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Críticas por Pablo Villaça

Datas de Estreia: Nota:
Brasil Exterior Crítico Usuários
27/01/2006 07/09/2005 4 / 5 / 5
Distribuidora
Duração do filme
90 minuto(s)

Direção

Hany Abu-Assad

Elenco

Kais Nashef , Ali Suliman , Lubna Azabal , Amer Hlehel , Hiam Abbass

Roteiro

Hany Abu-Assad

Produção

Bero Beyer , Amir Harel

Fotografia

Antoine Héberlé

Música

Jina Sumedi

Montagem

Sander Vos

Design de Produção

Olivier Meidinger

Figurino

Walid Mawed

Direção de Arte

Bashir Abu Rabi'a

Paradise Now
Paradise Now

Dirigido por Hany Abu-Assad. Com: Kais Nashef, Ali Suliman, Lubna Azabal, Amer Hlehel, Hiam Abbass.

O que leva uma pessoa a amarrar explosivos no próprio corpo e detoná-los com o objetivo de destruir o que (ou quem) quer que seja? Sem entrar nos `méritos` da questão (se é que estes existem quando estamos falando de atentados terroristas), como é possível que fins políticos, econômicos e/ou religiosos – principalmente estes últimos! – levem alguém a provocar a morte de outros seres humanos, na maior parte das vezes civis que nem sequer têm o poder de mudar o que quer que seja? Sei que estou soando ingênuo ao fazer estas perguntas, já que estas se respondem sozinhas: porque querem alcançar, precisamente, os tais fins políticos, econômicos e/ou religiosos. No entanto, é impossível deixar de se espantar com a idéia de que, no final das contas, estamos falando de homens e mulheres como eu e você, indivíduos que decidem abrir mão da própria existência por uma causa e que, no processo, levam também as vidas de inúmeras outras pessoas.

Em Paradise Now, dirigido por Hany Abu-Assad e escrito por este ao lado de Bero Beyer e Pierre Hodgson, conhecemos dois amigos de infância, Said (Nashef) e Khaled (Suliman), que trabalham em uma oficina mecânica situada em uma pequena cidade próxima a Tel Aviv. Jovens e com pouca coisa a fazer, eles passam a maior parte do tempo conversando, rindo, se drogando e bebendo chá. Ao reencontrar uma antiga conhecida, Suha (Azabal), Said desenvolve um interesse pela moça e um princípio de romance surge subitamente. E é então que Said e Khaled são procurados por um integrante de um grupo palestino extremista e informados de que foram selecionados para realizar um atentado suicida na capital israelense.

É neste instante que Paradise Now revela a inteligência de sua narrativa: ao longo de todo o primeiro ato da história, fomos apresentados a dois rapazes absolutamente comuns que poderiam ter qualquer nacionalidade ou religião, fugindo de qualquer estereótipo do `fanático terrorista` com o qual podemos estar habituados. E, apesar disso, somos obrigados a reconhecer que, de fato, eles vêm se preparando há anos para uma missão daquelas e, assim, não hesitam em aceitá-la. Por que estão dispostos a morrer? Eles certamente não parecem obcecados pela causa palestina ou particularmente revoltados com a política de Israel – ao menos, não a ponto de discutirem o assunto com a paixão que poderíamos esperar. Estariam eles interessados nas `recompensas divinas` que supostamente estão destinadas a todos os mártires daquela causa, incluindo as virgens que se entregarão a eles no paraíso? Em parte, sim, mas Said e Khaled também têm seus motivos particulares, mais racionais, para embarcarem na empreitada – o que é fundamental, já que nem mesmo seus líderes parecem convencidos de que as tais promessas se realizarão: quando Khaled pergunta se eles `têm certeza de que dois Anjos virão buscá-los` depois da explosão, o ativista que os instrui responde positivamente, mas, em seguida, batuca nervosamente no painel do carro, denotando uma incerteza reveladora.

Conferindo tensão crescente ao filme, Abu-Assad retrata o nervosismo que toma conta de uma região em constante conflito: quando Suha se aproxima de um posto ocupado por oficiais israelenses, ainda no começo da projeção, todos se mostram ansiosos, já que qualquer pessoa, por mais inocente que pareça, pode estar carregando uma bomba pronta para ser detonada. E, ainda que assuma claramente a defesa da causa palestina, argumentando que a própria forma de ocupação determina o tipo de resistência encontrada, o cineasta deixa clara sua reprovação ao terrorismo através da personagem de Azabal, que critica os extremistas que, com seus atentados revoltantes, acabam boicotando formas alternativas de negociação com Israel e o mundo ocidental. Ainda assim, Abu-Assad não deixa de fazer uma crítica final ao Estado judeu ao mostrar o contraste entre o luxo de Tel Aviv e a miséria da pequena cidade palestina na qual a maior parte da história se passa.

Estas ressalvas, no entanto, são pontuais e apenas complementam o verdadeiro tema de Paradise Now, que é a trajetória de homens comuns rumo ao absurdo do ataque suicida. Para isso, acompanhamos toda a cerimônia de preparação de Said e Khaled, que combina elementos religiosos e políticos, como a gravação de mensagens para a família e a imprensa. Neste ponto, Abu-Assad volta a destruir qualquer caráter grandioso que o processo possa apresentar ao incluir pequenos momentos de humor nos quais vemos os protagonistas cometendo erros durante os discursos ou mesmo enviando recados absolutamente prosaicos para os parentes – uma forma interessante de lembrar o espectador de que, apesar do que estão prestes a fazer, aqueles `mártires` são humanos e comuns.

É uma pena que, no terceiro ato, o roteiro abandone o bom estudo de personagens e se transforme em um exercício de estilo, com Abu-Assad brincando de filme de gênero ao buscar o suspense através do desencontro acidental dos dois amigos. De todo modo, a longa seqüência acaba servindo para ilustrar importantes mudanças de atitude de Said e Khaled, fortalecendo a decisão de um e enfraquecendo o ímpeto do outro de maneira curiosa e, em certo aspecto, inesperada.

Lançado no Brasil na mesma semana em que Munique chega aos cinemas, Paradise Now aborda temas similares ao filme de Steven Spielberg (e também encontra ecos no excelente Syriana, ainda inédito por aqui), questionando a lógica cruel da política `olho por olho` e o ciclo interminável de violência originado por esta. E é no mínimo justo que, além do trabalho comandado por um cineasta judeu, possamos também acompanhar o contraponto apresentado por um realizador palestino. É o mundo que ganha com isso.
``

28 de Janeiro de 2006

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Pablo Villaça, 18 de setembro de 1974, é um crítico cinematográfico brasileiro. É editor do site Cinema em Cena, que criou em 1997, o mais antigo site de cinema no Brasil. Trabalha analisando filmes desde 1994 e colaborou em periódicos nacionais como MovieStar, Sci-Fi News, Sci-Fi Cinema, Replicante e SET. Também é professor de Linguagem e Crítica Cinematográficas.

 

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