Datas de Estreia: | Nota: | ||
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Brasil | Exterior | Crítico | Usuários |
08/07/2005 | 11/03/2005 | 5 / 5 | / 5 |
Distribuidora | |||
Duração do filme | |||
98 minuto(s) |
Dirigido por Danny Boyle. Com: Alex Etel, Lewis Owen McGibbon, James Nesbitt, Daisy Donovan, Christopher Fulford, Pearce Quigley, Jane Hogarth.
Cova Rasa, Trainspotting, A Praia e Extermínio. É realmente incrível constatar que filmes tão diferentes em estilo e conteúdo tenham sido dirigidos pelo mesmo sujeito, o britânico Danny Boyle (também é dele o pavoroso Por uma Vida Menos Ordinária, que tento esquecer desde que tive a infelicidade de assisti-lo). Versátil e inegavelmente talentoso, o cineasta tem uma filmografia tão eclética quanto a do compatriota Michael Winterbottom – e é fascinante perceber que Boyle continua a brincar com a linguagem neste novo Caiu do Céu, cujo universo fantasioso poderia perfeitamente ser comparado a alguns dos trabalhos de Tim Burton, como Edward Mãos-de-Tesoura e Peixe Grande.
Aliás, já que citei Winterbottom, julgo importante reconhecer também o talento do roteirista Frank Cottrell Boyce, com quem colaborou em filmes tão diversos quanto A Festa Nunca Termina e Código 46 – e que é justamente o autor do roteiro desta produção. A história, à primeira vista, parece bastante simples: dois jovens irmãos que perderam a mãe recentemente, Anthony e Damian (de 9 e 7 anos de idade, respectivamente), mudam-se com o pai para o subúrbio, onde tentam reiniciar a vida. Certo dia, o caçula encontra uma bolsa repleta de dinheiro e, ao lado do irmão, tem que decidir rapidamente o que fazer com a fortuna, já que a libra perderá o valor em poucos dias, sendo substituída pelo euro. Logo, porém, a trama ganha contornos mais complexos quando descobrimos que Damian tem o hábito de conversar regularmente com vários santos da Igreja Católica, que aparecem na sua frente com auréola e tudo o mais.
Um dos vários méritos do roteiro de Cottrell Boyce reside na forma honesta com que ilustra o ponto de vista de seus jovens protagonistas, compreendendo a lógica particular com que as crianças lidam com as mais diversas situações – uma preocupação que encontra suporte na inteligente direção de Boyle, que procura intensificar nosso mergulho no universo infantil ao manter a câmera sempre baixa, numa altura compatível com o olhar dos pequenos atores (algo que Spielberg fez com competência em E.T.). Investindo num ritmo sempre dinâmico, com transições de cena rápidas e criativas, o cineasta demonstra – como de hábito – sua confiança na inteligência do espectador, evitando chamar atenção excessiva para alguns elementos visuais importantes (em certo momento, vemos o pai dos garotos, vivido pelo excelente James Nesbitt, levantando a coberta de sua cama e percebemos que ele colocou dois travesseiros no lugar em que sua esposa dormia – um detalhe sutil que revela o estado emocional do viúvo).
Da mesma forma, a ótima fotografia de Anthony Dod Mantle adota diversos estilos à medida que a história se desenvolve, oscilando entre as cores supersaturadas do flashback que revela o roubo do dinheiro e a contraluz que sugere a intervenção divina no cotidiano de Damian, passando pelo emprego consistente de tonalidades mais quentes que indicam o calor humano da relação entre os garotos e o pai. Já a trilha sonora de John Murphy aposta em melodias lúdicas que se encaixam com perfeição nos aspectos mais fantasiosos do longa.
Enquanto isso, os jovens Lewis Owen McGibbon e Alex Etel encarnam com sinceridade absoluta seus personagens, cujas personalidades contrastantes são responsáveis por vários dos melhores momentos do filme: Anthony adota uma postura pragmática (chegando a usar a morte da mãe para obter regalias), ao passo que Damian, com sua bondade infinita, é um sonhador incorrigível. Aliás, a diferença entre as atitudes dos garotos pode ser constatada de maneira hilária durante a encenação do nascimento de Cristo na escola: enquanto Damian tenta analisar o estado emocional no qual José se encontraria depois da longa caminhada até Belém, Anthony tenta imaginar o que o santo teria feito com o ouro presenteado por um dos reis magos. Talentosos e espontâneos, os pequenos atores funcionam perfeitamente juntos, exibindo uma química invejável.
E, ainda que Caiu do Céu falhe ao insistir numa mensagem simplista e demagógica sobre o poder corruptor do dinheiro, acabamos por perdoar este tropeço em função de todos os acertos do roteiro, merecendo destaque, por exemplo, a curiosa interpretação oferecida sobre o milagre dos `pães e dos peixes` descrito na Bíblia – uma visão que, longe de blasfema, atira um olhar ainda mais honorífico sobre a capacidade de Jesus Cristo em propagar suas mensagens de amor e compaixão.
Ao contrário dos trabalhos anteriores de Danny Boyle, Caiu do Céu nos manda para fora do cinema com uma sensação gostosa de otimismo com relação ao mundo e às pessoas. É, enfim, um filme que faz bem à alma e ao coração.
08 de Julho de 2005
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