Seja bem-vindx!
Acessar - Registrar

Críticas por Pablo Villaça

Datas de Estreia: Nota:
Brasil Exterior Crítico Usuários
18/08/2006 21/04/2006 4 / 5 3 / 5
Distribuidora
Duração do filme
125 minuto(s)

Terror em Silent Hill
Silent Hill

Dirigido por Christophe Gans. Com: Radha Mitchell, Sean Bean, Laurie Holden, Deborah Kara Unger, Jodelle Ferland, Alice Krige, Kim Coates, Tanya Allen, Emily Lineham, Eve Crawford.

 

Sob o solo da pequena cidade de Silent Hill há um incêndio nas minas de carvão que já dura décadas – algo que provocou a morte de boa parte de seus habitantes e a expulsão dos demais daquele local desafortunado. Exemplo típico de cidade-fantasma, Silent Hill está sempre encoberta por uma chuva de cinzas e, como se não bastasse, sua rua principal termina subitamente em um penhasco assustador. Assim, é claro que a primeira impressão que Rose Da Silva (Mitchell) tem do lugar não é agradável, mas ela está ali para tentar encontrar uma cura para o sonambulismo de sua filha adotiva, que vem tendo pesadelos pavorosos com aquela cidade. O que Rose não sabe é que, de tempos em tempos, um alarme soa em Silent Hill – e que, quando isto ocorre, tudo fica muito, muito pior...

           

Escrito por Roger Avary a partir do jogo criado pela Konami (que não conheço, devo confessar), Terror em Silent Hill segue, em seus momentos mais angustiantes, uma lógica de pesadelo: em um momento, Rose está sendo perseguida por crianças carbonizadas; em seguida, desperta sob o céu cinza da cidade apenas para, mais tarde, descobrir o corpo mutilado de um faxineiro – que, é claro, logo volta à vida. Na realidade, o longa não conta com uma trama das mais interessantes: na maior parte do tempo, simplesmente acompanhamos Rose enquanto esta persegue uma garota que julga ser sua filha (ou que, no mínimo, conhece seu paradeiro) – e, considerando-se que Avary é autor do ótimo Regras da Atração e que trabalhou com Tarantino em Pulp Fiction, é uma pena constatar que os diálogos deste novo filme sejam tão medíocres. Aliás, o roteirista parece seguir fielmente uma estrutura narrativa mais apropriada justamente aos jogos: sua protagonista recebe uma pista sobre a localização da filha e vai até o próximo ponto de informação, onde descobre outra pista e assim por diante. Da mesma forma, se em algum instante ela pega um objeto (quase podemos ver a função “Pick” sendo selecionada pelo roteiro), podemos apostar que ela logo o utilizará, descartando-o em seguida – exatamente como num game. Assim, não é surpresa alguma quando, em certo instante, ela é obrigada a atravessar um labirinto repleto de mortos-vivos (aliás, torci para que ela tivesse pressionado Save Game antes de se arriscar).

           

Não é a primeira vez, diga-se de passagem, que o cineasta francês Christophe Gans comanda uma produção com roteiro pouco inventivo – também é dele o fraco (mas visualmente espetacular) O Pacto dos Lobos, que servia como vitrine para seu apurado senso estético, embora não fosse muito promissor do ponto de vista narrativo. Por isso, não é surpresa que Terror em Silent Hill seja tão bonito; a surpresa é que, mesmo com um roteiro tão bobo, o filme seja tão eficiente e interessante. Contribuem, para esta proeza, a fotografia de Dan Laustsen e o design de produção de Carol Spier, que ajudam Gans a construir um clima angustiante e opressivo. Quando vemos um plano geral (obviamente feito em computador) que revela o carro de Rose percorrendo uma longa estrada cercada por montanhas e banhada por uma lua colossal, podemos sentir que nada muito agradável pode esperar a moça no fim daquele caminho. Além disso, Laustsen faz um belíssimo trabalho ao contrapor o cinza claustrofóbico de Silent Hill à luz mais quente e calorosa do mundo externo àquela cidade (e, mesmo durante forte chuva, a visibilidade do universo extra-Silent Hill é grande o bastante para espantar qualquer sentimento mais urgente de ameaça ou a impressão de que o sobrenatural está prestes a se manifestar). Para finalizar, o figurino usado por Radha Mitchell ao longo da projeção cumpre de maneira sutil a importante função de ilustrar a alteração gradual de sua postura diante do horror que encontra, fazendo uma transição lenta, mas lógica, de um cinza pálido ao vermelho vivo.

           

Enquanto isso, os efeitos visuais presentes em Terror em Silent Hill situam-se com estranha adequação entre o realista e o fantástico, apresentando-se sempre convincentes, embora não totalmente verossímeis: algumas das criaturas, por exemplo, movem-se com grande naturalidade, enquanto outras exibem com obviedade sua natureza digital. De todo modo, criada digitalmente ou através de efeitos mecânicos ou de maquiagem, a violência vista ao longo do filme é sempre gráfica e chocante, o que certamente agradará aos fãs do gênero – e o mais importante: serve à narrativa, em vez de simplesmente existir em função de si mesma, como se a crueldade e o sadismo gratuitos (vide O Albergue) fossem auto-justificados.

           

Outra curiosidade de Terror em Silent Hill diz respeito às referências religiosas que cruzam a projeção, desde a cruz vista ao fundo de uma cena de desespero familiar até a oração feita por Rose em um momento de pânico, durante a qual pede proteção divina. E se o final apoteótico recende à punição divina, é interessante perceber como o diretor Christophe Gans consegue transformar a figura de uma criança entrevada numa cama em um símbolo religioso estranhamente familiar.

           

Assim, é uma pena que, aqui e ali, as falhas do roteiro de Avary apareçam com tamanha proeminência: toda a subtrama envolvendo o personagem de Sean Bean, por exemplo, poderia ter sido descartada sem trazer qualquer prejuízo ao filme, existindo apenas para alongar a projeção, já que não serve sequer para explicar os pontos mais obscuros da trama (e há muitos pontos obscuros, acreditem). Além disso, por que o personagem de Kim Coates parece não envelhecer um dia sequer em mais de 30 anos?!

           

Defeitos à parte, Terror em Silent Hill impressiona pelo visual e por conseguir criar um clima tenso, além de levar o espectador a torcer para que Rose reencontre a filha. Neste sentido, o filme é realmente como um pesadelo intenso: não tem a menor lógica, mas te faz acordar (ou sair do cinema) profundamente angustiado.

 

Observação: A primeira parte dos créditos finais merece aplausos pela inventividade.

`` 

16 de Agosto de 2006

 

Comente esta crítica em nosso fórum e troque idéias com outros leitores! Clique aqui!

Pablo Villaça, 18 de setembro de 1974, é um crítico cinematográfico brasileiro. É editor do site Cinema em Cena, que criou em 1997, o mais antigo site de cinema no Brasil. Trabalha analisando filmes desde 1994 e colaborou em periódicos nacionais como MovieStar, Sci-Fi News, Sci-Fi Cinema, Replicante e SET. Também é professor de Linguagem e Crítica Cinematográficas.

 

Para dar uma nota para este filme, você precisa estar logado!