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Críticas por Pablo Villaça

Datas de Estreia: Nota:
Brasil Exterior Crítico Usuários
26/09/2003 20/06/2003 3 / 5 / 5
Distribuidora
Duração do filme
96 minuto(s)

Alex e Emma
Alex & Emma

Dirigido por Rob Reiner. Com: Kate Hudson, Luke Wilson, David Paymer, Sophie Marceau, Rip Taylor e Cloris Leachman.

Quando escrevi sobre Identidade, há alguns meses, observei que a produção não se dava ao trabalho de reconhecer a influência da escritora Agatha Christie em sua trama, o que era lamentável. Pois, ao que parece, Hollywood está se tornando cada vez mais relapsa neste sentido, já que, mais uma vez, um de seus filmes procura esconder suas origens: não há, em momento algum dos créditos de Alex & Emma, referência à comédia romântica Quando Paris Alucina, estrelada por Audrey Hepburn e William Holden em 1964, na qual este último interpretava um roteirista que tinha dois dias para entregar um script e acabava sendo auxiliado por uma datilógrafa profissional (Hepburn) – e, enquanto Holden ia desenvolvendo sua história, o espectador assistia às encenações das várias versões que o sujeito criava. Aliás, Alex & Emma tampouco reconhece a influência de O Jogador, que Dostoyevsky escreveu em 1866 justamente para pagar uma dívida (caso não entregasse o livro em um mês, os direitos sobre todas as suas obras passariam a pertencer ao seu editor!) e que o levou a conhecer a estenógrafa Anna Grigorievna Snitkina, por quem ele se apaixonou e que acabou se tornando sua esposa.

Agora leia a sinopse desta nova produção e me diga se é possível negar estas duas influências: pressionado a pagar uma dívida de jogo em 30 dias, o escritor Alex Sheldon (Wilson) precisa entregar seu novo livro para o editor a fim de receber um pagamento que resolverá seus problemas. Para cumprir o prazo, ele decide contratar uma estenógrafa, Emma (Hudson), para auxiliá-lo em seu trabalho. Enquanto dita seu livro para a garota, o espectador passa a assistir não apenas à interação entre Alex e Emma, mas também entre os personagens do livro do romancista: Adam (Wilson, mais uma vez), Polina (Marceau) e... Anna (novamente Hudson – a propósito, repararam o nome da personagem?). Pois bem: o problema é que Emma passa a dar palpites durante a narração de Alex, dando início a várias discussões sobre o que ele deve ou não fazer com sua história.

Ora, quem tem como atividade a redação de textos sabe que não há nada mais irritante do que ser interrompido durante o trabalho. Como, para tornar as coisas ainda piores, os dois personagens-título não se gostam, logo vem a pergunta: por que Alex mantém Emma ao seu lado se tem a opção de requisitar outra estenógrafa? Aliás, esta seria a atitude lógica a se tomar – principalmente se considerarmos que ele tem um prazo apertado a cumprir. No entanto, estamos falando de um filme e, assim, há uma razão clara para que os dois sejam mantidos juntos: o roteirista Jeremy Leven está determinado a utilizar o velho clichê do casal que, apesar de inicialmente se odiar, vai se apaixonado aos poucos. O curioso é que, ao longo do filme, os dois protagonistas comentam (e criticam) os clichês normalmente utilizados em histórias de amor, mas, ao que parece, Leven acredita que isto pode servir como desculpa para que ele recicle as mesmas convenções.

Outro equívoco cometido pelo roteirista diz respeito ao fato de que o espectador acaba passando mais tempo com os personagens do livro escrito por Alex do que com o escritor e sua estenógrafa – que, teoricamente, deveriam formar a dupla central da narrativa. Como se não bastasse, Alex (que supostamente estava enfrentando um bloqueio criativo) dita as páginas de seu romance de maneira direta, sem hesitações – desperdiçando a oportunidade de brincar com a percepção da platéia, já que, ao contrário de Paris Quando Alucina, são poucas as ocasiões em que o filme apresenta versões diferentes da mesma situação. Em certo momento, aliás, Emma perde várias páginas do livro, obrigando o autor a repetir seu `ditado` – e, por alguns instantes, imaginei que finalmente o roteiro exploraria este recurso. Infelizmente, eu estava enganado, já que o romancista refaz o trabalho em questão de segundos. Desta forma, sou levado a pensar que a perda das páginas foi simplesmente uma maneira que Leven (imitando Alex, talvez?) encontrou de `encher lingüiça`, aumentando a duração do filme em mais alguns minutos.

O tal livro, aliás, é terrível – e é incrível que alguém esteja disposto a pagar 125 mil dólares por um texto tão medíocre. Além disso, é interessante observar que boa parte da `comédia` presente no romance envolve gags físicas – que são mais apropriadas para o Cinema do que para uma obra literária: há uma cena, por exemplo, em que a `graça` reside na forma de Adam (o protagonista da história-dentro-da-história) dançar. Mas como isto poderia funcionar em um livro? (Que tal `Adam dança desengonçadamente, saindo do ritmo e constrangendo seu par`?)

Curiosamente, Alex & Emma acaba funcionando como passatempo descompromissado: Luke Wilson é um ator carismático; Kate Hudson é simpática e consegue divertir ao interpretar quatro versões da mesma personagem (nos únicos momentos em que o filme tenta ser mais criativo; e Sophie Marceau prende nossa atenção com sua beleza. Mesmo escrito sem maiores cuidados ou reflexões (assim como a obra de Alex), o longa é ingênuo (no sentido positivo da palavra) o bastante para divertir por 90 minutos. Por outro lado, eu não compraria o livro de Alex nem que este fosse vendido em lojinhas de 1,99. Há limite para tudo.
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24 de Setembro de 2003

Pablo Villaça, 18 de setembro de 1974, é um crítico cinematográfico brasileiro. É editor do site Cinema em Cena, que criou em 1997, o mais antigo site de cinema no Brasil. Trabalha analisando filmes desde 1994 e colaborou em periódicos nacionais como MovieStar, Sci-Fi News, Sci-Fi Cinema, Replicante e SET. Também é professor de Linguagem e Crítica Cinematográficas.

 

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