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Críticas por Pablo Villaça

Datas de Estreia: Nota:
Brasil Exterior Crítico Usuários
11/03/2011 01/01/1970 4 / 5 4 / 5
Distribuidora
Duração do filme
105 minuto(s)

Passe Livre
Hall Pass

Dirigido por Peter Farrelly e Bobby Farrelly. Com: Owen Wilson, Jason Sudeikis, Jenna Fischer, Christina Applegate, Stephen Merchant, Larry Joe Campbell, J.B. Smoove, Bruce Thomas, Tyler Hoechlin, Derek Waters, Alexandra Daddario, Nicky Whelan, Joy Behar, Alyssa Milano e Richard Jenkins.

Débi e Lóide, Kingpin – Os Reis do Boliche e Quem Vai Ficar com Mary? – qualquer diretor de comédias poderia se aposentar depois de comandar três longas como estes. Pois os irmãos Peter e Bobby Farrelly não só realizaram estas obras em seqüência como elas ainda representaram seus três primeiros esforços em longas-metragens. Assim, é até natural que em seguida tenha ocorrido uma queda vertiginosa na qualidade de seus projetos – e mesmo tendo alguns bons momentos, Eu, Eu Mesmo e Irene, Osmose Jones, O Amor É Cego, Ligado em Você, Amor em Jogo e Antes Só do Que Mal Casado jamais conseguem alcançar os resultados brilhantes daquele trio original de comédias. Felizmente, depois de inacreditáveis 13 anos, os Farrelly voltam à boa forma com este Passe Livre, que, mesmo inferior aos títulos que abrem este texto, é uma obra capaz de provocar o riso do início ao fim.

Escrito pelos cineastas ao lado de Pete Jones e Kevin Barnett, Passe Livre gira em torno dos amigos Rick (Wilson) e Fred (Sudeikis), que, embora casados com duas mulheres belas e interessantes, não conseguem evitar o velho hábito masculino de conferir os atributos físicos de todas as garotas nas proximidades. Habituadas a enxergar a atitude dos maridos como um esforço adolescente digno de pena, Maggie (Fischer) e Grace (Applegate) eventualmente se cansam e resolvem conceder uma licença para que os dois possam se entregar ao flerte descarado durante uma semana na esperança de que depois deste período eles finalmente compreendam a imaturidade representada por estes impulsos juvenis.

A partir daí, os cineastas usam as tentativas de conquistas dos enferrujados Rick e Fred como base para aquilo que se tornou uma especialidade em sua filmografia: a comédia de constrangimento. Mestres em explorar gags até o limite do desconforto, estendendo-as muito além do que qualquer um consideraria razoável (lembrem-se da cena no banheiro em Quem Vai Ficar com Mary?), os Farrelly aqui repetem a fórmula em momentos como aquele que traz Fred se masturbando no carro – e se a maioria dos diretores encerraria a piada com o sujeito sendo surpreendido por alguém, os realizadores provam que isto seria uma oportunidade perdida, transformando o embaraço do personagem num verdadeiro exercício de sadismo. Além disso, o roteiro investe com inteligência em personagens secundários que colorem o filme com suas peculiaridades, como a família de esnobes que inclui crianças sempre vestidas de forma idêntica aos pais e os amigos da dupla principal (entre eles, o sempre divertido Stephen Merchant, parceiro habitual de Ricky Gervais). Como se não bastasse, os Farrelly continuam a usar a escatologia de forma eficaz, como provam as cenas no campo de golfe e outra que se passa no banheiro de um hotel (e que ecoa aquela de Débi e Lóide).

Porém, o sucesso de Passe Livre reside na compreensão dos diretores de que os personagens devem ser tão importantes quanto as piadas – e assim como nos importávamos com a amizade de Harry e Lloyd, com a carência de Ted e com a persistência de Roy Munson, aqui simpatizamos com a dupla principal. Afinal, Rick e Fred, com seus empregos convencionais e entediantes, não passam de sujeitos comuns que experimentam o mesmo tipo de inquietação que acomete qualquer um a partir de certa idade (embora eles, claro, a manifestem de maneira absurda). Vivendo Rick com seu jeitão tranqüilo e boa-praça habitual, Owen Wilson forma uma dupla eficaz com Jason Sudeikis, que compõe Fred como um homem impulsivo e machista que em certo ponto faz um discurso sobre os “sonhos realizados femininos” que deverá deixar as mulheres da platéia com os cabelos em pé. Imaturos a ponto de serem tratados pelas esposas como adolescentes levados (como na cena em que parecem estar de castigo no banco de trás do carro), os dois se tornam queridos para o público justamente em função desta postura infantilizada que acaba suavizando as barbaridades que fazem – ou tentam fazer – ao longo da projeção.

Jamais exibindo qualquer sinal de evolução como diretores no que diz respeito à abordagem visual/estética do filme, Peter e Bobby Farrelly continuam a se manter apenas alguns degraus acima de Kevin Smith, outro cineasta que não consegue compreender a importância da câmera – e se saem em vantagem é porque ao menos sabem rodar um plano/contraplano com competência, algo que Smith não aprendeu até hoje. Além disso, se o diretor de O Império do Besteirol Contra-Ataca e do pavoroso Tiras em Apuros falha ao jamais estabelecer um ritmo cômico eficaz nestes desastres, os Farrelly, auxiliados pelo montador Sam Seig, acertam justamente no timing de suas gags, que oscilam entre as trocas rápidas de diálogos e os momentos em que justamente a pausa no lugar certo faz a diferença (vide o plano plongé que revela a dupla principal dormindo no hotel ou os closes que expõem os olhos vermelhos dos amigos). Como se não bastasse, é preciso admirar a sutileza de detalhes como a transição nos figurinos de Jenna Fischer, que inicia a projeção com roupas escuras e sóbrias apenas para chegar ao final com blusinhas mais coloridas e decotadas que refletem sua (re)descoberta pelo marido. E o que dizer da excepcional escalação de Richard Jenkins como o mulherengo Coakley, indo na contramão do typecasting habitual sofrido pelo ator?

Com um desfecho que consegue ser sentimental em vez de sentimentalóide (e que inclui um discurso simples e tocante de Wilson sobre a esposa e os filhos), Passe Livre toca ainda na verdade universal sobre nossa tendência de romantizar o passado em detrimento da inevitável imperfeição do presente – um tema que empresta coração e confere ressonância a um filme que, além de tudo, jamais deixa de divertir.

Observação: há cenas extras durante e após os créditos finais.

12 de Março de 2011

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Pablo Villaça, 18 de setembro de 1974, é um crítico cinematográfico brasileiro. É editor do site Cinema em Cena, que criou em 1997, o mais antigo site de cinema no Brasil. Trabalha analisando filmes desde 1994 e colaborou em periódicos nacionais como MovieStar, Sci-Fi News, Sci-Fi Cinema, Replicante e SET. Também é professor de Linguagem e Crítica Cinematográficas.

 

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