Datas de Estreia: | Nota: | ||
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Brasil | Exterior | Crítico | Usuários |
21/10/2004 | 07/05/2004 | 2 / 5 | 3 / 5 |
Distribuidora | |||
Duração do filme | |||
100 minuto(s) |
Dirigido por Morgan Spurlock.
Os norte-americanos são famosos por sua `cultura do processo`: qualquer questão, por menor que seja, é freqüentemente resolvida nos tribunais – e não é à toa que o número de advogados cresce em progressão geométrica naquele país. No entanto, como já se pode imaginar, boa parte dos processos que correm pelo sistema judiciário dos Estados Unidos resume-se a baboseiras, a delírios de seus autores – como o caso das duas adolescentes obesas que decidiram processar a cadeia de restaurantes McDonald’s, atribuindo a esta a responsabilidade pelo peso que atingiram.
Foi justamente este caso que deu a Morgan Spurlock, diretor de Super Size Me – A Dieta do Palhaço, a idéia de realizar um `documentário` sobre os malefícios dos alimentos oferecidos pelas famosas lanchonetes representadas pela figura (incômoda, reconheço) de Ronald McDonald. É claro que sua iniciativa foi aplaudida com entusiasmo por boa parte da mídia; `lutar` contra as grandes corporações é algo visto com simpatia nos dias de hoje – principalmente quando o `desafiante` é um homem comum, despertando comparações com duelos no estilo `Davi x Golias`. Infelizmente, Super Size Me escolhe, como ponto de partida para suas `denúncias`, um argumento equivocado: atribuir a obesidade das garotas ao McDonald’s seria como culpar a fabricante de armas Remington pelo suicídio de Kurt Cobain. Afinal de contas, como elas podem querer eximir-se da responsabilidade pelos próprios hábitos alimentares? Aliás, faria mais sentido se elas processassem os próprios pais...
Afinal de contas, qual é o grande argumento de Morgan Spurlock? O de que comer sanduíches e batatas fritas em excesso provoca aumento de peso? Para provar esta `brilhante` teoria, o sujeito decide obrigar-se a fazer todas as suas refeições no McDonald’s durante 30 dias, aceitando a opção `Super Size` sempre que esta lhe for oferecida – e sua primeira experiência tem maus resultados, já que ele força a ingestão de alimentos até vomitar. Sim, você leu direito: ele se força a comer mais do que agüentaria normalmente – e, a partir da conseqüência previsível, tenta estabelecer um `fato`: o de que as quantidades oferecidas pelo restaurante não são saudáveis. Como diria Homer Simpson: `Duh!`.
Infelizmente, a `experiência` do cineasta não possui sequer valor científico, já que sua amostragem (uma pessoa) é claramente insuficiente para estabelecer qualquer tipo de conclusão. Da mesma forma, seu propósito legal é frustrado pela própria falta de objetividade de Spurlock: de acordo com o filme, o processo apresentado pelas duas adolescentes fracassou graças à incapacidade destas em provar que o McDonald’s tinha, como meta, levar seus clientes a realizarem todas as suas refeições no restaurante – e, no início de Super Size Me, o diretor anuncia que irá justamente comprovar que esta é a intenção da corporação. Cem minutos depois, porém, os créditos finais surgem sem que ele tenha cumprido sua promessa – algo que ele procura ignorar, tentando enganar os espectadores. Como se não bastasse, ele só tenta entrar em contato com executivos da empresa a uma semana do fim de seu experimento (ao menos, é isso que o longa dá a entender) – e é espantoso que ainda tente culpar o restaurante por não atendê-lo.
