Datas de Estreia: | Nota: | ||
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Brasil | Exterior | Crítico | Usuários |
02/03/2007 | 01/01/1970 | 3 / 5 | 3 / 5 |
Distribuidora | |||
Em seus melhores momentos, Notas Sobre um Escândalo é um drama relativamente eficaz que consegue realizar um bom estudo de personagens ao mesmo tempo em que cria um suspense envolvente. Nos piores, parece uma versão de O Pentelho protagonizada por mulheres e com Judi Dench no lugar de Jim Carrey (e embora eu faça parte de uma minoria que gosta do filme de Ben Stiller, esta comparação certamente não agradaria ao diretor Richard Eyre, que obviamente tentou criar uma obra densa e sem concessões a qualquer tipo de humor).
Adaptado por Patrick Marber a partir do livro de Zoe Heller, o roteiro conta com a narração da amarga Barbara Covett (Dench), professora de História de um colégio britânico apenas mediano que, registrando seus pensamentos em dezenas de diários, não poupa seus colegas de magistério ou seus alunos de suas avaliações sempre rigorosas e desaprovadoras. Assim, quando uma nova professora de Arte, Sheba Hart (Blanchett), é contratada, Barbara imediatamente observa o efeito que a moça causa nos demais professores com sua beleza – um efeito ao qual ela mesma sucumbe rapidamente, tornando-se amiga e confidente da outra. Porém, quando descobre que Sheba está tendo um caso com um aluno de 15 anos de idade (Simpson), a velha professora percebe que pode usar aquilo em benefício próprio, já que se encontra claramente encantada (emocional e fisicamente) pela colega.
Dirigido com economia por Eyre, o filme é tecnicamente competente: a direção de arte consegue evocar a solidão e o espírito sombrio de Barbara através de seu apartamento tortuoso e de cores tristes, enquanto a relativa harmonia da família Hart é evocada por espaços amplos e tons claros. E se a trilha sonora de Philip Glass acaba cansando por sua insistência em comentar cada incidente da trama, a montagem de Antonia Van Drimmelen e do veterano John Bloom merece créditos por equilibrar com inteligência as seqüências com cortes mais rápidos e tensos e as cenas mais calmas que se concentram nas expressões e olhares dos personagens. Porém, assim como Closer, também escrito por Marber, Notas Sobre um Escândalo deposita suas forças nos diálogos ácidos e nas interpretações de seus atores – e, neste aspecto, não desaponta.
Como Barbara, Judi Dench mais uma vez comprova ser uma das atrizes mais completas da atualidade: através de sua narração feita com um tom de desprezo quase constante, ela estabelece o preconceito de classes de sua personagem (ela se refere quase com nojo à natureza burguesa de Sheba) e sua certeza de ser intelectualmente superior a todos que a cercam. No entanto, a curiosidade em seu olhar ao observar Sheba e sua expressão de alegria contida ao conversar com esta indicam que, apesar de seus comentários ácidos, Barbara está irremediavelmente atraída pela jovem colega. Sem ceder às vaidades tão comuns às atrizes acima dos 50 anos, Dench não faz a menor questão de esconder o rosto marcado pela idade; ao contrário, suas rugas e linhas de expressão são a evidência máxima de como as plásticas e o Botox comprometem terrivelmente o alcance dos atores (vejam Nicole Kidman, por exemplo, que vem gradualmente se transformando numa boneca de porcelana sem vida).
Mulher amarga e infeliz, Barbara aos poucos revela a dimensão perigosa de sua carência emocional, já que, sempre fantasiando a respeito da natureza de sua relação com Sheba, tem a tendência de encarar qualquer demonstração de frieza como uma traição a ser punida – algo que fica claro quando Dench lança um olhar magoado e raivoso à Blanchett depois que esta se nega a acompanhá-la a um determinado lugar. Porém, o momento mais fabuloso do filme (e que serve como prova incontestável da inteligência e do talento de Judi Dench) é aquele em que, paradoxalmente, Barbara mantém o rosto absolutamente impassível quando Sheba lhe pede para dormir em sua casa por alguns dias: embora saibamos perfeitamente o que aquilo significa para a velha professora (a realização de seus sonhos), seu auto-controle ao não permitir que a felicidade se manifeste externamente indica, para o espectador, como Barbara é perigosa. (Para ser mais preciso, no momento em que ouve o pedido, Dench permite que percebamos um leve brilho que surge nos olhos da personagem – e comunicar tanto apenas com a expressão do olhar é privilégio dos grandes atores.)
Enquanto isso, Blanchett, também uma excelente atriz, acaba sendo limitada pela forma descuidada com que Sheba é desenvolvida pelo roteiro de Marber, que nos oferece apenas alguns indícios ocasionais sobre o tumulto interno de sua personagem: sabemos que ela vive à sombra do brilhantismo do pai e que se casou muito jovem com um de seus professores, um homem vinte anos mais velho (o que se ajusta psicologicamente ao relacionamento que ela provavelmente tinha com o pai). De resto, contudo, Sheba surge como uma mulher impulsiva, inconseqüente e imatura cujas ações o filme encontra dificuldades para explicar – e confesso que a indicação de Blanchett ao Oscar por este papel me parece um exagero. Em contrapartida, Bill Nighy, como o conturbado marido de Sheba, deveria ter sido mais reconhecido pela forma intensa com que retrata toda a mágoa e a confusão de um homem que, depois de tantos anos, percebe que seus antigos receios sobre a juventude da esposa eram mais acurados do que gostaria de admitir.
Infelizmente, Notas Sobre um Escândalo acaba ruindo a partir do final do segundo ato, quando o roteirista Patrick Marber utiliza um clichê ofensivo para manter a narrativa andando – algo que não apenas irrita pela artificialidade como ainda foge completamente à lógica da personagem de Dench, que jamais seria tão descuidada a ponto de permitir que sua adorada Sheba descobrisse algo incriminador ao seu respeito. A partir daquele ponto, o filme se perde completamente, culminando num desfecho frágil e insatisfatório.
Se não fosse o talento de seu elenco (especialmente Dench), Notas Sobre um Escândalo seria um longa fácil de ignorar. Graças aos atores, no entanto, é um esforço fracassado, mas ainda assim com atrativos inegáveis.
08 de Março de 2007
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