Datas de Estreia: | Nota: | ||
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Brasil | Exterior | Crítico | Usuários |
22/02/2008 | 01/01/1970 | 4 / 5 | 4 / 5 |
Distribuidora | |||
Duração do filme | |||
100 minuto(s) |
Dirigido por David Cronenberg. Com: Viggo Mortensen, Naomi Watts, Vincent Cassel, Armin Mueller-Stahl, Jerzy Skolimowski.
Senhores do Crime poderia perfeitamente ter se revelado um thriller absolutamente convencional caso não tivesse, a seu favor, dois elementos importantíssimos: a direção segura e intrigante de David Cronenberg e, claro, a performance hipnótica de Viggo Mortensen.
Escrito por Steven Knight, o filme tem início com duas cenas perturbadoras: a execução sangrenta de um sujeito em uma barbearia e o desmaio (igualmente sangrento) de uma jovem prostituta em estágio adiantado de gestação. Encaminhada ao hospital, ela morre ao dar à luz, deixando a parteira Anna (Watts) comovida com a situação do bebê órfão. Decidida a encontrar alguma pista que possa revelar o paradeiro dos parentes da criança, a moça leva o diário da prostituta, escrito em russo, para que seu tio, também imigrante, o traduza. No entanto, depois de visitar um restaurante que talvez tivesse alguma ligação com a garota morta, Anna desperta a atenção do sombrio Semyon (Mueller-Stahl), cuja aparência bondosa oculta uma natureza violenta e impiedosa. Chefe local da Vory v Zakone (similar russa da Cosa Nostra e da Yakuza), Semyon teme que o diário o comprometa e decide resgatá-lo, contando para isso com a ajuda de seu filho Kirill (Cassel) e do chofer e guarda-costas deste, o misterioso Nikolai (Mortensen).
Voltando a demonstrar interesse pelo submundo do crime em Londres e pela complexa relação dos imigrantes com aquele universo, como já fizera no ótimo Coisas Belas e Sujas, o roteirista Steven Knight desta vez aposta numa trama menos elaborada, que aposta mais na dinâmica entre os personagens do que em reviravoltas – embora estas também existam aqui. Assim, o filme retrata Semyon como uma espécie de Don Corleone muito menos ético (ou inteligente), concentrando-se em sua clara insatisfação com o filho (e sucessor), que julga fraco e pouco confiável, pesando em sua opinião, também, uma clara desconfiança acerca das tendências homossexuais do sujeito (algo imperdoável para alguém como Semyon, obviamente). Aliás, a própria relação de Kirill com Nikolai é repleta de ambigüidade: ao mesmo tempo em que demonstra confiança no amigo, Kirill não hesita em tratá-lo como um empregadinho qualquer, sentindo clara satisfação por aparentemente dominar aquela criatura tão perigosa.
E “perigoso” é um eufemismo ao descrevermos Nikolai: adotando uma caracterização marcante que não abre espaço para sutilezas, tornando-se ainda mais fascinante por sua grandiosidade, Viggo Mortensen mais uma vez se transforma, evidenciando sua queda pelo method acting advogado por intérpretes que vão de Marlon Brando a Edward Norton, passando por Dustin Hoffman, De Niro, Pacino e Meryl Streep. Assim, o sotaque carregado, o corte de cabelo estilizado e as inúmeras e extensas tatuagens tornam-se símbolos da personalidade de seu personagem, assim como seus maneirismos atípicos (exemplificados pela cena
Mas não é só: o brilhantismo de sua performance surge, também, na maneira sutil com que sugere algo de decente no caráter de Nikolai: quando pergunta o nome real de uma prostituta, por exemplo, ele indica um interesse curioso e aparentemente incompatível com um indivíduo que até então víramos como alguém terrivelmente frio e cruel – e isto cria um contraponto interessante com a performance de Armin Mueller-Stahl, que faz o caminho oposto, apresentando Semyon como um senhor gentil que gradualmente se revela como monstro. E se Vincent Cassel acrescenta mais um tipo fraco de caráter e antipático à sua galeria de personagens, Naomi Watts também não precisa se esforçar muito para transformar Anna em uma mulher decente que se descobre mergulhada numa situação para a qual não estava preparada.
Construindo um clima de inquietação que mantém o espectador sempre inseguro com relação ao que vem a seguir, o cineasta David Cronenberg não decepciona os fãs, criando momentos explosivos de violência súbita que chocam pela crueza e por sua natureza gráfica. Ao mesmo tempo, a fotografia mergulhada em sombras de Peter Suschitzky, seu antigo parceiro, contribui para transformar Senhores do Crime numa experiência corretamente desconfortável para o público – e a cena de luta na casa de banhos é, desde já, uma referência do gênero, já que a vulnerabilidade de Mortensen é realçada não apenas por sua nudez, mas também pela coreografia realista e pela montagem seca e direta.
Estabelecendo uma rima narrativa curiosa com os desfechos de alguns dos melhores filmes de 2007, como Onde os Fracos Não Têm Vez e Sangue Negro, o longa ainda investe numa conclusão que revela uma estranha ambigüidade por baixo de sua aparente adequação à convenção do “final feliz”, remetendo, também, ao belo final do trabalho anterior da dupla Cronenberg-Mortensen, Marcas da Violência. E considerando os resultados desta parceria, esperemos que ela se mantenha ainda por um bom tempo.
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