No entanto, o maior absurdo de Super Size Me reside na tentativa de Spurlock em comparar o processo que deu origem ao seu filme àqueles instaurados contra as empresas de tabaco. Em primeiro lugar, vamos ao óbvio: ao contrário do cigarro, um BigMac não provoca dependência química. O diretor até procura convencer a platéia de que uma dependência psicológica pode ser criada, mas até mesmo balas Chita podem levar algum maluco a consumi-las compulsivamente. Além disso, jamais se ouviu falar de alguém que tenha desenvolvido algum tipo de doença apenas por ficar ao lado de alguém com o hábito de devorar Quarteirões com Queijo, ou seja: os produtos do McDonald’s não fazem mal aos `consumidores passivos` (se é que é possível usar esta expressão). Finalmente, o cineasta chega ao ponto de usar a expressão `pusher` (traficante) ao se referir às lanchonetes, forçando uma comparação leviana que poderia lhe render um processo – algo que certamente não ocorrerá, já que o McDonald’s obviamente não desejará ser visto com antipatia pelo público. É curioso, também, notar que Spurlock chega a entrevistar um sujeito `viciado` (entre aspas, por favor) em BigMacs, tendo devorado mais de 19.000 sanduíches ao longo de sua vida – e, convenientemente, ele prefere ignorar o fato de que seu entrevistado é um homem magro e, portanto, bem diferente daquilo que ele tenta exibir como `resultado da dieta McDonald’s`. (Observem que a silhueta delgada do tal sujeito não significa que o BigMac não seja capaz de engordar; mais uma vez, a `amostragem` é insuficiente para que cheguemos a qualquer conclusão.)
Por outro lado, o filme aborda uma questão interessante ao revelar o descaso com que o governo americano encara a nutrição dos jovens, enviando alimentos nada saudáveis para suas escolas. Ainda assim, agindo de forma sempre tendenciosa, Spurlock não tenta sequer buscar um depoimento de membros do governo, optando, em vez disso, por entrevistar uma empresa que se dedica a comercializar refeições naturais – e é claro que ouve justamente aquilo que deseja e que lhe convém. Da mesma forma, depois de tentar provar que as lanchonetes da franquia McDonald’s não fornecem informações sobre o teor calórico de seus sanduíches, o cineasta descobre que ¾ dos restaurantes ofereciam meios para que seus clientes verificassem estes dados. O que Spurlock faz ao constatar este fato? Concentra-se no ¼ restante, tentando convencer o espectador da `irresponsabilidade` de seu alvo.
Procurando seguir os passos de Michael Moore, um verdadeiro mestre da auto-promoção, Morgan Spurlock revela o próprio egocentrismo ao incluir, no filme, cenas nas quais sua namorada declara seu `amor` por ele e ao salientar o `risco de vida` que correu ao se submeter a uma dieta de sanduíches por um mês. Porém, Spurlock está a anos-luz de possuir o talento de Moore para criar situações engraçadas e embaraçosas para seus alvos (aqui, ele limita-se a demonstrar que as pessoas têm maior familiaridade com o jingle do McDonald’s do que com o juramento de fidelidade à bandeira americana) e de virar os depoimentos de seus entrevistados contra os próprios – e é embaraçoso observar como o diretor acreditar ter conseguido um grande `furo` ao exibir um lobista afirmando que as grandes corporações `são parte do problema, mas também da solução` (uma frase que ele repete duas vezes, optando por ignorar o restante do depoimento do sujeito, durante o qual este explica que seus clientes não fazem as Leis e que oferecem, sim, informações relevantes aos clientes). De todo modo, Spurlock merece créditos ao menos pela divertida música que acompanha os créditos e que é de sua autoria.
Procurando gerar polêmica (e, conseqüentemente, vender mais ingressos) a todo custo, Morgan Spurlock faz de Super Size Me – A Dieta do Palhaço um documentário sem o menor foco investigativo, atirando para todos os lados na esperança de acertar ao menos algum alvo de importância. E depois de tantos esforços, ele encerra seu filme com uma conclusão óbvia que nada tem a ver com o McDonald’s ou com as demais corporações que ataca ao longo da projeção: as pessoas deveriam parar de comer em excesso.
Relembrando a frase final de Fahrenheit 11 de Setembro, digo: `Ao menos desta vez, estamos de acordo`.
20 de Agosto de 2004
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