filme
91 minuto(s)

Viagem a Darjeeling
The Darjeeling Limited

Dirigido por Wes Anderson. Com: Owen Wilson, Jason Schwartzman, Adrien Brody, Amara Karan, Wallace Wolodarsky, Irfan Khan, Barbet Schroeder, Bill Murray, Anjelica Huston, Natalie Portman.

 

É triste dizer isso, mas acho que estou ficando cansado de Wes Anderson – e foram precisos apenas quatro filmes para que isto acontecesse. Se anteriormente seu estilo característico parecia contribuir de maneira fundamental para o desenvolvimento da história e de seus personagens (especialmente em Os Excêntricos Tenenbaums), desta vez a impressão clara que tive ao sair do cinema foi a de que o interesse em manter suas marcas registradas visuais (que discutirei adiante) se tornou mais importante para o cineasta do que o esforço em adequá-las às necessidades narrativas. Num caso clássico de “estilo x substância”, Anderson parece acreditar que o fundamental não é ter algo a dizer, mas sim dizer qualquer bobagem de maneira atraente – e, lamentavelmente, a artificialidade evocada por suas opções estilísticas cobra um preço caro em Viagem a Darjeeling.

 

Escrito por Anderson ao lado do ator Jason Schwartzman e do primo deste último, Roman Coppola (filho de Francis Ford), o filme já começa com uma divertida piada interna, quando vemos Bill Murray, parceiro do cineasta em seus três trabalhos anteriores, correndo desesperadamente para pegar o trem que inspira o título original do longa (The Darjeeling Limited) – e, falhando em sua tarefa, Murray fica também de fora da história, que se concentra nos irmãos Francis (Wilson), Peter (Brody) e Jack (Schwartzman). Distantes uns dos outros desde a morte do pai, há um ano, eles se reúnem para uma viagem através da Índia organizada pelo primeiro, que, mais velho dos três, acredita ser sua responsabilidade promover uma jornada espiritual que volte a aproximá-los. No entanto, é claro que a primeira coisa que fazem ao desembarcar na primeira estação é entregarem-se ao consumismo, o que já prenuncia o fracasso da empreitada, que se torna marcada por brigas e confusões inacreditáveis.

 

Mais uma vez demonstrando seu bom (e particular) gosto para a seleção de músicas que acompanham – e comentam – suas histórias, Anderson faz a interessante opção de resgatar diversos exemplares das trilhas utilizadas nos filmes do falecido cineasta indiano Satyajit Ray, um dos mais importantes da história de seu país. Além disso, Anderson mantém sua predileção pelos elegantes enquadramentos fortemente centralizados que dominam sua filmografia e que encontram um equilíbrio admirável com seus freqüentes travellings e os ótimos planos conjuntos em câmera lenta. Da mesma forma, a óbvia predileção do diretor por cores fortes encontra um reflexo ideal no país que hospeda a trama, já que a multicolorida Índia oferece ao filme uma gama inacreditável de tons – e, não surpreendentemente, a equipe investe principalmente no vermelho, no laranja e no amarelo (com o branco vindo em quarto lugar), já que, no passado, estes também se mostraram os favoritos do cineasta.

 

E já que citei o design de produção, é impossível ignorar o fabuloso trem criado para o filme e que, em determinado momento, assume sua natureza de microcosmo que reflete sensivelmente a diversidade de nossas experiências neste planeta ao mesmo tempo em que ilustra a realidade inegável de que, diferentes como somos, estamos juntos na mesma jornada (neste sentido, superando até mesmo o magnífico submarino concebido para A Vida Marinha de Steve Zissou, longa anterior de Anderson).

 

Não, definitivamente o problema de Viagem a Darjeeling não diz respeito à sua plástica, mas ao fato de que esta não encontra reflexo na narrativa. Embora tente resgatar o mesmo senso de humor melancólico de seus demais trabalhos (e que funcionam em alguns momentos), o diretor falha ao apelar para metáforas visuais primárias, como ao mostrar os irmãos descartando as bagagens que os oprimiam (mais uma vez, o plano é lindo, mas arrogante em sua obviedade). Para piorar, Anderson simplesmente não consegue encontrar o equilíbrio entre o drama e a comédia, algo que fizera exemplarmente em todos os seus filmes – e, assim, mesmo que aprecie a elegância estrutural de um funeral sendo empregado para encerrar o ciclo iniciado por outro funeral, não posso deixar de reconhecer que o peso da morte de uma criança dilui consideravelmente a importância das crises de identidade pequeno-burguesas dos protagonistas, enfraquecendo, conseqüentemente, o longa como um todo.

 

Para encerrar, há a questão óbvia de que Wes Anderson vem desenvolvendo praticamente os mesmo temas há cinco filmes, já que suas histórias sempre giram em torno de personagens em fuga (de si mesmos e do mundo) e de conflitos entre pais (ou figuras paternas) e filhos. É claro que é perfeitamente possível criar toda uma filmografia inspirada em temas recorrentes (vide Hitchcock e suas mulheres frias e seus “homens errados”; Herzog e sua discussão eterna sobre “Homem x Natureza”; ou Spielberg e seus pais ausentes), mas, a menos que o realizador encontre formas diferentes de abordar estes assuntos ou coisas novas a dizer, a repetição inevitavelmente se tornará cansativa para aqueles que acompanham sua obra. E isto, infelizmente, é o que está ocorrendo com Anderson.

 

E talvez seja por isto que seu curta Hotel Chevalier, que precede Viagem a Darjeeling, seja infinitamente mais eficaz que o longa: se for para mergulhar num universo esteticamente fascinante que não tenha muita coisa a dizer, é preferível fazê-lo em doses menores.

 

23 de Novembro de 2007

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Pablo Villaça, 18 de setembro de 1974, é um crítico cinematográfico brasileiro. É editor do site Cinema em Cena, que criou em 1997, o mais antigo site de cinema no Brasil. Trabalha analisando filmes desde 1994 e colaborou em periódicos nacionais como MovieStar, Sci-Fi News, Sci-Fi Cinema, Replicante e SET. Também é professor de Linguagem e Crítica Cinematográficas.

 

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