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Críticas por Pablo Villaça

Datas de Estreia: Nota:
Brasil Exterior Crítico Usuários
01/01/1970 01/01/1970 4 / 5 4 / 5
Distribuidora
Sony Pictures

Direção

Alexander Payne

Elenco

Will Forte , Bruce Dern , June Squibb , Bob Odenkirk , Stacy Keach , Angela McEwan

Roteiro

Bob Nelson

Produção

Albert Berger

Fotografia

Phedon Papamichael

Música

Mark Orton

Montagem

Kevin Tent

Design de Produção

J. Dennis Washington

Figurino

Wendy Chuck

Direção de Arte

Sandy Veneziano

Nebraska
Nebraska

Dirigido por Alexander Payne. Com: Will Forte, Bruce Dern, June Squibb, Bob Odenkirk, Stacy Keach, Angela McEwan.

O cineasta Alexander Payne é um perito em contar histórias de homens de meia-idade deslocados e incompletos que, na maior parte das vezes, acabam partindo em algum tipo de jornada externa que reflita a interna que já vivem: foi assim com Eleição, Sideways, As Confissões de Schmidt, Os Descendentes e, agora, com este belo Nebraska  - o primeiro longa de sua carreira cujo roteiro não traz também sua assinatura.

Escrito pelo estreante Bob Nelson, o filme acompanha o triste David (Forte), que, recentemente abandonado pela namorada e trabalhando como vendedor de aparelhos eletrônicos, tem se preocupado com a saúde mental do pai, Woody (Dern), desde que este recebeu uma propaganda de revistas pelo correio que usava um possível prêmio de um milhão de dólares como atrativo para assinar as publicações. Sem saber que aquilo se tratava de um mero esquema de marketing, o velho Woody decide viajar para Nebraska a fim de receber o dinheiro – e depois de tentar convencê-lo a desistir, David resolve levar o pai como forma de acalmá-lo. No processo, acabam visitando a cidade na qual seus pais se conheceram e os parentes que lá se encontram.

Fotografado em um preto-e-branco pouco inspirado, mas que serve para ressaltar a atmosfera entristecida da narrativa, Nebraska é um filme cuja melancolia é construída não só pela falta de cores, mas também pelos modos sem vida de seus personagens e pela bela trilha de Mark Orton. Assim, quando aos poucos vamos percebendo todos os ressentimentos existentes na relação entre David e o pai, bem como as mágoas guardadas por seu irmão Ross (Odenkirk) e pela mãe Kate (Squibb), constatamos os esforços necessários para que o protagonista leve a viagem adiante depois de uma vida de abandonos e alcoolismo experimentada pelo senhor que agora acredita ter se tornado um milionário.

A própria motivação que inspira Woody a insistir no prêmio, aliás, é algo que se torna clara gradualmente, já que inicialmente ele declara querer apenas uma caminhonete nova e um compressor de ar – e, portanto, quando aos poucos vamos conhecendo melhor o sujeito e também sua esposa de décadas, nossas percepções vão se ajustando de forma curiosa e reveladora. Assim, se a princípio enxergamos Woody apenas como um homem cruel e relapso, eventualmente somos capazes de identificar sua generosidade, ao passo que sua esposa, que percebíamos apenas como uma vítima dos humores do marido, expõe suas próprias falhas que nos levam a entender, em parte, o tipo de relação que o casal mantinha entre si e com os filhos. Não que um ou outro se revele uma má pessoa; Nebraska é sensível demais para pintar o mundo de forma unidimensional. Em vez disso, o filme nos oferece personagens complexos que se mostram capazes de atos mesquinhos e também admiráveis dependendo do momento e das circunstâncias.

O mais surpreendente no longa, porém, é seu senso de humor – e Payne obviamente se diverte bastante na apresentação de toda a família Grant, cujos modos introspectivos são capazes de gerar instantes hilários. Além disso, a personalidade forte e ácida de Kate, vivida de forma inspiradíssima por June Squibb (que merece ser lembrada na temporada de premiações), extrai graça de sua insistência em emitir juízo de valor sobre todas as pessoas de seu passado. Neste aspecto, a decisão do cineasta de escalar comediantes como Will Forte e Bob Odenkirk revela-se acertadíssima, já que estes se mostram igualmente confortáveis nas cenas densas e leves ao longo da projeção.

Forte, em particular, surpreende como um protagonista cuja natureza pode ser resumida pelo fato de ter recebido o nome de um bebê morto aos dois anos de idade: fraco e derrotado, David é um homem facilmente esquecível que parece viver no piloto automático – e é preciso dar créditos ao ator por conseguir evocar, ao mesmo tempo, o orgulho que sente do irmão mais velho e a pontada de inveja que experimenta ao confirmar para os parentes que Ross é bem-sucedido profissionalmente. O mais comovente, contudo, é perceber como David se revela um filho melhor do que Woody foi como pai, demonstrando uma generosidade tocante para com um homem que, percebemos, não fez muito por merecê-la.

Ainda assim, se a aproximação dos dois homens convence e comove, isto se deve não só à dinâmica dos atores que os vivem, mas à maneira com que o veterano Bruce Dern constrói Woody, expondo um remorso subjacente mesmo nos momentos mais brutos do sujeito. Woody Grant pode não ter sido um bom pai de família, mas, ao seu próprio modo, pagou e penitenciou-se por isso – e quando David pergunta se ele tinha determinado sonho na juventude, sua resposta (“Não me lembro”) é trágica por expor que não apenas estes sonhos não importam como se transformaram, na falta de sua concretização, em puro lamento.

Texto originalmente publicado como parte da cobertura do Festival do Rio 2013.

30 de Setembro de 2013

Pablo Villaça, 18 de setembro de 1974, é um crítico cinematográfico brasileiro. É editor do site Cinema em Cena, que criou em 1997, o mais antigo site de cinema no Brasil. Trabalha analisando filmes desde 1994 e colaborou em periódicos nacionais como MovieStar, Sci-Fi News, Sci-Fi Cinema, Replicante e SET. Também é professor de Linguagem e Crítica Cinematográficas.

 

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