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Críticas por Pablo Villaça

Datas de Estreia: Nota:
Brasil Exterior Crítico Usuários
09/06/2006 23/11/2005 2 / 5 / 5
Distribuidora
Duração do filme
96 minuto(s)

Apenas Amigos
Just Friends

Dirigido por Roger Kumble. Com: Ryan Reynolds, Amy Smart, Anna Faris, Chris Klein, Julie Hagerty, Stephen Root, Chris Marquette, Fred Ewanuick, Amy Matysio, Barry Flatman.

 

Apenas Amigos é um daqueles filmes que provavelmente surgiram a partir de um conceito que, descrito em pouquíssimas palavras, pareceu suficientemente comercial para um grupo de executivos de Hollywood: “Ryan Reynolds maquiado como gordo”. Se funcionou para Eddie Murphy, Courteney Cox (que ficava ótima como a jovem e obesa Mônica, em Friends), Gwyneth Paltrow, Goldie Hawn, Mike Myers e Tim Allen, por que não funcionaria com o carismático ator de O Dono da Festa? A resposta é simples: um bom conceito (e não estou dizendo que este é bom) só funciona quando amparado por um bom roteiro. E definitivamente não é isto que ocorre aqui.

           

Escrito por Adam ‘Tex’ Davis (nunca é bom sinal quando alguém inclui o apelido no próprio nome), Apenas Amigos traz Reynolds como Chris Brander, um adolescente obeso que nutre uma paixão platônica por sua amiga Jamie Palamino (Smart), uma espécie de “Mary” que é desejada por todos os rapazes da escola. Depois de passar por uma situação extremamente embaraçosa em uma festa na casa da amada, Chris abandona a cidade e, em dez anos, se transforma num homem magro, seguro, bem-sucedido e mulherengo que trabalha em uma importante gravadora. Designado para garantir um contrato com a cantora-sensação Samantha James (Faris), ele acaba indo parar em sua antiga cidade quando um acidente provocado pela insana cantora obriga o avião a fazer uma aterrisagem não planejada. Logo, Chris reencontra Jamie e decide conquistá-la enquanto não chega a hora de partir.

           

Eu não ficaria surpreso caso ‘Tex’ (vou chamá-lo pelo apelido para agradá-lo) tenha sido um sujeito nada popular em seu tempo de colégio – afinal, Apenas Amigos soa exatamente como uma fantasia criada para exorcizar fantasmas do passado: o popular jogador de futebol americano se transforma em um alcoólatra fracassado e calvo; a popular garota “mais bonita da escola” vira garçonete em um bar; e os antigos “nerds” atingem sucesso profissional e conquistam todas as mulheres (o próprio Chris e o paramédico interpretado por Chris Klein). No processo, ‘Tex’ ignora questões lógicas básicas: como Chris, um rapaz de 17 anos, poderia ter simplesmente abandonado sua cidade de uma hora para outra (ele supostamente parte na mesma noite da festa)? E por que ficar 10 anos sem entrar em contato com seus melhores amigos (que parecem não guardar qualquer tipo de mágoa por isso)? E como alguém pavorosamente ingênuo e despreparado como Chris poderia, em tão pouco tempo, se converter em alguém tão bem-sucedido (financeira e profissionalmente) e seguro?

           

É claro que esta transformação sem sentido (parecem dois personagens diferentes) serve aos propósitos moralistas do filme, que traz uma daquelas mensagens imbecis sobre como, apesar de todo o sucesso alcançado, o protagonista não é mais feliz como nos velhos tempos – aliás, não demora muito até que alguém se encarregue de perguntar “o que aconteceu” com o rapaz e, antes que tenhamos tempo de nos recuperar deste clichê, o roteiro já nos bombardeia com outro: “Você tem que ser você mesmo, Chris!”. Estas pérolas de sabedoria são distribuídas por um casal de coadjuvantes que, ao que parece, existem apenas para aconselhar o casal principal, provavelmente se desmaterializando assim que Chris e Jamie saem de cena.

           

Ator simpático que funciona muito bem no papel certo (e confesso que, apesar de todos os problemas do filme, sua atuação em Horror em Amityville me agradou), Ryan Reynolds surge excessivamente careteiro em Apenas Amigos, esforçando-se tanto para ser engraçado que, no processo, se esquece de criar um personagem (há uma cena em um carro na qual ele está obviamente tentando encarnar Jim Carrey, com resultados desastrosos). Por outro lado, Amy Smart, sem o menor carisma, cria um vácuo comprometedor como o interesse amoroso do protagonista, o que é grave em uma comédia romântica. Felizmente, o longa conta com duas atuações que conseguem criar bons momentos: a primeira, surpreendentemente, parte de Chris Klein, cuja inexpressividade o transformou no membro mais apagado da série American Pie e cuja carreira atingiu o fundo do poço em Diga Que Não É Verdade. Parecendo divertir-se a valer com um personagem que subverte o tipo bonzinho que está acostumado a viver, o rapaz exibe uma energia até então inédita em sua carreira. Já o sucesso de Anna Faris não é tão inesperado: como comentei em minha crítica sobre Todo Mundo em Pânico 4, a jovem atriz tem um dom natural para a comédia e, em Apenas Amigos, cria uma paródia sensacional de Britney Spears. Sua Samantha Jones é uma figura absurdamente divertida, uma fêmea dominadora que chega a miar ameaçadoramente para suas rivais e cuja megalomania a leva a acreditar que está sendo observada por todos quando, na realidade, ninguém parece notar sua presença. Infinitamente mais interessante e intensa (para não dizer bonita) que Smart, Anna Faris torna ainda mais difícil que acreditemos que Chris a dispensaria para ficar com a aborrecida Jamie.

           

No final das contas, Apenas Amigos ainda é uma comédia que não reconhece a própria hipocrisia: ao mesmo tempo em que defende o retorno de Chris às suas “raízes”, só permite que a mocinha se interesse por este depois que o rapaz volta devidamente magro e bonito. Talvez o filme tivesse se tornado um pouco mais interessante caso Chris, mesmo bem-sucedido, jamais tivesse emagrecido (o que também permitiria a aplicação do conceito descrito no início deste texto durante toda a projeção). Ou ainda melhor: e se Chris começasse como um rapaz atlético e arrogante e retornasse dez anos depois como um sujeito gordo, mas amadurecido e ponderado?

           

Hum... não. Jamie o chutaria para fora de sua vida em cinco segundos. Em Hollywood, nada é menos romântico do que obesidade. A não ser, é claro, o fracasso.
``

 

09 de Junho de 2006

 

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Pablo Villaça, 18 de setembro de 1974, é um crítico cinematográfico brasileiro. É editor do site Cinema em Cena, que criou em 1997, o mais antigo site de cinema no Brasil. Trabalha analisando filmes desde 1994 e colaborou em periódicos nacionais como MovieStar, Sci-Fi News, Sci-Fi Cinema, Replicante e SET. Também é professor de Linguagem e Crítica Cinematográficas.

 

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