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Críticas por Pablo Villaça

Datas de Estreia: Nota:
Brasil Exterior Crítico Usuários
09/04/2010 01/01/1970 2 / 5 / 5
Distribuidora

Caso 39
Case 39

Dirigido por Christian Alvart. Com: Renée Zellweger, Jodelle Ferland, Ian McShane, Bradley Cooper, Kerry O’Malley, Callum Keith Rennie, Adrian Lester, Cynthia Stevenson.

O que houve com Renée Zellweger? Depois de estourar em 1996, com Jerry Maguire, quando surgiu absolutamente adorável, a atriz demonstrou enorme potencial em obras como O Diário de Bridget Jones e Enfermeira Betty, culminando em sua bela performance (embora empalidecida diante de Catherine Zeta-Jones) em Chicago. Desde então, porém, Zellweger parece ter assumido o compromisso de se tornar uma intérprete artificial e mesmo irritante, ajudando a destruir filmes terríveis como O Diário de Bridget Jones 2, A Luta pela Esperança e, claro, Cold Mountain, quando ainda conseguiu vencer o Oscar por uma atuação absurdamente caricata. Entregando-se cada vez mais a uma voz infantilizada que parece mais condizente com a de um garotinho que inalou hélio do que com a de uma mulher adulta, a moça agora tenta se reinventar ao investir num gênero que ajudou tantas atrizes em decadência: o terror. E o resultado é realmente amedrontador – mas pelas razões erradas.

Escrito por Ray Wright, Caso 39 traz Zellweger como Emily Jenkins, uma assistente social que, depois de salvar a garotinha Lillith (Ferland) dos pais que queriam matá-la, resolve oferecer seu lar para a menina, que, claro, logo revela ser uma criatura bastante diferente da vítima inocente imaginada pela heroína. Renunciando a qualquer vestígio de vida pessoal a fim de se dedicar ao trabalho, Emily é uma mulher incrivelmente bondosa – algo que o roteiro ilustra ao trazê-la conversando com a foto de Lillith que se encontra em seu arquivo. Eventualmente, porém, a bondade da protagonista é substituída por medo e rancor (talvez por isso ela pare de conversar com fotografias) à medida que ela conclui ter sido manipulada pela criança. Moral da história? Espírito de caridade é para imbecis.

Trabalhando num departamento repleto de idiotas (reparem como seu chefe, vivido por Adrian Lester, interroga a menina com a janela aberta, permitindo, em teoria, que esta seja ameaçada pelo olhar do pai), Emily também não é uma figura das mais brilhantes, tomando uma série de atitudes ao longo da narrativa que levam o espectador a questionar não só sua competência profissional, mas seu intelecto – como, por exemplo, ao levar dois dias para descobrir – e mesmo assim, somente ao ser informada por um amigo - que alguém roubou seu celular a fim de utilizá-lo para chamadas sombrias, o que não deixa de ser curioso se considerarmos a importância do telefone para o desempenho de suas funções.

Abarrotado de clichês não só em seu roteiro, mas também em sua direção, Caso 39 é o tipo de filme em que a todo instante alguém parece surgir do nada apenas para assustar a heroína, o que ultrapassa a fronteira do ridículo na cena em que, ao conversar com Lillith em seu escritório, Emily é surpreendida pela batida de seu interesse romântico Douglas (Cooper) na divisória de seu cubículo – e embora o diretor Christian Alvart filme a mão de Cooper num plano-detalhe, o fato é que a protagonista deveria ter sido perfeitamente capaz de vê-lo se aproximar, já que a tal divisória é relativamente baixa (a não ser, claro, que ele tenha se rastejado até o local apenas para assustá-la, o que o transformaria num completo babaca). Já em outro momento, Alvart tenta criar uma atmosfera inquietante ao trazer Zellweger assistindo à fita de um depoimento da mãe de Lillith – ao final do qual a mulher, com uma expressão maligna, olha diretamente para a câmera, como se sabendo que Emily estava do outro lado do monitor. Ainda assim, esses exemplos se tornam bobos se comparados ao instante inacreditável em que a heroína vasculha o quarto de Lillith e segura um velho despertador com as duas mãos, encarando-o, sabe-se lá por que, com grande intensidade – e é claro que ela se assusta quando o objeto começa a tocar naquele exato segundo.

Mas se Emily se revela uma criatura lerda (eufemismo), ao menos sua antagonista faz jus ao seu Q.I., apresentando-se como (e não leia o restante deste parágrafo caso não tenha visto o trailer do filme) um dos demônios mais estúpidos que o gênero já produziu, já que basta cair no sono para ficar completamente à mercê de seus inimigos, que podem carregá-lo por vários metros, depositá-lo no interior de um fogão a gás e ligar as chamas sem que ele desperte. Além disso, de que adianta se apresentar como uma menina inocente se logo ele fará questão de ameaçar ostensivamente até mesmo aqueles que, completamente ludibriados, querem apenas protegê-lo?

Por outro lado, é preciso reconhecer o bom trabalho do designer de produção John Willett, que salienta o tom opressivo e ameaçador da casa dos Sullivan ao conceber quartos pequenos e claustrofóbicos que se tornam ainda mais sombrios em função dos tristes papéis de parede e das manchas de sujeira espalhadas pelas portas – além, claro, dos onipresentes crucifixos que, além disso, remetem à natureza religiosa da trama. Estes ambientes se contrapõem de forma eficiente aos espaços mais abertos e iluminados da casa de Emily que, ainda assim, surge corretamente triste e sem vida, refletindo a solidão da protagonista. Em contrapartida, é estranha, a insistência do diretor Christian Alvart de criar recorrentes planos que, iniciando num ângulo alto, logo descem para revelar os rostos dos personagens, já que estes movimentos de câmera parecem gratuitos e não conseguem estabelecer nem mesmo uma rima temática coerente ao longo da projeção. E o que dizer do instante no qual Emily, ao conversar com o pai de Lillith, solta uma risada gratuita que imediatamente desaparece quando o montador Mark Goldblatt corta para um plano mais fechado no rosto da atriz?

Seja como for, não deixa de ser curioso que, depois de dirigir os esquecidos A Curiosidade e o Gato e Anticorpos em sua Alemanha natal, o cineasta Christian Alvart finalmente tenha conseguido se estabelecer em Hollywood ao lançar dois filmes no mesmo ano. Pena que estes tenham sido Caso 39 e a bomba Pandorum. Nasce uma estrela cadente.

10 de Abril de 2010

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Pablo Villaça, 18 de setembro de 1974, é um crítico cinematográfico brasileiro. É editor do site Cinema em Cena, que criou em 1997, o mais antigo site de cinema no Brasil. Trabalha analisando filmes desde 1994 e colaborou em periódicos nacionais como MovieStar, Sci-Fi News, Sci-Fi Cinema, Replicante e SET. Também é professor de Linguagem e Crítica Cinematográficas.

 

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