Seja bem-vindx!
Acessar - Registrar

Críticas por Pablo Villaça

Datas de Estreia: Nota:
Brasil Exterior Crítico Usuários
16/02/2007 01/01/1970 1 / 5 / 5
Distribuidora
Duração do filme
94 minuto(s)

Turistas
Turistas

Dirigido por John Stockwell. Com: Josh Duhamel, Melissa George, Olivia Wilde, Desmond Askew, Beau Garrett, Max Brown, Agles Steib, Miguel Lunardi, Andréa Leal, Lucy Ramos, Diego Santiago, Julia Dykstra, Miguelito Acosta.

De acordo com o site Riobodycount, desde o último dia 1º. de fevereiro, nada menos do que 151 pessoas foram mortas e 76 ficaram feridas em função da violência no Rio de Janeiro: uma média de mais de 10 mortes diárias (maior do que a do Iraque em guerra, portanto). Há alguns dias, o garoto João Hélio, de seis anos de idade, foi arrastado ate à morte por um carro ocupado por marginais. E ainda há quem reclame da maneira sensacionalista com que a “Cidade Maravilha” é retratada pela produção norte-americana Turistas. Infelizmente, o fato é que a violência presente no filme é mínima se comparada à vida real – e, para piorar, a apresentação do Rio como uma cidade propícia para encontros sexuais casuais (leia-se: repleta de mulheres bonitas e fáceis) não é exclusividade do longa, já que esta imagem é propagada não apenas por nosso Carnaval como também por ações do governo no exterior para incentivar o turismo no país.

Não, não... Turistas pode ter vários problemas (e tem), mas pintar o Brasil de uma maneira absurda não é um deles, por mais deprimente que seja reconhecer isto. Sim, quando vemos um motorista de ônibus percorrer estradinhas em alta velocidade enquanto cospe pela janela, limpa o nariz e opera um câmbio enfeitado com um pentagrama, a caricatura é irritante, mas inofensiva. Quando o médico psicopata que surge como vilão da história explica que quer arrancar os órgãos dos gringos para enviá-los para hospitais locais, podemos até protestar que nenhuma instituição aceitaria este tipo de “contribuição” sem denunciar sua origem misteriosa, mas este é um aspecto sem grande importância no roteiro. Porém, quando os heróis (turistas norte-americanos) são drogados e roubados por nativos e não conseguem encontrar um único policial nas ruas, não nos resta alternativa a não ser reconhecer a veracidade da situação e comentar que eles até tiveram sorte por escaparem vivos (ao menos, até aquele momento). E no final das contas, é até um alívio constatar que os brasileiros vistos ao longo da projeção falam português e não o espanhol. Para ser sincero, minha maior preocupação com relação aos “danos” que este projeto pode trazer ao Brasil reside na inclusão do funk “Vidro Fumê” em sua trilha sonora – e rezemos todos para que o restante do mundo não aceite esta coisa como algo representativo de nossa música.

Obviamente inspirado no sucesso de público alcançado pelo moralmente desprezível O Albergue, este Turistas busca ser tão gráfico e repulsivo em sua forma de retratar a violência quanto aquele trabalho do sempre estúpido Eli Roth – e, em seus esforços para incluir o maior número possível de atos grotescos, o roteiro do estreante Michael Ross apela até mesmo para uma cena absurda em que o vilão mata um de seus capangas sem qualquer motivo no meio da rua, bem à vista de todos (mais uma vez, o problema não é a falta de verossimilhança da situação – eu mesmo já tive a infelicidade de testemunhar uma execução em Nova Iguaçu, há vários anos -, mas sim a falta de justificativa dramática para sua inclusão na narrativa). Da mesma forma, a queda de uma garota em um despenhadeiro (numa cena com péssimos efeitos visuais) surge mais como uma piada macabra do filme do que como algo orgânico à história. Já no restante do tempo, o roteirista segue apenas a mais velha das convenções moralistas do subgênero slasher: quem fizer sexo morrerá.

A identidade de vítimas e sobreviventes, no entanto, não faz a menor diferença, já que Turistas não demonstra grande preocupação em desenvolver seus personagens a ponto de permitir que o espectador seja capaz de diferenciá-los uns dos outros: há um mocinho, umas garotas loiras gostosinhas e dois britânicos que tentam atuar como alívio cômico – e já estou surpreso comigo mesmo por ter conseguido dividi-los em tantas categorias. Enquanto isso, o vilão nada ameaçador (vivido por Miguel Lunardi) conta com alguns capangas igualmente indiscerníveis entre si – e o único que ganha algum destaque é o índio (o que é perfeitamente natural, já que todos sabem que somos uma nação de indígenas). Aliás, o elenco brasileiro presente nesta produção é fraquíssimo, com exceção do simpático Agles Steib, que exibe uma boa presença como Kiko.

Curiosamente, em relação ao Q.I. de seus personagens, Turistas traça um retrato mais desfavorável aos norte-americanos, que surgem como criaturas admiravelmente estúpidas – basta dizer que quando um dos nativos presentes à festa na qual os gringos foram drogados surge do nada e sugere levá-los a uma cabana localizada no meio da floresta, estes aceitam acompanhá-lo sem qualquer restrição, numa exibição de boa fé (ou idiotice) alarmante. Na verdade, acredito que se alguém apontasse para um abismo e sugerisse que os tais turistas se atirassem ali, estes seguiriam a instrução desde que fossem assegurados de que aquilo seria algo “cool!”. Para a grande sorte dos mocinhos, porém, os vilões brasileiros conseguem ser ainda mais imbecis, o que possibilita que pelo menos alguém escape vivo.

Investindo em locações que ressaltam alternadamente as condições miseráveis de nosso país e as belezas naturais de nossas paisagens, o cineasta John Stockwell comprova sua obsessão por seqüências aquáticas (vide A Onda dos Sonhos e Mergulho Radical) ao incluir uma longa perseguição submarina que se revela absolutamente ridícula, já que traz um capanga “perseguindo” (a nado!) três dos heróis enquanto segura uma patética flechinha – e já que ninguém está usando tanques de oxigênio, todos têm que fazer repetidas visitas à superfície em busca de ar (em último caso, o oxigênio contido em bolhas nas superfícies rochosas servem como alívio provisório), o que torna tudo ainda mais maçante e patético. Aliás, Stockwell chega ao nível de Ed Wood ao incluir um momento no qual o vilão brasileiro se dirige ao seu capanga igualmente brasileiro e diz: “Eu sei para onde eles vão! Come with me!”, numa demonstração clara de que o diretor encara o público norte-americano como criaturas tão estúpidas quanto seus personagens.

Frustrante até mesmo para os fãs do gore (sangue e escatologia), Turistas apresenta uma estrutura narrativa composta por uma hora de enrolação, 15 minutos de violência e mais 15 de perseguição sob a água, resultando numa experiência aborrecida e pessimamente conduzida. E se você é um destes patriotas que, apesar de bem intencionados, têm a tendência de se apegar a causas inúteis (e até mesmo idiotas), um conselho: não se preocupe com Turistas, que merece ser ignorado por ser péssimo, não por ser uma “visão preconceituosa” do Brasil. Em vez disso, empregue seu tempo de maneira mais inteligente e manifeste sua indignação com relação ao caos no qual nosso país está mergulhado, protestando junto aos deputados e vereadores de seu Estado e cidade. A Internet está aí para isso, e não apenas para espalhar correntes bobas de boicote a um filme que não merece toda esta atenção.

15 de Fevereiro de 2007

Comente esta crítica em nosso fórum e troque idéias com outros leitores! Clique aqui!

Pablo Villaça, 18 de setembro de 1974, é um crítico cinematográfico brasileiro. É editor do site Cinema em Cena, que criou em 1997, o mais antigo site de cinema no Brasil. Trabalha analisando filmes desde 1994 e colaborou em periódicos nacionais como MovieStar, Sci-Fi News, Sci-Fi Cinema, Replicante e SET. Também é professor de Linguagem e Crítica Cinematográficas.

 

Para dar uma nota para este filme, você precisa estar logado!